Com uma porta que vai se estreitando para a entrada de produtos brasileiros como o café e a carne bovina nos Estados Unidos, em função do tarifaço de Donald Trump, um outro mercado se coloca como alternativa para receber as exportações brasileiras. A China, principal parceiro comercial do Brasil desde 2009, pode se tornar, a médio prazo, destino de parte da mercadoria que não for enviada ao mercado norte-americano. 

Pelo menos é o que acredita a diretora executiva da Câmara Chinesa de Comércio do Brasil, Mariana Bahia. “A China já é a principal parceira econômica do Brasil e as relações têm sido cada vez mais multissetoriais, independentemente da relação do Brasil com os EUA”, frisa ela.

Em 2024, as exportações brasileiras em direção ao país asiático somaram quase US$ 95 bilhões, de acordo com a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil). Os principais produtos negociados com os chineses foram produtos como soja, petróleo bruto e minério de ferro, que representam mais de 75% do total.

Mas outros produtos também chamam a atenção na balança comercial entre os produtos. Na compra de carne bovina, os asiáticos foram, em 2024, o principal comprador do produto brasileiro. Foram 1,33 milhão de toneladas, responsáveis por uma receita de US$ 6 bilhões. Os chineses também ampliaram a compra de café brasileiro nos últimos anos, rompendo quase 1 milhão de sacas consumidas no ano passado.

Já os EUA, só em 2024, compraram 8 milhões de sacas de café do Brasil, segundo balanço do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé). Mariana Bahia ressalta a dificuldade do mercado chinês absorver a demanda norte-americana a curto prazo. 

“Mas a médio prazo, pode ser uma oportunidade para produtos em ascensão no mercado asiático. Um exemplo é o café especial brasileiro, que hoje possui uma grande entrada no mercado norte-americano e tem sido cada vez mais consumido na China. Em um futuro próximo, o mercado chinês pode ser um grande comprador deste produto em contraponto ao mercado americano”, garante a diretora. 

Nessa quarta-feira, logo após Donald Trump confirmar que o café seria tarifado, a Embaixada da China no Brasil citou o aumento do consumo de café no país. O consumo per capita ainda é de apenas 16 xícaras por ano, frente à média global de 240. O café vem conquistando espaço no dia a dia dos chineses”, disse o escritório diplomático chinês no Brasil. 

Setor vê dificuldades 

O presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Minas Gerais (Faemg), Antônio Pitangui de Salvo, avalia que embora a China tenha ampliado o consumo de café nas últimas décadas, não há demanda o bastante para absorver a exportação brasileira no patamar dos EUA. “Seria preciso uma mudança de hábito”, pontua. 

O superintendente comercial da Cooperativa Regional de Cafeicultores de Guaxupé (Cooxupé), Luiz Fernando dos Reis, frisa que no país asiático o número de cafeterias tem aumentado, com uma proposta distinta para consumo da bebida.

“Eles comercializam bebidas à base de café, não apenas o café. Isso tem atraído um público jovem e isso é excelente para o futuro. Porém, não são blocos consolidados e não é tão fácil assim você virar uma produção que iria para um destino em um percentual tão alto e mandar para o outro”, lembra o superintendente da Cooxupé.

Carne tem cenário favorável 

Antônio de Salvo, da Faemg, por outro lado, vê margem mais alta para aumentar a entrada de carne brasileira na China. “Na medida em que o mundo asiático passa a ter mais poder aquisitivo, começa a consumir mais carne vermelha, principalmente do Brasil. Não nos faltará mercado, mas definitivamente não queremos abalar um grande comprador como os EUA”, salienta. 

Mariana Bahia, da Câmara Internacional de Negócios e Câmara Chinesa de Comércio do Brasil, não vê tanta margem para que os cortes enviados aos EUA sejam absorvidos pela China, em função de certificações diferentes, dentre outros pontos. No entanto, na agropecuária, ela acredita que há espaço para mais trocas entre Brasil e China.

Em maio, durante viagem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a Pequim, o Brasil anunciou a abertura de novos mercados para exportação de carne de pato, peru, miúdos de frango (coração, fígado e moela), grãos derivados da indústria do etanol de milho (DDG e DDGs) e farelo de amendoim.

“Observamos esse movimento na última guerra comercial, onde passamos a ser o grande exportador de soja para a China é uma alternativa para reduzir a dependência dos grãos americanos”, complementa Mariana Bahia.