As chuvas que assolaram Ouro Preto, na região Central do Estado, nesta semana, reacenderam o sinal de alerta da cidade, que coleciona áreas de risco. Famosa pela arquitetura barroca, sua topografia irregular torna-se ameaça frequente para o patrimônio histórico nessa época do ano. O município tem 313 pontos, que englobam 1.361 imóveis e 5.670 pessoas, em risco geológico alto ou muito alto, conforme o Diagnóstico da População em Áreas de Risco Geológico, elaborado pelo Serviço Geológico do Brasil em 2016. 

Parte desses imóveis é de igrejas e casarões tombados pelo patrimônio histórico, como o Solar Baeta Neves, destruído por um deslizamento na última quinta-feira (13). Somente neste mês, a Defesa Civil de Ouro Preto contabilizou nove ocorrências – oito de deslizamentos de terra e uma de inundação. Cerca de 80 famílias foram retiradas de áreas com potencial para acidentes geológicos graves. Ao todo, 265 pessoas ficaram desalojadas (saíram de suas casas), 47 desabrigadas (perderam suas casas), e houve uma morte. 

Para o geólogo Adelbani Braz, professor aposentado da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a segurança em Ouro Preto começa a ser mantida pela não intervenção do homem nas áreas de risco. 

“Esse evento que ocorreu era previsível. Fizeram obras lá e cortaram o morro, intensificando a probabilidade de cair. Dentro de Ouro Preto, qualquer intervenção deveria ser proibida ou estudada com detalhes para minimizar os riscos”, diz o especialista. 

Adelbani explica que a formação rochosa de Ouro Preto e das cidades próximas é bastante heterogênea. O tectonismo (movimento da crosta terrestre) <CW-5>intenso da região fez com que diferentes tipos de rocha se instalassem naquele espaço. Isso deixa estruturas menos rígidas perto de outras que são mais sólidas. Como as pessoas não sabem fazer a diferenciação quando constroem os imóveis, há sempre o risco de realizar intervenções nas partes menos seguras.

"Deveria ser implantado um sistema contínuo de monitoramento das áreas de risco. Como já temos muitas construções, elas deveriam passar por intervenções permanentes de engenharia para prevenção em qualquer sinal de alteração do terreno. O patrimônio histórico deveria ajudar e trabalhar junto”, avalia o geólogo.

De acordo com a Defesa Civil da cidade, em 2012, o local onde estava o Solar Baeta Neves foi interditado em função de estudos que apontaram riscos geológicos. Ninguém se feriu no deslizamento do morro da Forca graças à ação rápida da equipe acionada pela própria população ao avistar a movimentação do solo da encosta. 

“Investimos em treinamento e capacitação não só de pessoal, mas também com orientações para a população sobre os riscos geológicos que rodeiam a nossa cidade. Ninguém se feriu porque existiu essa força-tarefa entre sociedade e Defesa Civil,” disse o engenheiro e geólogo da Defesa Civil de Ouro Preto Charles Murta. 

Prefeitura alega ter ‘zona de proteção’
A Prefeitura de Ouro Preto informou, ontem, que abriga uma “Zona de Proteção Especial”, onde está a maioria dos prédios históricos da cidade, para evitar desastres. Mas não informou quantos imóveis tombados estão em locais sob risco. A administração municipal também disse que disponibiliza um site com informações da Defesa Civil e faz monitoramento das áreas de risco. 

O Ministério Público Federal (MPF) abriu procedimento administrativo para investigar as causas do desabamento do Solar Baeta Neves, e o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) quer esclarecimentos sobre medidas preventivas. 

A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) lamentou, ontem, a destruição dos casarões atingidos pelo desmoronamento em Ouro Preto. Em nota, a diretora e representante da entidade no Brasil, Marlova Noleto, destaca a necessidade de ações preventivas para a proteção do patrimônio cultural comum.

“Creio que salvamos cerca de 150 pessoas”
A representante da Defesa Civil de Ouro Preto, Paloma Magalhães, é engenheira de Minas e estudante de engenharia urbana pela Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop). Ela foi a primeira representante das autoridades a chegar ao morro da Forca, cerca de 20 minutos antes do desabamento, e interditou a via. 

Como você conseguiu chegar ao local antes de o desabamento ocorrer? Quando estava indo para o trabalho, fui parada por um motorista de ônibus, Sebastião Mendes. Ele informou que achou estranha a forma como a vegetação estava no morro da Forca, e me pediu para ir até o local. Fui imediatamente.

Qual foi sua primeira iniciativa ante o desabamento iminente? Chegando ao local, percebi que, de fato, o local poderia ceder. No mesmo instante, pedi socorro ao Corpo de Bombeiros e demais amigos da Defesa Civil e isolei a área, que é movimentada.

Com o isolamento da área em tempo hábil, quantas possíveis vítimas foram salvas? Como a região é muito movimentada, liga vários bairros, por ela passam várias linhas de ônibus, creio que salvamos cerca de 150 pessoas.

Em quanto tempo depois de isolada a área cedeu? Não sei exatamente o horário, mas creio que 20 minutos depois.

Qual orientação você dá para as pessoas que moram ou transitam em áreas de risco geológico? Fique atento a tudo, repare ao seu redor. Caso veja alguma coisa diferente no solo, chame imediatamente a Defesa Civil, que está pronta para ajudar.

Vale soa alerta de emergência de barragem
Além dos riscos geológicos que circundam Ouro Preto, os moradores da cidade foram surpreendidos, ontem, por um alerta de emergência na barragem Area IX de rejeitos da Vale. Localizada na mina de Fábrica, ela elevou seu nível de 1 para 2 por conta das chuvas fortes. Isso quer dizer que há uma anomalia “não controlada” na estrutura. Segundo a mineradora, a barragem está desativada, é contemplada no programa de descaracterização, não havendo necessidade de evacuação.