Com o quilo de feijão custando cerca de R$ 8 no município de Barão de Cocais, na região Central de Minas Gerais, viver longe da própria horta têm sido inviável para muitos moradores das comunidades evacuadas da Zona de Autossalvamento da barragem Superior da mina Gongo Soco, no dia 8 de fevereiro.
Na última terça-feira (7), a Vale substituiu a entrega de uma cesta básica completa a cada quinze dias pelo pagamento de um cartão-alimentação no valor de R$ 405. Ainda que alguns moradores apoiem a nova medida, outros afirmam que o valor sequer dá para custear os alimentos básicos ao longo do mês, principalmente tendo em vista as famílias com maior número de integrantes.
"Em casa eu tinha minha horta, meus alimentos plantados. Só ia para a rua buscar o básico como arroz e feijão. Agora, com o dinheiro da Vale não dá pra comprar as verduras, as frutas, o quilo do feijão está quase R$ 8 aqui. Só minha família gasta mais de cinco pacotes por mês", comenta Ana Souza, de 33 anos.
Ela mora em um imóvel alugado pela Vale e divide o espaço e os alimentos com suas duas filhas, de 2 e 10 anos, e seu marido. "O cartão veio para substituir a cesta, mas eu preferia antes. A cesta vinha com frutas, legumes e carnes a cada quinze dias. Agora com o cartão não dá para comprar tudo que a gente recebia", comenta.
Ana vive uma situação complicada após a evacuação. Seu marido, fonte de renda da família, ficou desempregado depois que a empresa onde ele trabalhava também precisou ser evacuada. Na comunidade do Socorro, onde vivia, ela também dava aulas particulares para crianças em casa. No entanto, essa fonte também foi perdida.
"Tenho muita dificuldade de comprar as coisas, tudo é caro e agora as crianças veem doces, picolés, algodão-doce...", desabafa Ana.
Carlos Leal, de 69 anos, é um dos integrantes da comissão formada pelos moradores evacuados. Como vive sozinho, ele afirma que a troca da cesta pelo cartão foi boa para ele. No entanto, ele teme o futuro das famílias com muitos integrantes. "Para uma pessoa solteira o cartão é mais vantajoso, ela tem a opção de comprar o que precisa. Mas existem muitas famílias grandes. Se para elas a cesta já não dava, imagina alimentar todo mundo com R$ 405".
Ele explica que a comissão de moradores, com o apoio de um advogado custeado pela Vale, quer pedir na justiça que a mineradora pague uma renda mínima para cada família. "Seria pago R$ 980 para a pessoa responsável pela principal fonte de renda da família e um percentual para cada membro", explica.
Se o problema financeiro pode ser solucionado, os moradores acreditam que o sossego que eles tinham antes da evacuação jamais será restituído. "Nada que a Vale faça pode substituir a vida que nós tínhamos nas nossas comunidades. Por mais simples a vida que nós tínhamos, vivíamos bem melhor do que aqui na cidade. Não temos mais liberdade, tem gente que sente até falta dos passarinhos", desabafa Leal.
Resposta após polêmica
Os moradores contaram que a Vale tem custeado o gás de cozinha, a moradia e as despesas básicas, como água, luz e transporte escolar das crianças.
Procurada a Vale não informou como foi estabelecido o valor de R$ 405 a ser pago para as famílias. A mineradora comunicou apenas que a fornecimento da alimentação passou a ser pelo cartão-alimentação e o valor pago é acrescido de 20% por dependente.
"Essas famílias também receberam ajuda emergencial no valor de R$ 5 mil. A empresa ainda instalou escritório na cidade destinado à solução consensual, célere e justa para indenização por danos materiais e morais", informou a empresa por meio de nota.