SÍNDROME RARA

Criança procura por doador compatível de medula óssea para sobreviver

A chance de encontrar um doador compatível é de 1 em 100 mil, mas é a única chance do pequeno Gabriel sobreviver; quanto mais pessoas se cadastrarem no banco de doadores, maior será a possibilidade de localizar o doador compatível

Por JULIANA BAETA
Publicado em 29 de fevereiro de 2016 | 18:39
 
 
 
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Se depender da vontade de Gabriel Souza, que completou 3 anos em janeiro, a cura para a síndrome rara que sofre, a Chediak-Higashi, deve acontecer em breve. Mas para isso, ele precisa encontrar um doador de medula óssea compatível para realizar um transplante e poder ter uma vida normal em Campo Belo, no Sul de Minas, cidade onde mora. Mesmo tão novinho, Gabriel já passou por 10 internações extensas desde que foi diagnosticado com a doença em agosto do ano passado e precisa tomar 9 remédios por dia, além de viajar semanalmente para São Paulo para fazer quimioterapia. 

Segundo a gerente de captação da Fundação Hemominas, Heloísa Gontijo, a probabilidade de encontrar um doador compatível é de 1 para 100 mil. Dentro da família, a maior probabilidade é entre irmãos. "Se o casal tiver dois filhos, eles dividem a informação genética dos pais e, por isso, a probabilidade de um irmão ser compatível é de 25%", explica a enfermeira da Secretaria Municipal de Saúde de Campo Belo, Leidiane Mendes.

A irmã de Gabriel, que tem 5 anos, já fez o teste e o resultado de compatibilidade foi negativo. Com a união da Secretaria Municipal de Saúde e o Hemominas, uma campanha foi lançada para recrutar 100 pessoas na cidade para realizarem o teste de compatibilidade. É importante que, na região, apenas uma pessoa de cada família se cadastre, já que pessoas de fenótipos parecidos tem uma probabilidade semelhante de serem ou não compatíveis.

"Estamos pedindo pra não ser mais de uma pessoa da mesma casa porque só podemos cadastrar 100 pessoas, então é importante que os fenótipos sejam diversificados", explica Leidiane. O dia do "recrutamento" é 12 de março, quando o Hemoninas irá até o município recolher os testes.

No entanto, interessados em doar medula óssea podem se cadastrar em qualquer dia e em qualquer parte do Estado e do país. É o que explica a gerente de captação do Hemominas Heloísa Gontijo.

"É possível se candidatar a ser um doador de medula óssea em qualquer unidade do Hemominas. A doação é anônima e não poder direcionada. Ou seja, você não pode chegar na unidade e dizer que gostaria de doar a medula para o Gabriel. O que acontece é que você faz um cadastro, realiza um teste e estes dados são cruzados com o banco nacional de receptores, que são os pacientes em lista de espera".

Segundo ela, há ainda um intercâmbio com os bancos de cadastros da Alemanha e dos Estados Unidos. Caso haja algum doador compatível nestes países com algum paciente brasileiro, a coleta é feita lá e enviada para cá.

A representante do Hemominas aponta ainda para a importância de se manter o cadastro atualizado, porque é com base nele que a instituição aciona o doador em potencial quando encontra compatibilidade com algum paciente.

Para atualizar o cadastro ou se cadastrar, basta clicar aqui. Também é possível buscar as informações sobre o cadastramento e doação procurando qualquer uma das unidades do Hemominas no Estado. O procedimento é assinar um termo de consentimento que autoriza a realização do exame e a disponibilização do resultado no banco de dados.

Diferente da doação de sangue, a de medula é ainda mais simples e requer menos critérios. Basta ter entre 18 e 54 anos e não ter nenhuma doença infecciosa. Pessoas abaixo dos 18 anos também podem doar se acompanhadas de algum responsável.

Vida frágil

Quando Gabriel nasceu, os pais estranharam a pele clara e os cabelos loiros, mas acharam se tratar de uma genética distante. Mas em agosto do ano passado, quando finalmente descobriram qual era a doença, as características do filho fizeram sentido.

É o que explica a médica Eugênia Valadares, da Associação Mineira de Pediatria. "É uma doença rara genética na qual a criança nasce com a pele mais clara e o cabelinho e o olho mais claro também. Não é um albinismo normal, é parcial. Além disso, há a imunodeficiência e a tendência a infecções bacterianas e viróticas", explica.

É por isso que a rotina de Gabriel, que envolve 9 medicamentos por dia, é cercada de cuidados. Segundo a mãe, Lívia Cardoso Souza, ele é a primeira criança com a síndrome em Minas. 

"Ele não pode pegar nenhuma bactéria ou vírus porque isso pode ser fatal para ele. Por exemplo, se ele tem contato com uma pessoa diferente ele precisa usar máscara. Ele não pode comer nada violado, ou seja, se abrir um pacote de biscoito e comer só um, ele não pode comer mais nenhum após duas horas desde que a embalagem foi aberta. As roupas dele são lavadas em máquina esterilizada e os alimentos ficam de molho no hipoclorito de sódio", conta a mãe, Lívia Cardoso.

Outro sintoma da síndrome é o aumento do fígado e do baço, e a possibilidade de se transformar em um linfoma ou leucemia. Por isso a única saída é o transplante de medula óssea. 

"É uma síndrome raríssima. Pra você ter uma ideia há um estudo de 2008 que continha apenas 500 casos da doença registrados no mundo. Para se entender como essa doença é passada na forma de um gene recessivo basta pensa como se todos fôssemos um par de lâmpadas. O pai e a mãe da criança tinham, cada um, um gene dessa mutação. Ou seja, uma lâmpada acesa e uma apagada cada um. O Gabriel herdou a lâmpada apagada de cada um e ficou com um par de lâmpadas apagadas, o que gera a doença", explica.

Mas nem a rotina exaustiva de exames e nem as inúmeras internações fizeram Gabriel deixar de lutar pela vida. "Eu vou sarar, mamãe" é o que ele costuma dizer sempre que vê os pais abalados. Lívia largou o curso de Direito para cuidar integralmente do filho e o companheiro dela, pai de Gabriel, perdeu o emprego dois dias antes de o filho ser diagnosticado com a doença.

"O Gabriel entende o que acontece. Ele sabe, por exemplo, que quando sai na rua e tem contato com alguém, ele vai passar por outra internação. Ele sabe o que ele pode e o que não pode. Na hora de tirar o sangue pra fazer os exames ele dá o bracinho. É um menino muito bonzinho, que tem uma luz incrível", relata Lívia.

Medula óssea

Às vezes, o que impede muitas pessoas de se cadastrarem para o teste da doação de medula óssea, é o processo. A enfermeira Lidiane Mendes explica que o doador não sente nada e o procedimento pode ser feita de duas formas.

"É aplicada a anestesia no osso do quadril e, dentro deste osso, se extrai a medula e injeta no receptador. Outra forma é o doador tomar mediamentos que estimulam o organismo a produzir as células existentes na medula, os glóbulos vermelhos e as plaquetas, que irão migrar para a corrente sanguínea. Após cinco dias o sangue do doador passa por um aparelho semelhante a hemodiálise e é filtrado, para separar as células necessárias para o procedimento e injetá-las no paciente', explica a enfermeira Lidiane Mendes.

Os dois procedimentos são rápidos e indolores ao paciente.

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