O fechamento do aeroporto Carlos Prates, anunciado nesta terça-feira (14 de março) para o dia 1º de abril, poderá causar um colapso na aviação do país. Pelo menos é o que argumenta Estevan Velásquez, presidente da Associação dos Concessionários, Usuários e Amantes do Aeroporto Carlos Prates (Voa Prates). Com o fim do aeródromo, o futuro de 15 empresas - entre elas cinco escolas -, seus 500 empregados diretos e os cerca de mil pilotos que formam anualmente no local estariam com seus futuros ameaçados.
"A gente não foi procurado, não foi de qualquer forma consultado. Estão tomando essa decisão de supetão, no calor das emoções, sem nem entender o impacto que isso vai trazer. Não existe, sequer, estudos de impacto e de viabilidade dessa medida. Tenho 500 profissionais hoje me ligando desesperados sem saber o que vai acontecer com eles, pois, em 15 dias, as dez empresas e cinco escolas que existem no Carlos Prates terão que fechar", pontua.
Entre as pessoas que viram com temor a notícia do fechamento do Aeroporto Carlos está a jovem Laysa Peixoto Sena Lage, de 19 anos. Ela já virou notícia após descobrir um asteroide aos 18 anos e, desde então, vem concentrando seus esforços em se tornar uma astronauta, sonho que, segundo ela, não seria possível sem o aeródromo que corre risco de fechar.
Ela estuda no local desde o 2º semestre de 2022, tendo finalizado o curso teórico recentemente e, agora, já está cumprindo suas aulas práticas, faltando ainda 34 horas de voo para finalizar o treinamento. "O Carlos Prates forma cerca de mil pilotos por ano, sendo que centenas desses alunos usam o FIES para seguir essa carreira. O aeroporto é um símbolo de esperança para estudantes que, como eu, vieram de um contexto periférico. O fechamento do aeroporto representa uma perda enorme para toda a sociedade", pontua.
Ela lembra ainda que o aeroporto também é o local onde são realizados os treinamentos dos pilotos de resgate, do Corpo de Bombeiros, e das polícias, serviços de extrema importância para a sociedade.
Laysa conta que o sonho de se tornar astronauta surgiu na infância e, consequentemente, o amor pela aviação veio logo em seguida. "Eu não seria capaz de realizar esses sonhos sem o apoio que o aeroporto Carlos Prates. Sem ele, meu sonho e o de centenas de estudantes serão interrompidos", lamenta a jovem.
Ainda de acordo com Velásquez, uma grande parte dos alunos, especialmente aqueles que usam o Fies, não terão condições financeiras e sociais de continuar com os estudos nas escolas existentes no interior de Minas e em outros Estados. "São pessoas humildes, que não têm condição e que estão endividando para conseguir realizar os seus sonhos. Eles são obrigados, para ganhar diploma, a ter a carteira de voo, e precisam dessas horas de voo para se formar. Essas pessoas trabalham, estudam e, no tempo livre, vem para cá para voar", completou.
Ausência de substituto é principal entrave
Ainda segundo o presidente da Voa Prates, o principal problema enfrentado é que não existe na região metropolitana de Belo Horizonte nenhum outro local com estrutura suficiente para abarcar toda a estrutura existente no aeródromo. "Acham que só por ter uma pista, a Pampulha comportaria. Mas não é assim, não existe um único hangar disponível lá. O Aeroporto Carlos Prates é o segundo mais movimentado de Minas Gerais, segundo maior pólo formador de pilotos do Brasil. Se fecha ele, o impacto não é só na aviação mineira, mas nacional", protesta Velásquez.
O professor Leonardo dos Santos Gomes, que dá aula no curso de aviação da Una e é especialista em segurança de voo pelo Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA), diz que o fechamento do aeroporto Carlos Prates é inevitável e vem sendo postergado por anos, porém, o principal entrave seria encontrar um novo lugar para que os voos de instrução aconteçam.
“Os voos de instrução são muito importantes para a sociedade, e, infelizmente, não é tão simples realizar a alteração das atividades desenvolvidas ali para um aeródromo como o da Pampulha, por exemplo. Lá esses voos aconteceriam junto de outros segmentos aeronáuticos, como o executivo e de transporte de passageiros. E aí, sim, haveria um impacto maior para a comunidade”, argumenta o especialista.
Ele destaca ainda que, atualmente, não existe nenhuma opção pronta que poderia substituir o aeroporto Carlos Prates na Grande BH em um prazo de menos de um mês. “Temos dois aeródromos na região da serra do Cipó, que estão em uma área de menor densidade demográfica. Entretanto, logisticamente falando, em termos de socorro em caso de um grande sinistro (acidente), ficaria muito mais complexo”, complementa Gomes.
Eduardo Pinto de Souza, que é proprietário do Fly-in Serra do Cipó, um destes empreendimentos citados pelo especialista, acredita que a região não teria condições de abrigar todas as atividades que hoje existem no Carlos Prates.
"Tem lugar para os aviões, para oficina. Mas as escolas é que é complicado, pois já temos o movimento no fim de semana, temos paraquedismo aqui, então nos fins de semana não poderia ter aula. Além disso, aqui é um condomínio, então tem vários habitantes que usam o aeródromo também", detalhou.
Ainda conforme o presidente da Voa Prates, Estevan Velásquez, a entidade fez um estudo minucioso sobre os aeroportos existentes em um raio de 150 km de BH, tendo sido constatada a existência de cerca de quatro pistas, mas, a maioria delas, já saturadas ou ainda sem a infraestrutura necessária para receber as atividades.
"Não é algo que se faz da noite para o dia. Em Pará de Minas, já está extremamente saturado, pois já tem duas ou três escolas e vários hangares em manutenção. Divinópolis não tem espaço para comportar os aviões. Na Pampulha, se a gente leva dois ou três aviões eles já não dão conta do nosso tráfego", detalha. O prefeito de Belo Horizonte, Fuad Noman, disse, em entrevista exclusiva a O TEMPO, que está em conversas com o Executivo municipal em Pará de Minas para transferência da demanda.
Em 2021, a associação levou 25 das 120 aeronaves que operam no Carlos Prates e o protesto fechou o Aeroporto da Pampulha, o que provaria a incapacidade do terminal abrigar todas empresas e escolas.