Quando a lista de indicados a disputar o Oscar 2020 de melhor diretor foi divulgada, em janeiro deste ano, a regra se impôs. Dos cinco nomes listados, nenhum era o de uma diretora. A constatação reacendeu a celeuma sobre a frequente ausência de nomes femininos nas indicações, constatada ao longo de toda a história do certame. Para se ter uma ideia, desde 1929, apenas cinco mulheres entraram no páreo para concorrer a uma estatueta dourada nesse quesito.

É justamente na contramão desse contexto que a mostra “Imagem dos Povos – Mulheres” está inserida: a nova edição foi concebida para dar mais visibilidade ao protagonismo feminino na sétima arte. Com início neste domingo, a iniciativa vai exibir até o próximo dia 19, no MIS Santa Tereza, 48 filmes, produzidos por diretores de dez países.

Um dos destaques é “Três Verões”, o quarto longa-metragem da brasileira Sandra Kogut, que terá pré-estreia neste domingo, marcando a abertura do evento. A produção tem Regina Casé no elenco: sua atuação acabou lhe rendendo o prêmio de melhor atriz no 56º Antalya Golden Orange Film Festival, realizado na Turquia, ano passado. “Nós focamos em alguns dos lançamentos mais esperados do ano. Fizemos uma pesquisa e ‘Três Verões’ sem dúvida é um deles. Além disso, o filme tem muita a ver com a proposta da mostra”, frisa Maíz d’Assumpção, que assina a curadoria junto a Tâmara Braga Ribeiro e a Adyr Assumpção.

Outro filme que terá sua pré-estreia na “Imagem dos Povos” será “Aos Olhos de Ernesto”, de Ana Luiza Azevedo. A projeção está prevista para o dia 14 e vai contar com a presença da diretora. Dentre os títulos da programação internacional, Maíz chama atenção para aqueles produzidos pela pioneira Alice Guy-Blaché (1873-1968), que, em 2018, teve uma primeira reunião de sua obra na “Imagem dos Povos”. “Nós tivemos uma resposta tão boa que resolvemos trazer novamente os filmes dela”, completa Maíz.

Crítica
"Três Verões": a vida como ela é

Uma certa expectativa é, claro, inevitável. Mesmo porque não há como a descrição da Madá de “Três Verões”, filme de Sandra Kogut que está na mostra, não remeter o espectador à Val do magistral “Que Horas Ela Volta?” (2015), de Anna Muylaert. Afinal, ambas são empregadas, trabalham em mansões de famílias abastadas... e são interpretadas por Regina Casé. Mas sim, em poucos minutos, as comparações vão se esmaecendo em prol da trama central, que, como o título indica, tem sua narrativa desdobrada em verões. 
No início, há uma família em festa em Angra. Um “não sei o quê” de ridículo permeia a diversão dos ricos – seja na piscina, soltando a voz no karaokê ou obrigando os convivas a assistir a um mix de fotos e vídeos da família, editados ao som de “Unchained Melody”. Ao mesmo tempo, há tensão. Edgar (Otávio Muller), chefe da família, está angustiado. Não é preciso esforço para intuir que algo não vai bem na saúde financeira do clã. Assim, quando dados pessoais de Madá são pedidos, o público já começa a suar frio. 

E o que vem são acontecimentos que, no Brasil, já viraram um clássico: o bon vivant que fez fortuna às custas de muita falcatrua. Ele é preso, os computadores, apreendidos. Mas mulher e filho vão tocar a vida lá fora. Sói acontecer. Madá e demais empregados ficam ao léu, sem salário. Ela tem seu pequeno negócio lacrado (sim, serviu de laranja), mas não poupa esforços para cuidar de Lira, pai do ex-patrão (Rogério Fróes, magistral). A decepção com o rebento faz lembrar um certo pai e seu filho político da vida real. É mais um filme a atestar que a união faz a força – o que, convenhamos, é ótimo. E com direito a ótimas sacadas, como o pato amarelo da piscina que aos poucos vai murchando. (Patrícia Cassese)

Mostra “Imagem dos Povos – Mulheres”. De 8 a 19, no MIS Santa Tereza (rua Estrela do Sul, 89, Santa Tereza). Gratuito. Programação completa em: www.imagemdospovos.com.