Patos de Minas

Professor é suspeito de manter doméstica em situação análoga à escravidão em MG

Após denúncias, mulher foi resgatada por fiscais do MPT e pela Polícia Federal; família é suspeita de mantê-la sem salário, em jornada excessiva e com proibição de folgas

Por Lara Alves e Renata Evangelista
Publicado em 21 de dezembro de 2020 | 16:39
 
 
 
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O Ministério Público do Trabalho (MPT) abriu um inquérito após receber denúncias de que um professor universitário de Patos de Minas, na região do Alto Paranaíba, mantinha em seu apartamento uma empregada doméstica em condições análogas à escravidão. Após a circulação da queixa – que levou fiscais do órgão e agentes da Polícia Federal (PF) a resgatarem a mulher no mês de novembro, instituições de educação que empregam o suspeito optaram por afastá-lo de seus cargos nesta segunda-feira (21) e, segundo informações, professor e família dele deixaram o município e pronunciam-se apenas através de notas.

A suspeita de que a empregada doméstica era mantida sem salário e sem concessão de folgas e obrigada a cumprir jornadas longas e exageradas levaram a Justiça de Minas Gerais a ir atrás da família e, agora, audiências estão em curso e foram acrescidos nos autos relatos de fiscais do trabalho que apuraram o cenário em que a mulher era mantida no ambiente doméstico. À reportagem, o MPT de Minas Gerais declarou que, em ritmo de urgência, espera-se que seja assinado um Termo de Ajuste de Conduta para reparação espontânea de danos morais e materiais sofridos pela mulher. Além da reparação, a lei prevê punição criminal por manter trabalhador em condições análogas à escravidão.

A denúncia que levou à retirada de Madalena Gordiano do apartamento do professor em Patos de Minas no mês de novembro foi relatada nesse domingo (20) em reportagem no Fantástico, na qual a mulher relembra ter iniciado sua trajetória com a família há 38 anos. Ela disse que, com oito anos de idade, começou a trabalhar como empregada doméstica para a mãe do professor e, anos depois, foi repassada para que continuasse os cuidados com o filho da patroa. Fiscais do MPT souberam da situação após vizinhos do apartamento do suspeito receberem bilhetes de Madalena pedindo ajuda financeira para compra de itens de higiene pessoal.

Até esta segunda-feira, sabe-se que a denúncia contra a família do professor – e ele próprio – indica que a empregada não recebia salário, não podia tirar folgas ou horários para descansar e cumpria uma longa jornada de cuidados domésticos. Ministério Público do Trabalho detalhou em nota à reportagem que os relatos levavam a crer na existência de uma dependência financeira da mulher em relação à família e, portanto, não poderia sair de lá – sem ter para onde ir ou recursos para se manter. Uma ação cautelar permitiu a entrada da Auditoria-Fiscal do Trabalho e da Polícia Federal no apartamento, quando houve comprovação de fatos citados. “Durante a fiscalização judicialmente autorizada, foi flagrada situação de graves violações a direitos humanos, o que resultou no resgate da empregada”, disse o órgão em nota.

Agora, audiências são feitas com o suspeito, a família dele e a empregada doméstica – até agora, de acordo com informações obtidas, apenas o professor universitário foi ouvido na família. De acordo com o MPT, inicialmente tenta-se uma reparação espontânea dos danos materiais e morais causados à mulher. “Na impossibilidade desse acordo administrativo, caberá o ajuizamento de ação civil pública perante a Justiça do Trabalho”, afirmou o Ministério Público. Além da punição financeira, professor e família podem ser incluídos na lista suja do Ministério da Economia e também responderem criminalmente. O Código Penal prevê prisão de até 16 anos para quem comete o crime de reduzir alguém a condição análoga à de escravo.

Perdeu o emprego

Após veiculação da denúncia, o professor retirou-se de Patos de Minas e foi afastado de seus cargos nas faculdades onde trabalha. Em nota encaminhada à reportagem nesta segunda-feira (21), o Centro Universitário de Patos de Minas (UNIPAM) e a Fundação Educacional de Patos de Minas (FEPAM) comunicaram o afastamento do suspeito e alegaram repudiar a conduta atribuída ao professor. “Tranquilizamos a todos: corpo discente, docentes e funcionários, bem como a comunidade em geral, de que todas as medidas cabíveis e legais já estão sendo tomadas”, disseram as instituições em nota conjunta.

‘Divulgação prematura e irresponsável’

Procurado na tarde desta segunda-feira (21), o advogado Brian Epstein Campos, que representa o professor, classificou a circulação do teor da denúncia como uma “divulgação prematura e irresponsável pelos fiscais e agentes do Estado” e declarou que “viola direitos e dados sensíveis daquela família e vulnera a segurança pessoal deles”. Ele também disse que a defesa não teve acesso a todos os elementos relacionados à denúncia feita. Leia abaixo a nota na íntegra:

“Patos de Minas, 21 de dezembro de 2020. Com respeito a todas as interpretações e ao direito de manifestação possíveis e válidas numa democracia, a defesa informa que ainda não teve acesso a todos os elementos que envolvem a senhora Madalena. A divulgação prematura e irresponsável, pelos fiscais e agentes do Estado, antes de um processo que por sentença reconheça a culpa, viola direitos e dados sensíveis daquela família e vulnera a segurança pessoal deles. A defesa seguirá, discreta e séria, atuando exclusivamente nos limites constitucionais e do Devido Processo Legal. Estamos em um momento de confraternização cristã e uma reflexão cautelosa, após conhecimento de todos os fatos nunca criará prejuízos”.

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