Vulneráveis

Projeto sugere à PBH que abrigue pessoas em situação de rua em prédios ociosos

Iniciativa mapeou os locais, que seriam capazes de abrigar esses indivíduos de forma preventiva frente à pandemia

Por Daniele Franco
Publicado em 13 de abril de 2020 | 17:47
 
 
 
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Uma iniciativa de pesquisadores da UFMG e entidades da sociedade civil está concentrada em encontrar soluções para sanar os problemas da população em situação de rua de Belo Horizonte durante a pandemia do novo coronavírus. Uma das principais ações propostas é a alocação dessas pessoas em edifícios ociosos no hipercentro de BH, projeto que já tem as edificações mapeadas e o planejamento de abrigamento em construção.

Segundo o trabalho, feito pela Escola de Arquitetura da UFMG em 2014, 84 edificações estavam vazias à época. "Hoje, estimamos que pelo menos 22 desses locais ainda estejam vazios e possam receber essas pessoas que quiserem se abrigar. Precisamos aproveitar que esse abrigamento tem sido uma demanda deles nesse tempo de epidemia", detalhou o cientista social e membro da Associação Arquitetas Sem Fronteiras, Eduardo Gontijo.

O ativista explicou que, desde que a epidemia começou, junto com as recomendações de isolamento, quem trabalha com a população em situação de rua na cidade já notou um aumento na demanda deles por abrigos. "Os abrigos estão lotados e acredito que esta seja uma oportunidade importante para trabalhar com essas pessoas, entender as necessidades e criar políticas públicas não só para a pandemia, mas também ao fim dela", opina.

Para Gontijo, garantir formas de abrigar a população de rua vai facilitar o trabalho da PBH. A proposta foi enviada, segundo ele, há cerca de 15 dias. Procurada, a prefeitura informou que ainda está analisando o projeto e que não houve aumento na demanda por vagas nos albegues na capital.

Ajuda

A tentativa mais recente do grupo para estabelecer um diálogo com o poder público foi uma carta enviada à Prefeitura da capital na última sexta-feira (10). Nela, os ativistas oferecem ajuda na elaboração de políticas públicas de proteção a essas pessoas socialmente vulneráveis.

Na carta, os autores citam a abertura de 300 vagas para pessoas sintomáticas abertas no Sesc Venda Nova na última semana, mas ponderam que cerca de 9 mil pessoas vivem nas ruas de BH. "Sabemos que o desafio é muito grande e que o poder público não tem condições de fazer tudo sozinho, e a carta vem justamente para nos colocar à disposição, é uma tentativa de abertura ao diálogo para que as instituições trabalhem unidas em prol dessas pessoas", explica o professor André Freitas Dias, coordenador do programa Polos de Cidadania, UFMG.

Além do Polos de Cidadania e da Associação Arquitetas Sem Fronteiras, a Pastoral de Rua, da Igreja Católica, também atua em prol desse público em BH. Conforme explicou a irmã Cristina Bove, membro da pastoral, a atuação política da entidade se debruça sobre a elaboração de planejamentos para abrigar essas pessoas nas edificações ociosas. "A ideia é abrigar primeiro as pessoas que estão no grupo de risco, temos muitos idosos e pessoas com doenças crônicas nas ruas, depois passar às outras faixas e grupos", adiantou.

Segundo os ativistas, os grupos já negociam com o governo do Estado a cessão do espaço da Serraria Souza Pinto, no Centro de BH, para funcionar como piloto nesse abrigamento, e só depende da aprovação da Prefeitura para iniciar o acolhimento.

A PBH informou em nota que o sistema criado no Sesc Venda Nova, de acolhimento de cidadãos sintomáticos, tem funcionado bem e que "caso haja a demanda de ampliação, o município tomará as providências necessárias em tempo hábil, já que a saúde também oferta o serviço e tem feito o monitoramento diário de casos."

Leia a carta encaminhada à PBH na íntegra:

À Prefeitura de Belo Horizonte 
Ao Senhor Prefeito Alexandre Kalil 
 
Senhor Prefeito, 
 
Em decorrência de sucessivas manifestações do Senhor na mídia, vinculadas ao atendimento da população em situação de rua nesse grave cenário de pandemia causado pelo novo coronavírus (COVID-19), gostaríamos de nos colocar a disposição de Vossa Excelência para o estabelecimento de um diálogo transparente, esclarecedor e construtivo na busca de soluções que venham salvaguardar a integridade e a dignidade deste grupo populacional, que se encontra em quadro de extrema vulnerabilidade e risco por não possuir um local adequado para se abrigar e permanecer dignamente. 
 
Em reunião presencial organizada pela Pastoral de Rua no último dia 17 de março, que contou com a presença de vários interlocutores, parceiros e apoiadores nos cuidados à população em situação de rua, dentre eles representantes das Secretarias de Saúde e Assistência Social do município de Belo Horizonte, com a afirmação de uma servidora da primeira Secretaria (de Saúde) de que já havia um Plano de Contingência Específico para este público junto à Administração Pública Municipal, manifestamos o interesse em conhecer o referido documento e a disposição em colaborar com a Prefeitura na construção e implantação de medidas emergenciais necessárias para o referido abrigamento e acolhimento digno, bem como a permanência das pessoas nestes locais com a oferta de serviços essenciais e especializados.

Cientes das medidas já adotadas de contingenciamento para 300 pessoas sintomáticas com o novo coronavírus (COVID-19), salientamos a necessidade, como já é de conhecimento de Vossa Excelência, da ampliação em caráter emergencial da quantidade vagas de abrigamento/acolhimento institucional e de outras medidas a serem tomadas. 
 
Dados do CADUNICO do último mês de fevereiro indicam que há aproximadamente 9.000 pessoas em situação de rua em Belo Horizonte, sendo que a maioria, ainda, não conta com alternativas de proteção integral nesse momento de pandemia.  O nosso esforço atual, conjuntamente com a Prefeitura de Belo Horizonte, tem por objetivo prover condições para que se efetive o acolhimento/abrigamento digno para todo este contingente de pessoas com adequação de espaços, de acordo com orientações da Organização Mundial da Saúde, assim como a implantação de outras medidas também urgentes na cidade, como a ligação e o acesso a pontos de água e a oferta de alimentação durante toda a semana, três vezes ao dia, e outros serviços de higiene. 
 
Parece-nos interessante e promissor o diálogo entre Vossa Excelência e sua equipe técnica com as entidades e instituições que compõem a iniciativa da Rua do Respeito, voltada à efetivação dos direitos da população em situação de rua em Belo Horizonte, Região Metropolitana e todo o Estado de Minas Gerais. 
 
Estamos abertos para uma reunião presencial e/ou à distância para o início do diálogo e a contribuição que se fizer necessária para que as nossas preocupações com a população em situação de rua na cidade sejam devidamente encaminhadas, de maneira ágil e cuidadosa. 
 
Atenciosamente nos despedimos com os melhores votos para Vossa Excelência. 

 

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