Centenas de pessoas com fibrose cística – doença incurável que sem tratamento pode levar à morte – estão há mais de um ano sem medicamentos em Minas Gerais. Em uma lista de 40 remédios que deveriam ser fornecidos pelo Estado, 30 estão indisponíveis nos estoques, segundo a própria Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG), por falta de dinheiro. Além disso, nove das 13 fórmulas e suplementos usados na dieta dos pacientes também estão em falta. A situação tem feito com que pessoas sejam internadas com frequência e até mesmo morram sem a devida assistência.

Desde 2002, o governo de Minas é obrigado a fornecer os medicamentos aos pacientes em função de uma Ação Civil Pública (ACP), movida pelo Ministério Público, a pedido da Associação Mineira de Assistência a Mucoviscidose – Fibrose Cística – (Amam). A justiça entendeu como urgente esse apoio em função da gravidade da doença e do alto custo do tratamento que varia de R$ 10 mil a R$ 50 mil por mês, valor inviável para a maior parte dos doentes.

Segundo a presidente da associação, Claudiana de Souza Armendane Silva, há muitos anos faltam alguns medicamentos. Mas a situação se agravou nos últimos 12 meses, com mais remédios indisponíveis e por um tempo maior. A SES-MG não sabe informar quantas pessoas têm a doença no Estado, mas explicou que 449 pacientes estão cadastrados para receberem a assistência em Minas. Segundo estimativas da Amam, pelo menos 650 mineiros têm a doença em 205 cidades.

A publicitária Maíra do Nascimento, 32, é uma delas. Sem remédios há um ano, ela já se internou três vezes desde janeiro. Agora, inclusive, ela está em um hospital. “Internei no domingo por causa de uma infecção pulmonar e devo ficar aqui duas semanas. Tudo isso porque não consigo fazer o tratamento adequadamente”, lamenta.

A situação é grave, como alerta o pneumologista pediátrico Alberto Andrade Pergara. “A falta desses medicamentos tem sido muito grave, porque nós temos perdido pacientes. Pessoas estão morrendo, e outros estão tendo pioras consideráveis em seus quadros. Algo tem que ser feito urgentemente, caso contrário teremos uma mortalidade enorme neste ano”, alertou.

 

Ministério Público pediu multa e deve se reunir com secretaria

O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) informou que vai tomar providências em função do descumprimento da decisão judicial de garantir medicamentos para pessoas com fibrose cística por parte do Estado. “A ação é de 2002, e o MPMG já pediu multa em função do descumprimento. Mas, em paralelo, estamos conversando com o Estado para tentar disponibilizar esses medicamentos o mais rapidamente possível”, disse a promotora de Defesa da Saúde, Maria Regina Lages Perilli.

Já existe uma reunião marcada entre ela e representantes da Secretaria de Estado da Saúde (SES-MG) para semana que vem. Segundo Maria, outras medidas estão sendo analisadas, mas elas não foram detalhadas.

Segundo a SES-MG, a ausência de medicamentos ocorre devido à falta de disponibilidade do fornecedor e pela crise financeira. Quanto à resolução do problema, a secretaria informou, em nota, apenas que “está tomando todas as medidas necessárias para regularizar os estoques de medicamentos, de acordo com a disponibilidade de recursos”.

Enquanto isso, pacientes como Wellington de Souza, 30, fazem de tudo para sobreviver. “Desde que comecei a ficar sem remédio, há um ano, tive uma queda da minha capacidade pulmonar. Por isso, estou internando de três em três meses para amenizar a falta de ar”, conta.

Representantes da Associação Mineira de Assistência a Mucoviscidose prometem não desistir. “Tem 15 anos que o Estado tenta parar de dar esses remédios. Mas já é um direito garantido. Não vamos abrir mão”, afirma um dos representantes, Wagner de Lima Vaz.

 

Diagnóstico

“Minas foi pioneira na triagem neonatal, dando o diagnóstico da fibrose cística por meio do teste do pezinho. Houve aumento da expectativa de vida dos pacientes. Mas podemos perder tudo isso.”

Alberto Pergara 

Pneumologista

 

Penalização

“Apesar de o Ministério Público estar atuante neste caso, acho que ainda falta uma punição mais grave. Parece que o Estado prefere pagar multa do que arcar com o custo da compra dos medicamentos. E a solução é urgente.”

Claudiana de Souza Armendane

Presidente da AMAM