Aos 19 anos, Pedro Henrique Santos, morador da Vila Marimbondo, em Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte, encarou dificuldades sérias dentro de casa para realizar o sonho de jogar hóquei em um mundial, no ano passado, na Itália. Agora, em abril, ele conquistou mais uma vez a chance de disputar um torneio internacional: foi convocado pela seleção brasileira do esporte para viajar com o time para Madrid, na Espanha.
Frente a dificuldade para reunir recursos financeiros para uma viagem tão cara, treinador, amigos e fãs do "Pedrinho", como é conhecido, organizaram uma vaquinha online para ajudá-lo a conseguir o dinheiro para cobrir os custos do mundial, que acontece entre 29 de junho e 14 de julho, e seus gastos no país estrangeiro. A arrecadação acontece até o dia 15 de julho e pretende coletar R$ 9.500. Até o momento, cerca de 20% da meta firmada já foi cumprida.
História de amor
Filho de costureira e carroceiro, o adolescente conheceu o esporte quando ainda tinha 12 anos, através de um projeto da Associação Cultural e Esportiva de Hockey e Patinação Eldorado Vipers, uma entidade esportiva de assistência social. Lá aprendeu a dividir seu espaço entre as responsabilidades e seus sonhos. Pedro é o único da família que conseguiu concluir o ensino médio e, hoje, trabalha para ajudar em casa e manter os gastos com o esporte.
Em um vídeo produzido para estimular o recebimento de doações para a vaquinha, a dona Marli Jacinto dos Santos, mãe do atleta se emocionou ao falar do orgulho que sente pelo filho. "Eu tinha muito medo do Pedro se envolver com o mundo das drogas, eu que já tinha um outro filho envolvido (com as drogas). Graças a Deus apareceu o Hóquei para ele", comentou. Pedro é um entre cinco filhos, um irmão foi assassinado, outro está preso e, em casa, ele vive com a mãe, o pai, outros três irmãos e dois sobrinhos.
Não à toa, o pai também sente muito orgulho. "Eu nem acredito que ele conseguiu isso tudo, por eu ter um filho morto, um filho preso... Ter o Pedro como filho é um orgulho, é tudo de bom".
O hóquei apareceu em sua vida quando ele ainda era garoto como uma grande coincidência. "Ná época, eu praticava futebol e, num dia, por acaso, eu entrei no ginásio e fui até o quartinho onde os meninos guardavam os equipamentos de hóquei. Conversei com eles e me chamaram para jogar. Me apaixonei, depois que comecei, nunca parei. Desde lá são sete anos", contou.
A mãe também guarda recordações da época em que o filho começou. "Ele e os amigos entravam de patins aqui na minha casa e iam direto pra cozinha. Eu queria ser mãe de todos. Eles deixavam os tacos na parede e almoçavam gostoso, às vezes não tinha nem comida direito", conta emocionada.
Apesar da paixão à primeira vista, adquirir os equipamentos caros para a prática do esporte foi um outro empecilho encontrado pelo menino. "Fui pegando algumas coisas emprestadas, conquistando outras com ajuda do meu técnico, comprei uma caneleira de um amigo e ganhei capacete, patins, taco, tudo com ajuda da escolinha", comentou.
Uma corrente de apoio se formou ao redor do atleta e com apoio de amigos e conhecidos ele seguiu praticando o esporte. Em 2016, foi convocado para o mundial de juniores da França, mas não conseguiu ir. Em 2018 foi mais uma vez convocado, mas desta vez viajou para a Itália e disputou o campeonato. "No ano passado nós fizemos outra vaquinha para pagar as passagens e todas as minhas despesas foram pagas por um técnico dos Estados Unidos que me viu e gostou de mim", explica.
Dado o histórico, as expectativas são altas para sua participação na nova competição internacional. Não à toa, o irmão mais novo de Pedro também o apoia financeiramente. "Isso tudo eu estou passando para meu irmão mais novo, apoio ele financeiramente e, agora, com 12 anos, ele também pratica o hóquei".
Veja o vídeo feito para a vaquinha:
Assistência social
As primeiras partidas de hóquei em Contagem começaram a ser disputadas em 1996, mas apenas em 2002, a Associação Cultural e Esportiva de Hockey e Patinação Eldorado Vipers surgiu, fundada por por atletas do grupo inicial que já haviam formado em Educação Física.
As aulas chegaram a ser oferecidas para até 80 alunos na região do Riacho, sempre voltadas para crianças mais carentes. Em 2008, o projeto foi encerrado e só foi retomado em 2010. "Infelizmente, esses dois anos com o projeto parado foram suficientes para todas as crianças desistirem do esporte. Muitas acabaram tomando caminhos que sempre tentamos evitar", comentou Stefani Vital, atual responsável pelo projeto.
Em 2012, ele assumiu a escolinha, no Ginásio Califórnia, com apenas seis alunos, entre eles o Pedro. "A nova localização nos permitiu atender crianças carentes e crianças de classe média. E descobrimos que essa interação seria fantástica. Ano após ano novas crianças entram, mais pais se envolvem e crescemos cada vez mais", explicou. Ainda assim, os recursos para a manutenção do projeto ainda são uma grande dificuldade enfrentada diariamente.
Quando perguntado sobre Pedro, Vital aponta inúmeros elogios para o atleta. "A geração do Pedro é o principal exemplo de sucesso que temos. Ele e o Thiago representarão Contagem e o Brasil neste mundial. Thiago é um garoto que começou com o Pedrinho mas tem condições de arcar com seus gastos, como todos os outros atletas da seleção brasileira".
Hoje, o projeto, capitaneado pelo time Eldorado Vipers, atende cerca de 120 crianças e 50 adultos, sendo 15 atletas das seleções brasileiras sub-12, sub-14 e sub-16.