Quatro meses depois da confirmação do primeiro caso de coronavírus no Brasil, ainda é cedo para determinar como a infecção se comporta no país e como ela se relaciona com a realidade de outras doenças aqui existentes, como dengue e Chagas. É cedo também para determinar quais fatores, entre eles idade e comorbidades anteriores, são determinantes para que um paciente evolua para a forma mais grave da Covid-19 que requer, aliás, uso de respiradores mecânicos.

A ideia é defendida pela professora Milena Soriano Macolino, coordenadora de um estudo da Faculdade de Medicina da UFMG que está coletando dados de hospitais de Minas Gerais e mesmo de outras regiões do país para criar uma “calculadora de risco” para o Covid-19.

Quando analisadas, as estatísticas permitirão que médicos e enfermeiros na linha de frente avaliem com mais precisão o risco de um paciente evoluir rapidamente para a forma grave da doença. Os estudos, de acordo com a cientista, podem ainda ajudar as equipes de saúde a entenderem qual o nível de assistência que cada infectado internado requer e a necessidade de reavaliações mais frequentes. Em um cenário de ameaça de escassez dos leitos de UTI, a análise também poderá apoiar as centrais de internação para que planejem uma melhor alocação dos pacientes nos leitos disponíveis.

“Nós estamos analisando uma base de dados disponibilizada pelos nossos colaboradores para montar essa calculadora. Nós queremos avaliar quais fatores apresentados pelos pacientes nas primeiras 24 horas de internação são determinantes para que ele evolua para doença grave. Investigamos o que aconteceu depois da internação, se ele melhorou, piorou ou evoluiu para óbito. Nós faremos uma análise estatística, determinando pesos para cada fatores para entender quais ocasionam doença grave ou mortalidade. O peso é que será usado na calculadora”, detalha a professora da UFMG.

Segundo ela, além das comorbidades prévias do paciente e de fatores como idade, sexo e tempo de acometimento da doença, as conclusões dos exames aos quais ele foi submetido também serão incluídos para o controle de dados. “Nós avaliamos os exames feitos nas primeiras horas de internação, como exames de sangue e tomografias. Apenas esses que estão relacionados”, esclarece. O uso de medicamentos controlados anteriores à infecção será igualmente analisado.

Incentivo

Aprovado em um programa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig), o estudo receberá um aporte financeiro de aproximadamente R$ 105 mil. O projeto ainda está nas etapas iniciais e aguarda o depósito do incentivo para que sejam disponibilizadas bolsas a acadêmicos de medicina e profissionais da saúde que ajudem na coleta e na análise de dados.

“Nós fomos selecionados no financiamento da Fapemig que será necessário para aumentar a força-tarefa. Atualmente, nossos parceiros são os profissionais de saúde que atuam na linha de frente e além de cumprirem plantões atendendo pacientes, tiram um tempo para contribuir com a causa. Com o incentivo conseguiremos acelerar o estudo. Quanto mais rápido, melhor”, aponta a cientista.

O trabalho coordenado por Milena conta com o apoio de cerca de 80 pessoas que atuam em hospitais de Minas Gerais e do restante do país, responsáveis por cadastrar os dados coletados pelas unidades de saúde em que trabalham na plataforma. Entretanto, só são credenciadas as informações daqueles hospitais que integram a pesquisa.

“O estudo começou efetivamente em maio. Existe todo um trâmite pelo comitê de ética, então apesar de ter sido aprovado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa em abril, os hospitais requisitaram a aprovação direta pelo comitê de ética, então têm hospitais que ainda estão em trâmite. A base está em construção. A coleta é feita em uma plataforma eletrônica, padronizada, profissionais dessas instituições entram com os dados que são encaminhados para uma base de dados centralizada”, detalha.

Hoje, o grupo busca por mais hospitais parceiros para aumentar a rede de estatísticas coletadas. “Ainda está aberta a participação de novos hospitais no estudo, queremos que seja realmente uma pesquisa colaborativa. Além da criação da calculadora de risco, esse projeto também pretende conhecer o perfil da doença na nossa comunidade. Temos muitos estudos hoje focados nos Estados Unidos, na Europa e na China. Só que temos uma realidade própria de desigualdade social e outras doenças concomitantes como Chagas, dengue e infecções pneumáticas. Tudo pode gerar alguma diferença. Precisamos entender as complicações dessa doença que é relativamente nova na nossa comunidade”, detalha.

Hospitais interessados em participar do estudo podem indicar até três profissionais para coleta de dados e encaminhar a solicitação para o e-mail registrocovidufmg@gmail.com