Assim que soube por um amigo que o então Café Bistrô Santa Sophia estava passando o ponto, ainda em 2012, o chef e um dos jurados do reality global “Mestre do Sabor” Leo Paixão começou a planejar o que seria o Glouton. E não parou mais. Ao longo dos últimos nove anos, ele recriou, redesenhou e reelaborou inúmeras vezes o que se tornou um dos restaurantes mais premiados da história da cidade. Obrigado a dar uma pausa nas atividades por causa da pandemia, Leo resolveu usar a folga forçada para planejar o que pode ser considerada quase uma refundação do Glouton.
O velho casarão foi totalmente reformado. Além de derrubar paredes, ampliar espaços e redesenhar a lógica do salão, o chef meteu (literalmente) a mão na massa e pintou ele mesmo algumas das áreas sob consultoria do amigo e arquiteto Cristiano Sá Motta. “Resolvi repensar o restaurante. Havia muitas mudanças estruturais que eu queria fazer e optei por uma grande reforma: tirei as paredes que me incomodavam, mudei o balcão e ampliei a cozinha para que todo mundo do salão pudesse visualizá-la e fiz um bar de drinks”, disse o chef e entusiasta da arquitetura. “Fiz exatamente o ambiente que eu queria. Um pouco clássico, mas com toque modernista brasileira”, emenda. O clima do restaurante também mudou: nos alto-falantes, a trilha sonora privilegia o rock inglês, estilo preferido de Paixão, com Radiohead e Oasis.
O título em inglês do programa apresentado pelo chef Jamie Oliver, “The Naked Chef” – ou seja, “o chef está nu” – poderia muito bem estar sobre o novo menu-degustação do Glouton – Leo Paixão reabre oferecendo exclusivamente esse serviço – somente com reservas – emplaca o Glouton no formato fine dining – conceito que reúne restaurantes sofisticados em serviço, decoração, arquitetura, atendimento e, claro, menu – tudo liderado pelo chef. Nas oito etapas (R$ 300, sem bebidas), Leo praticamente revela seus desejos gastronômicos mais íntimos e profundos: uma gastronomia que respeite e transforme os ingredientes, com uma técnica extremamente apurada e de influências e toques que surpreendam.
De fato: com o elevadíssimo padrão que o Glouton alcançou, não é nenhum absurdo cogitar que o restaurante seja o primeiro de Minas a figurar no disputado guia Michelin, que só recentemente passou a avaliar estabelecimentos no Brasil, incluindo São Paulo e Rio de Janeiro. “Muita gente pergunta se eu não estou tentando a estrela Michelin, mas acho válido explicar que isso não tem jeito. Eu posso montar o melhor restaurante do mundo, mas não vou ganhar nenhuma estrela se o Guia Michelin não vier para Belo Horizonte e, pra isso, precisa de investimento”, esclarece.
A já reconhecidíssima mistura das técnicas francesas, que é a origem da sua cozinha de formação, com a culinária mineira foi levada à enésima potência. Juntas, ganharam um toque inusitado e curiosamente complementar da cozinha asiática, mas sem se assumir fusion. E a experiência ultrapassa o paladar. Galinha-d’angola e camarão-tigre fresco pescado em Santos, comprado diretamente com o pescador, são as estrelas dos pratos principais, sem contar uma das entradas: ovos de codorna são cozidos em baixa temperatura, curados em shoyu, mirin, missô e servidos dentro de uma casinha de cerâmica assinada pela ceramista mineira Léa – com quem Leo desenvolveu todas as louças para receber cada etapa do menu. Os ovinhos ainda repousam sobre um ninho comestível de massa filo, regado com um dashi de katsuobushi e shitake seco defumado na casa. Para entreter, um bonsai de jabuticaba é colocado na mesa para que você mesmo colha no pé a fruta – que na verdade é um queijo de cabra glaceado com calda de jabuticaba.
Futuro. O primogênito Glouton divide a mesma calçada com o Ninita, restaurante de comida mineira da roça e gastronomia italiana cujo nome de batismo é da bisavó de Leo Paixão. Aos saudosos, pratos clássicos da cozinha do Leo, como a emblemática papada com mil-folhas de mandioca, acelga e molho de laranja, por enquanto, dão trégua e talvez voltem no novo restaurante no Vila da Serra. O chef segue na sociedade da Popolare Pizzaria e planeja reabertura do Nicolau, que vai focar mais nos petiscos e, em vez de almoço, servir jantar. Em breve, abre também o Mina Jazz Bar, com drinks e cozinha moldada do izakaya mineiro.
Bate-bola
Qual sabor sintetiza o Brasil? Moqueca. Com bastante leite de coco, dendê e frutos do mar.
Quem te inspira na cozinha? As cozinheiras. A culinária mineira é feminina.
Ingredientes preferidos? Cominho, limão, açúcar mascavo, shoyo e manteiga, que é a base da minha cozinha. Gosto muito de trabalhar com quiabo e todos os frutos do mar.
O que te tira a fome? Desperdício.
Comida de domingo? Pizza.
SERVIÇO:
Glouton
Rua Bárbara Heliodora, 59 - Lourdes
Menu-degustação em 8 tempos: R$ 300 por pessoa ou R$ 450 harmonizado
Somente com reservas: (31) 3292-4237 de segunda à sábado