Um processo em tramitação na Justiça de Minas Gerais tem chamado a atenção do mercado. De um lado a Usiminas, do outro, a CSN. Em discussão, “a relutância da CSN em cumprir a decisão do Tribunal Regional Federal da 6ª Região que determinou a venda das ações que a empresa mantém na Usiminas”, informou a siderúrgica mineira. A saída da CSN do quadro de acionistas da Usiminas, determinada pelo Cade, se arrasta há mais de dez anos.
O processo em tramitação no TRF-6 diz respeito às ações da Usiminas compradas pela CSN em 2011 e 2012, quando a empresa chegou a ter 16,42% dos papéis da companhia. Em 2014, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) decidiu que a aquisição de ações por parte da CSN configurava uma conduta anticoncorrencial e firmou um Termo de Compromisso de Desempenho (TCD) com a CSN, no qual ela se comprometia a se desfazer de suas ações até deter menos de 5%, no prazo máximo de cinco anos.
“A CSN não cumpriu a decisão. Em 2022, o Cade alterou o seu entendimento, e o prazo para a alienação passou a ser indeterminado. A Usiminas entrou na Justiça pedindo a venda imediata dos papéis e o cumprimento do acordo assinado pela CSN”, informou a siderúrgica. A Justiça Federal de Belo Horizonte obrigou a venda das ações, conforme decidido pelo Cade, até 10 de julho de 2024. Novamente, a CSN não cumpriu a decisão. Em entrevista a, o diretor jurídico da Usiminas, Guilherme Poggiali, fala sobre o impacto do imbróglio na Usiminas. A reportagem entrou insistentemente em contado com a CSN para contar sua versão, mas a empresa não disponibilizou uma fonte para falar. O espaço para a resposta da siderúrgica segue aberto.
Confira a entrevista abaixo
Em 29 de julho do ano passado, veículos de imprensa trouxeram a informação de que a CSN tinha que vender de imediato as ações da Usiminas após a decisão do TRF-6. O que aconteceu após essa decisão?
A decisão do TRF-6 continua sendo descumprida pela CSN, que permanece com as ações. Para entender melhor o caso, precisamos dar alguns passos atrás. O Cade, autoridade máxima do Poder Executivo responsável por zelar pela livre concorrência no mercado, entendeu que a compra de ações da Usiminas pela CSN configurava uma conduta anticoncorrencial.
A CSN assinou em 2014 um Termo de Compromisso de Desempenho (TCD), no qual assumiu a obrigação de vender a participação até ficar com menos de 5% do capital social. É importante destacar que a própria CSN concordou que as ações que excediam o limite previsto na norma eram irregulares e se comprometeu, por livre e espontânea vontade, a reduzir a sua participação até 2019, sob pena de severas multas e até a nomeação de um interventor na CSN. O prazo se esgotou, e a CSN não cumpriu o seu compromisso. O Cade prorrogou o prazo e, em 2022, tornou-o indeterminado. A obrigação de venda sem uma data-limite não tem qualquer efeito e causa danos para a Usiminas ao manter um concorrente dentro da empresa. Você pode imaginar o Atlético como sócio da SAF do Cruzeiro? Um absurdo, mas isso acontece no setor do aço pela postura da CSN.
Foi nesse contexto que a Justiça foi acionada?
Exato. A Usiminas acionou o Poder Judiciário para corrigir uma situação que prejudica não apenas a empresa, mas o mercado e a livre concorrência. Na Justiça, a obrigação de a CSN vender as ações foi confirmada na primeira instância e no TRF-6. Pelas decisões judiciais, a CSN deveria ter comercializado os papéis até julho de 2024. No entanto, a empresa vem descumprindo essa determinação. Essa situação é ruim para a Usiminas e para o mercado.
Quais os próximos passos?
A CSN usa todo tipo de artifício para protelar o efeito da decisão contrária ao seu interesse, e essa situação se arrasta há mais de dez anos. Isso nos obriga a atuar junto ao Judiciário para garantir o cumprimento da lei e remover a participação ilegal de nosso principal concorrente no quadro acionário da Usiminas.
Como a presença da CSN como acionista relevante da Usiminas prejudica a empresa?
Não há como negar que ter um concorrente dentro da empresa é prejudicial para o desenvolvimento da Usiminas. Há casos, inclusive, em que esse concorrente se posicionou contra iniciativas estratégicas para a Usiminas, como o aumento de capital de 2016 realizado pela Ternium e Nippon Steel. Até hoje, a CSN utiliza de sua posição como acionista e vem lutando na Justiça para derrubar esse aporte financeiro, que foi crucial para tirar a Usiminas de uma grave crise, que ameaçava sua sobrevivência. Além disso, grande parte das ações ordinárias da Usiminas disponibilizadas para circulação em Bolsa está nas mãos da CSN, reduzindo bastante a liquidez de nossas ações. Em seus comunicados na imprensa, a CSN pede respeito à Usiminas, na qualidade de acionista. É curioso, pois a posição acionária da CSN contraria a lei e causa transtornos à Usiminas.
Enquanto os processos tramitam na Justiça, como ficam os investimentos na Usiminas?
Todos os investimentos necessários para cumprir as nossas obrigações estão sendo realizados. A segurança jurídica é um importante aspecto do ambiente de negócios. A falta dela pode afetar inúmeras empresas no Brasil em situação societária semelhante e afugentar investidores.