O mercado de drones em Minas Gerais anda nas alturas e o bom cenário não é por acaso. Além de realizar operações no campo, com mais agilidade e economia de recursos financeiros e ambientais, essa tecnologia também fomenta negócios em diversas empresas - que inclui a venda de equipamentos e de cursos. Porém, quem está inserido neste segmento aponta que ainda há desafios a serem enfrentados. Clandestinidade e falta de fiscalização, prospecção de clientes e acesso a crédito são algumas das dificuldades citadas.
Jamerson Cunha, sócio da Facilit'Air, empresa de BH voltada para prestação de serviços e formação de pilotos, aponta desafios relacionados ao alto custo dos equipamentos e à rápida defasagem e depreciação dos drones. Segundo ele, um drone que custa R$ 200 mil hoje, perde até 60% do seu valor de mercado em dois anos, em média, por conta da alta rotatividade de lançamentos.
“Peças e baterias para esse drone também já ficam difíceis de serem encontradas, o que acaba dificultando a venda desse drone posteriormente. É bom que a tecnologia avance, mas a vida do empreendedor fica mais desafiadora. Acredito que o monopólio da fabricação, que está basicamente nas mãos dos chineses, também contribui para esse cenário. Ficamos totalmente à mercê deles”, avalia.
Levantamento do Sindicato Nacional das Empresas de Aviação Agrícola (Sindag), de 2024, aponta que as duas marcas mais consumidas no país são da China: DJI (83,31%) e XAG (5,54%). Já a brasileira X-FLY (3,53%) aparece apenas no terceiro lugar do ranking e abocanhando uma modesta fatia do mercado.
Ele também aponta que, ao contrário dos drones, a evolução das baterias não tem seguido o mesmo ritmo. Com custo entre R$ 10 mil e R$ 19 mil, elas duram de 10 a 12 minutos de voo. “Isso nos obriga a ter várias baterias para usá-las ao longo do dia. Outra opção é levar um gerador portátil para carregá-las e fazer um rodízio. Aumentar a durabilidade é um dos desafios da indústria hoje”, aponta.
Alexandre Martins, analista de formação profissional do Sistema Faemg Senar, concorda que ter equipamentos com tempo de bateria maior é uma demanda entre os produtores e ajudaria a diminuir os custos do serviço. “Também é uma necessidade termos drones com maior potencial de carga. Começamos com 10 kg, hoje há drones que carregam 50 kg. Mas, sinto que ainda precisamos avançar mais para potencializar os serviços”, aponta.
Ele também aponta a carência por mão de obra especializada no setor. A demanda crescente por serviços tem sido maior do que a formação de pilotos de drone, que precisam ter cursos específicos para atuar na área e são cada vez mais requisitados no campo.
“Além de pilotar o drone, também precisamos de profissionais que saibam como fazer a calda (mistura de água com o produto químico), que tenham informações sobre o período adequado de aplicação e tenham noção da quantidade certa de produto que deve ser aplicado nas lavouras. É importante ressaltar ainda que trabalhos realizados por operadores sem treinamento podem ser mais onerosos, além de trazer um potencial causador de danos às lavouras e aos realizadores do serviço”, diz.
Clandestinidade e fiscalização
Por estar tão em alta, o mercado de drones naturalmente atrai a atenção de diversas pessoas que desejam ganhar dinheiro com a tecnologia - o que nem sempre acontece em conformidade com a lei, apontam especialistas. Guilherme Della Croce, diretor do setor de pulverização da Atlantic Drones, afirma que a clandestinidade é um dos principais desafios deste mercado.
“Isso porque, com o aumento da popularidade dos drones, tornou-se fértil o terreno para o surgimento de empresas que não são devidamente registradas - o que acaba nivelando o mercado por baixo”, reclama.
Segundo ele, tratam-se de empresas que, geralmente, não emitem nota, cobram mais barato dos clientes e não entregam um serviço de qualidade. “A concorrência se torna desleal. Nós, que trabalhamos corretamente, precisamos contratar um engenheiro agrônomo e temos na empresa um técnico de segurança do trabalho, mesmo que essa segunda função não seja obrigatória. Tudo isso aumenta os nossos custos. Acredito que deveria haver maior fiscalização”, diz.
No Brasil, o mercado de drones agrícolas é regulamentado pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) por meio da Portaria nº 298, publicada em 2021. O documento estabelece regras para a operação de aeronaves remotamente pilotadas destinadas à aplicação de agrotóxicos e afins, adjuvantes, fertilizantes, inoculantes, corretivos e sementes. A fiscalização da aviação agrícola é realizada por auditores fiscais federais agropecuários e auxiliares técnicos do Mapa.
Caso as normas da aviação agrícola não sejam cumpridas, os operadores estarão sujeitos a penalidades administrativas que incluem advertência, multa, suspensão ou cancelamento do registro da empresa, além de penas cível e criminal, em caso de crime ambiental.
Todos os operadores de drones que aplicam insumos devem registrar a atividade no ministério. É obrigatório que o operador faça o curso para aplicação aeroagrícola remota, o chamado CAAR, e que esteja presente no campo durante as operações para monitorar as condições e registrar a ação. O Brasil é um dos poucos países do mundo que têm uma normatização própria para drones de pulverização.
Diretor executivo do Sindag, Gabriel Colle explica que a entidade não tem poder de fiscalização, mas tem “subido o tom” contra os equipamentos ilegais. “Temos enviado ofícios a todos os órgãos de vigilância agrícola e ambiental dos Estados, solicitando apoio no combate aos drones ilegais operando no trato de lavouras”, afirma.
Ele aponta que a entidade também faz um trabalho de esclarecimento em universidades, eventos do agro e entidades agrícolas sobre a legislação que incide sobre a ferramenta. “Estamos trabalhando ainda para que se mude a regulamentação dos drones no sentido de exigir que os aparelhos saiam das revendas já com registro junto ao Mapa e à Anac”, diz.
Machismo em campo
A empresária Mariana Barbosa, fundadora da Terra Verde Drones, de Paraopeba, na região Central de Minas, conta que precisou enfrentar não apenas os desafios intrínsecos ao ato de abrir o próprio negócio, como também o machismo no início de sua jornada empreendedora no campo, em 2023. “Escutei de muitos produtores que aquilo não era trabalho de mulher. Duvidavam da minha capacidade de saber gerir o equipamento e se eu teria resistência para trabalhar horas no sol ou de madrugada”, relembra.
Apesar da resistência inicial, Mariana resolveu persistir e afirma que hoje conseguiu fidelizar vários clientes que desacreditaram seu trabalho. “Eles foram percebendo os diferenciais. Muitos elogiam o fato de eu não deixar lixo na lavoura, ser detalhista e cuidar bem do material. Estamos avançando. Hoje, tenho duas pilotos de drones mulheres na equipe. Os ajudantes são homens, mas quem lidera é a mulher”, comemora.
Acesso a crédito
Suelen Souza Gonçalves, diretora de operações da Atlantic, ressalta outros aspectos desafiadores do setor. Um deles é a baixa familiaridade de muitos produtores com a tecnologia, apesar da crescente popularidade dos drones. Como ainda não conhecem os benefícios reais dos drones em comparação aos métodos tradicionais, como o trator pulverizador, muitos agricultores acabam não comprando equipamentos ou contratando os serviços da empresa.
“Também sofremos com a burocracia na importação. Os drones de maior qualidade ainda vêm de fora e o processo de nacionalização de equipamentos e peças pode ser demorado e custoso. Há ainda a questão da falta de incentivo e acesso a crédito, especialmente para pequenos produtores. O custo de entrada ainda é uma barreira”, afirma.
Parceria para divulgação dos serviços
Já David Fragoso, dono da Zagros Drone’s Services, aponta como maior desafio a divulgação do trabalho e a captação de clientes em Bom Despacho, na região Centro-Oeste de Minas. O empreendedor, que não veio de família rural e começou a prestar serviços na área agropecuária há cerca de um ano e meio, relata que é difícil criar conexões no campo - ambiente que demanda um contato mais personalizado e onde a divulgação por meios digitais nem sempre é eficiente.
“Sinto que os produtores ainda gostam de conhecer os prestadores de serviço ‘cara a cara’ e ter uma conversa mais pessoal. Isso acaba dificultando um pouco, pois demanda mais tempo para bater de porta em porta e captar esses potenciais clientes”, aponta.
Para solucionar este problema, o empresário buscou uma parceria com a Cooperativa Agropecuária de Bom Despacho (Cooperbom). Assim, os técnicos responsáveis por fazer as visitas aos produtores acabam divulgando seu trabalho e aumentando a chance de contratação dos serviços de David. Em contrapartida, ele oferece descontos e investe na fidelização dos clientes.
“À medida que vão conhecendo meu trabalho, também consigo aumentar o ticket médio dos serviços. Na última safra, tive menos clientes, mas que contrataram serviços maiores. Um deles contratou um serviço para 107 hectares da primeira vez e, no ano seguinte, retornou e expandiu para 321 hectares. No final, acabo trabalhando e faturando mais”, comemora.