Em tempos de pandemia, a saúde se tornou a maior preocupação dos brasileiros – atrás até do desemprego e da recessão, conforme o Paraná Pesquisa. E um levantamento realizado pelo jornal O TEMPO junto às secretarias estaduais de Fazenda revelou que Minas Gerais é o que menos gasta com a área proporcionalmente às receitas, mesmo com o acréscimo de R$ 600 milhões nos gastos públicos deste ano por conta da Covid-19. No período, a arrecadação foi de R$ 25 bilhões.
De acordo com o Relatório Resumido de Execução Orçamentária (RREO), enviado bimestralmente ao Ministério da Economia, pouco mais de R$ 1,9 bilhão foram efetivamente investidos em hospitais, campanhas de prevenção e criação de novos leitos, por exemplo, até junho deste ano. O índice, segundo o documento, corresponde a 7,76% de toda a receita do governo. Para o período, a "reserva" de gastos foi de R$ 3,09 bilhões, porém só 45% efetivamente chegou para a saúde – o Estado tem até o final do ano para equilibrar a balança.
O mínimo constitucional previsto para a saúde é de 12% da arrecadação, segundo a Lei de Responsabilidade Fiscal. Na ponta do ranking, estão estados que já chegaram a investir quase 18% desse valor, como o Pernambuco. Em seguida, aparecem Pará (16,47%) e Sergipe (15,67%). Além de Minas, as regiões que menos gastaram no setor foram Rio de Janeiro (8,18%) e Paraná (9,63%).
Para o professor de direito administrativo do Ibmec, Leonardo Spencer, o governo pode ter dificuldade em cumprir a lei nos próximos seis meses. "O gasto tem que estar empenhado, processado e liquidado. Se porventura isso não tiver ocorrido , será complicado o Estado atingir o percentual. Eu nem diria que é por conta da situação atual de queda de arrecadação, mas pelo tempo", explica. No ano passado, o índice ficou em 12,75%, porém foram contabilizados os chamados restos a pagar – quando os serviços ocorreram, mas não foram pagos até o dia 31 de dezembro.
O especialista lembra que essa situação, apesar de não ser ilegal, cria a famosa bola de neve. "É um artifício comum, mas quem vai analisar essa questão é o Tribunal de Contas, que pode fazer uma análise desses mínimos constitucionais e aprovar com ressalvas e recomendação de correção no próximo ano. É bem provável que isso ocorra novamente", acrescentou.
Impacto nos municípios
E uma das consequências para a situação atual é o impacto das contas dos municípios, que precisam custear parte dos serviços que deveriam ser financiados pelo Estado. É o caso de Belo Horizonte, em que o setor da saúde já chegou a representar 30% de todas as receitas. "As prefeituras ficam muito pressionadas, já que estão na ponta. Enquanto o Estado segura, a conta estoura na mão dos prefeitos. E essa situação certamente vai pior no fim do ano por conta da pandemia", argumentou.
SES diz que índice é de 16%
A Secretaria de Estado de Saúde (SES) rebateu e garantiu que, para o cálculo, é preciso considerar as despesas empenhadas – recursos reservados ao pagamento de serviços planejados e contratados para a área. De acordo com a pasta, o valor seria de R$ 4,7 bilhões até agosto, o que corresponde a 16% da receita. "Dessa forma, os serviços em saúde estão sendo executados normalmente e até ampliados para a população mineira", completa.
E diante da "prioridade máxima no enfrentamento à pandemia", a secretaria lembra que já investiu R$ 600 milhões a mais que no mesmo período do ano passado – os dados do relatório revelam que os recursos efetivamente aplicados na área somaram R$ 1,3 bilhão (5,03% da despesa total na época). Além disso, a nota informou que a gestão atual arcou em 2019 com parte da dívida de R$ 900 milhões herdada do ex-governador Pimentel e cumpriu o mínimo constitucional de 12%.
Contas ainda serão alvo de discussão
Responsável por fiscalizar os gastos públicos, o Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (TCE-MG) informou que as contas do governador em 2019 "estão em análise e ainda não foram submetidas ao Pleno para emissão de parecer". O órgão lembra que a inclusão dos restos a pagar nas despesas de saúde podem ser objeto de "discussão em plenário".
Já o Ministério da Economia lembrou que o simples cálculo do mínimo constitucional informado no RREO "não é suficiente para a correta apuração dos valores". Em nota, a pasta enfatizou que há despesas custeadas com recursos transferidos pelo governo federal através de fundos como o da Saúde. "Para o mínimo são consideradas somente as despesas com receitas de impostos", finalizou.
Gasto em saúde dos Estados de janeiro a junho
Rio Grande do Norte - 23,19% (R$ 180,2 milhões)
Pernambuco - 17,88% (R$ 619,4 milhões)
Pará - 16,47% (R$ 1,3 bilhão)
Sergipe - 15,67% (R$ 384,4 milhões)*
Distrito Federal - 15,58% (R$ 1,3 bilhão)
Espírito Santo - 15,47% (R$ 848 milhões)
São Paulo - 14,26% (R$ 9 bilhões)
Roraima - 14,1% (R$ 242 milhões)
Santa Catarina - 13,38% (R$ 1,5 bilhão)
Ceará - 13,35% (R$ 1,1 bilhão)
Acre - 13,32% (R$ 307,4 milhões)
Piauí - 13,25% (R$ 805,8 milhões)
Amapá - 13,17% (R$ 273 milhões)
Maranhão - 13,16% (R$ 853 milhões)
Goiás - 12,96% (R$ 1,1 bilhão)
Alagoas - 12,9% (R$ 523 milhões)
Mato Grosso do Sul - 12,71% (R$ 449,9 milhões)*
Bahia - 12,69% (R$ 1,8 bilhão)
Amazonas - 11,9% (R$ 1,1 bilhão)
Rondônia - 11,6% (R$ 361,5 milhões)
Paraíba - 11,54% (R$ 549 milhões)
Rio Grande do Sul - 11,94% - (R$ 1,7 bilhão)
Mato Grosso - 10,03% (R$ 644 milhões)
Paraná - 9,63% (R$ 1,5 bilhão)
Rio de Janeiro - 8,18% (R$ 1,6 bilhão)
Minas Gerais - 7,76% (R$ 1,9 bilhão)
*dados disponíveis só até o segundo semestre do ano
**Tocantins não apresentou os números