Primeiro de Maio

Essenciais: os trabalhadores que não pararam durante a pandemia

Levantamento revela aumentos expressivos de óbitos entre algumas profissões

Por Cristiano Martins
Publicado em 01 de maio de 2021 | 03:00
 
 
 
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Neste Dia do Trabalhador, muitos deles não poderão curtir um sábado de descanso, pois estão nas escalas do transporte público ou da limpeza urbana, nos balcões de caixa ou nos cemitérios. São profissionais de categorias essenciais que nunca tiveram a opção do home office ou do isolamento voluntário e precisaram continuar se expondo ao novo coronavírus. E que seguem sem uma previsão concreta de quando serão vacinados.

Segundo levantamento realizado por O TEMPO a partir de dados do Novo Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), do Ministério da Economia, profissões como estas apresentaram alguns dos maiores excessos de mortes durante a pandemia, comparando o período entre março de 2020 e fevereiro de 2021 com a média dos três anos anteriores.

Os desligamentos trabalhistas por motivo de óbito aumentaram 86% entre os motoristas de veículos utilitários e 71% entre os caminhoneiros, por exemplo. Condutores de ônibus urbanos ou rodoviários também morreram mais: 48% e 43%, respectivamente. Ainda nos empregos ligados à mobilidade, os falecimentos foram bem além do previsto entre os manobristas, fiscais de transportes coletivos, frentistas e motoboys.

 

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No setor de comércio e compras, houve aumentos de 28% a 67% nas mortes entre operadores de caixa, embaladores, fiscais e gerentes de lojas e supermercados, para citar alguns. E, nos serviços, foram identificados mais óbitos de porteiros, vigilantes, recepcionistas de consultórios, balconistas de farmácias, cuidadores de idosos, agentes funerários e sepultadores, entre outros, com saltos de entre 34% e 87% nas categorias mencionadas.

Os dados do Novo Caged são limitados aos trabalhadores do mercado formal, com carteira assinada em regime CLT, e não detalham a causa das mortes. Além disso, houve uma mudança na metodologia de coleta usada pelo ministério a partir de janeiro de 2020.

Desta forma, é possível apenas presumir que os aumentos destoando do histórico recente estejam direta ou indiretamente ligado à pandemia, numa adaptação dos cálculos do “excesso de mortalidade”, proposta inicialmente pela Lagom Data. Esse acompanhamento dos indicadores de óbitos é uma estratégia utilizada pelos epidemiologistas e recomendada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) para avaliar os efeitos da Covid-19.

Estudo do Conselho Nacional dos Secretários de Saúde (Conass) revelou que o excesso de óbitos no Brasil foi de 22% no ano passado. Paralelamente, o Ministério da Economia registrou ao todo 65.711 desligamentos por morte, ou 21% a mais na comparação com a média dos anos anteriores.

 

Dados oficiais ajudariam na imunização

Treze dos 27 grupos prioritários para a vacinação contra o novo coronavírus integram a lista em função da área de atuação, segundo o Plano Nacional de Imunizações (PNI), mas somente a linha de frente da saúde aparece na primeira parte do ranking. Entre as categorias a serem contempladas estão ainda os servidores do sistema prisional, das forças armadas e de segurança ou salvamento e os educadores. Completam a fila, entre o 21° e o 27° lugares, os trabalhadores do transporte coletivo e rodoviário e dos setores portuário e industrial.

Os sistemas oficiais do Ministério da Saúde reúnem pouquíssimas informações sobre o trabalho das pessoas infectadas e mortas pelo coronavírus. Em Minas Gerais, a profissão do paciente só foi detalhada em 6,3% das fichas nos casos leves ou assintomáticos, e em 2,9% das internações e mortes confirmadas por Covid.

A amostra é insignificante, mas, curiosamente, as ocupações mais citadas entre os registros dos mineiros hospitalizados ou falecidos foram: cozinheiro do serviço doméstico, trabalhador agropecuário, empregado doméstico de serviços gerais, comerciante varejista e pedreiro.

 

Na avaliação do epidemiologista Diego Xavier, pesquisador do Laboratório de Informação em Saúde da Fiocruz, um melhor preenchimento das fichas poderia ajudar as autoridades de saúde a aperfeiçoarem os critérios do programa de imunização, considerando especialmente o vácuo de dados sobre os trabalhadores informais e autônomos.

“De forma empírica, todo mundo imagina que um motorista esteja mais exposto do que um profissional da saúde fora da linha de frente, por exemplo, pois teoricamente um nutricionista ou um psicólogo pode receber um paciente por vez, tomando todos os cuidados. Na prática, algumas pessoas acabam beneficiadas por se enquadrarem em um critério mais geral”, analisa.

O especialista ressalta que a digitação dos registros é feita pelos próprios servidores da rede assistencial, que na maioria das vezes não possuem tempo, orientação ou condições adequadas e, por isso, terminam preenchendo apenas os campos obrigatórios.

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) informou não possuir nenhum estudo ou pesquisa amostral cruzando informações de ocupação profissional e Covid-19. Os principais sindicatos das categorias citadas em Belo Horizonte e Minas Gerais não responderam ou disseram não possuir levantamentos próprios.

 

 

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