O arquiteto e urbanista Gustavo Penna alerta sobre a importância do planejamento na capital mineira aliado ao diálogo com a população. Belo Horizonte, segundo ele, precisa ter mais espaços que despertem o senso de pertencimento e cuidado dos moradores, a exemplo do que ocorre na Pampulha. Para ele, uma cidade mais inclusiva é importante para o futuro, além da preocupação com as mudanças climáticas.

Do projeto inicial de Belo Horizonte, o que mudou nos dias atuais? BH nasceu com um design urbanístico de inspiração francesa. O modelo de parcelamento do solo adotado por Aarão Reis se assemelhou com o de La Plata (Argentina), Barcelona (Espanha) e Washington (Estados Unidos): avenidas diagonais e quadras ortogonais. No entanto, a cidade foi crescendo sem planejamento. E este é o grande erro que se segue. 

Quais os impactos da falta de planejamento? O planejamento, tão essencial nas cidades, infelizmente é deixado de lado pelos gestores, pois retira deles o poder de legislar sobre o que envolve a cidade. O que temos hoje, não só em Belo Horizonte, é o planejamento somente quando temos algum problema. E, mesmo assim, é apenas de forma imediata, nada em longo prazo. Nós, urbanistas, não conseguimos interlocução com a cidade, porque exatamente quem as comanda são pessoas que não têm apreço pelo urbanismo.

BH chegou ao limite da urbanização ou ainda é possível crescer de forma sustentável? Já chegou ao limite, pois é um município pequeno. Belo Horizonte não é, de fato, uma cidade criada, mas sim feita de pequenos “pedaços” dos municípios do entorno. Quando se fala na capital mineira, não podemos pensá-la de forma isolada, mas interligada. Os nossos problemas são metropolitanos, logo precisam ser tratados de forma global, mas com serenidade e otimismo. As ferramentas nós temos.

Na sua análise, como está a capital? A cidade virou um local com os viadutos mais feios do mundo. A pandemia trouxe a aceleração de que BH não é bonita. Ou seja, não é harmônica, e isso é o maior construtor da cidadania e da autoestima. Você tem que amar a cidade. E para que isso aconteça, temos que criar motivos.

Temos algum exemplo disso em Belo Horizonte? Sim. Juscelino Kubitschek, quando prefeito, idealizou o Conjunto Moderno da Pampulha, em 1940. Tantos anos se passaram, e nós seguimos amando a Pampulha. Para o futuro da cidade, temos que criar vínculos afetivos do povo com BH. Sem a sensibilidade, não dá para idealizarmos o futuro.

Então, a Pampulha é um exemplo de sucesso a ser seguido em BH? Totalmente. Estamos falando sobre um Patrimônio Cultural da Humanidade, que segue sendo um dos principais símbolos da cidade. É um dos mais procurados para visitação. Já fizemos um trabalho na orla da lagoa da Pampulha, quando o Parque Ecológico estava em pleno funcionamento, antes da pandemia de Covid-19 e dos casos de febre maculosa, com 40 mil pessoas visitando o espaço em cada final de semana. Além disso, tem o Mineirão, que é outro fator de atrativo turístico. Temos que incentivar o crescimento dos pontos que atraem as pessoas.

Muito se fala no relevo de Belo Horizonte e que isso atrapalha o desenvolvimento. Concorda com isso? A cidade montanhosa é muito mais elegante do que a plana. É uma delícia andar pela cidade e ver tudo que acontece em diferentes e variados planos. Só que o planejamento tem que ser feito sem brigar com a topografia da cidade. Há correções que precisam acontecer e têm soluções. Relevo não pode ser justificativa. Contemplar a serra do Curral parece algo irreal devido a tamanha beleza. O fundo azul na chapada é muito impressionante. Não penso em nenhum problema como insolúvel. Insolúvel é a falta de esperança.

Qual o maior erro na administração dos problemas estruturais da cidade? O improviso. Erram por não pensar em longo prazo. As cidades, não só a capital mineira, são administradas por fatalidade. Só quando o problema fica imenso é que atuam nele. Por exemplo, se um buraco está pequeno, deixam lá até cair um ônibus e somente depois vão resolver. A falta de planejamento é assim. O avanço da tecnologia nos permite prever o que está para acontecer. Digo que estamos vivendo na época da sociedade do tédio. Você não tem esperança do futuro, e isso é aterrorizante quando pensamos na nossa realidade, pois significa a perda do horizonte. Nós somos o belo horizonte, logo temos que mirar o futuro e construir o nosso jeito de viver. Há duas formas de aproveitar a vida: pensando nas potencialidades ou contemplando o que acontece. Se pensarmos só nos problemas, por exemplo, ficaremos paralisados. Temos que sonhar. Nada é fixo, nem mesmo os problemas, para quem pensa e sonha. Pés nos chãos, olhos no horizonte e cabeça nas estrelas. 

O que deveria, então, ser feito em Belo Horizonte? Eu faria a administração dos problemas pelas regiões, pois não dá para tratar a cidade de maneira igual. Cada lugar tem suas características próprias, logo não dá para tratar o bairro Floresta igual à Serra e igual ao Alto dos Pinheiros. Outro ponto seria proporcionar mais participação popular na resolução dos problemas. Quando se tem o diálogo com a população, você aplica uma força positiva, que gera resultados satisfatórios e mais acolhedores. Também sou a favor de uma cidade mais inclusiva. É preciso um planejamento mais integrado e menos elitista. Precisamos ter menos muros e mais parques, mais ruas arborizadas. Isso não é difícil. Estamos perdendo nossas árvores. A “Cidade Jardim” está acabando, pois não plantamos outras árvores. Os parques lineares são necessários para fazer a conexão da população com o meio ambiente. Ainda mais pensando nas mudanças climáticas, de que já estamos sentindo os impactos. BH tem que ser permeada pelo verde. O nome disso é “planejamento”. Os arquitetos terão trabalho no futuro.