Linha de crochê, agulha, fita, tesoura, tinta de tecido. Dentro dos armarinhos existem 1001 possibilidades de produtos para atender aos mais variados tipos de consumidor. Modelo de estabelecimento antigo, datado de décadas atrás, as lojas de aviamentos sobrevivem ao tempo e à modernidade sustentadas pelos artesãos, costureiras, confeccionistas e diversos consumidores que aproveitam as modas sazonais.
Segundo o vice-presidente de Relações Públicas e Sociais da Câmara de Dirigentes Logistas (CDL-BH), Fausto Izac, os armarinhos ou casas de aviamentos estão sempre se reinventando, por isso resistem. Ele estima que existam, em Belo Horizonte, pelo menos 200 estabelecimentos especializados em aviamentos. Para ele, que é proprietário da Mundo do Armarinhos, há 35 anos no mercado, o perfil de consumidor que frequenta esses lugares mudou ao longo dos anos e o setor acompanhou.
“Antigamente tinha aquela coisa da mulher fazer enxoval, ela gastava semanas naquilo, comprava materiais para bordados, gastava um valor que hoje não faz sentido”, lembra. Esse tipo de consumidor não é mais comum nos armarinhos e foi substituído, por exemplo, pelos artesãos.
Artesanato
Hoje em dia, boa parte dos consumidores fixos dos estabelecimentos de aviamentos vem do artesanato. Segundo dados do IBGE, o artesanato movimenta cerca de R$ 50 bilhões por ano no país e é fonte de renda para cerca de 10 milhões de pessoas. Fausto pontua que o artesanato é um dos setores que mantém os armarinhos de pé. “Hoje vemos feiras de artesanato movimentadíssimas, é algo que mudou muito, mas mudou para melhor. Muita gente ainda prefere o produto exclusivo, customizado.”
Na Loja Bibelô, fundada em BH em 1988, artesãos são a base sólida das vendas e buscam os produtos consolidados, como fitas, pincéis, tintas, tecidos e itens de costura. “Precisamos deles (os produtos consolidados) para sempre ter cliente, as compras sazonais são importantes, mas o consolidado é o que mantém”, comenta Roberto Prado, gerente de compras da Loja Bibelô.
Vendas Sazonais
As compras sazonais, citadas por Roberto, são outro ponto de vendas importante que auxiliam no lucro dos armarinhos. Roberto lembra, por exemplo, de alguns itens que viraram “febre” por alguns meses, e a loja “surfou” na onda para aproveitar a demanda do mercado. “Teve uma época que tinha gominhas para pulseira, aquilo foi uma febre, durou uns seis meses, em 2018. Vendeu muito!”, comenta.
Outras modas também provocaram corrida aos armarinhos, como o tie dye (tintura em tecidos), panos de prato decorados e até mesmo a roupa da moda utilizada por alguma atriz (o biquíni de crochê usado por Jade Picon no BBB 22, por exemplo, entrou na lista de desejos de muitos fãs). Hoje, na Loja Bibelô, um dos produtos com boa procura tem sido o “pompom” - bolinhas de lã em diversos tamanhos, utilizadas em roupas, brincos, chaveiros e bolsas. “Investimos nisso, é um produto que vende bem e conseguimos bons fornecedores”, afirma Roberto.
Roberto lembra que, há cerca de 15 anos, boa parte da clientela buscava insumos para produzir bijouterias - hoje, em grande parte, vindas da China, já prontas e em baixo custo. “Hoje você não vê artesão fazendo. A área de bijouteria mudou, as ferragens para bijouterias mudaram, é raro você encontrar e quando encontra é de qualidade inferior, muitas fábricas fecharam”, comenta.
Outra procura que diminuiu, no ponto de vista do gerente comercial da Ponto do Artesão, Wesley Gilbert, foi a de insumos para fabricação de bonecas de pano. “Era muito comum cerca de dez anos atrás. Material para boneca vendia muito, como lã, tecido, enchimento, hoje a procura diminuiu bastante”, diz. Por outro lado, as linhas de crochê nunca pararam de ser vendidas na loja, segundo Wesley. Fundada em 1969, a Ponto do Artesão é um dos armarinhos que atravessou gerações.
Pandemia
A pandemia foi outro “boom” de vendas de produtos específicos. Fausto Izac lembra que muitas pessoas buscaram um passatempo e o encontraram nos trabalhos manuais, como o crochê. “O crochê é uma terapia excepcional que foi muito eficiente na pandemia. A gente teve um boom naquela época de alguns produtos de crochê e tricô que surpreendeu a todos e não houve, inclusive, resposta adequada para a demanda”, comenta.
Roberto Prado também observou um movimento mais forte em busca de itens específicos na pandemia. “O movimento na pandemia foi muito específico, com a busca de produtos para fazer máscaras e barbante para artesanatos, muito procurados por senhoras idosas, por exemplo”, comenta. Prado também recorda da dificuldade de atender ao volume da demanda. “Os produtos acabavam muito rápido. A busca por TNT e barbante cresceu muito, o problema era ter mercadoria, as fábricas não tinham matéria prima, boa parte foi exportada, o mercado começou a exportar e faltou para nós”, lembra.
Amigurumi
Uma das tendências que aqueceram o mercado de armarinhos e aviamentos recentemente foi o Amigurumi: técnica japonesa de confeccionar bonecos, tipo pelúcia, com crochê. O formato se popularizou no Brasil há cerca de cinco anos.
Na Loja Bibelô, Roberto observa boa procura por esses itens nos últimos anos. “Era um produto que não existia e o mercado se adequou”, diz. Ele lembra que a busca por linhas para amigurumi são bem específicas. “Dá para fazer pode ser com qualquer linha, mas a clientela prefere trabalhar com linhas mais específicas, como as antialérgicas, porque pode ser para um bebê, e produtos com qualidade”, exemplifica.
Para Fausto, a arte do amigurimi é uma das ramificações do mundo do crochê, que sempre buscará uma forma de se adaptar ao mercado e sempre irá demandar para o mercado de aviamentos. “O crochê é uma arte que traz tranquilidade, traz inspiração para as pessoas, muito mais do que uma fonte de renda, nesse mundo tão eletrizado, tão informatizado, é algo que vai na contramão. Por isso que eu acho que nunca vai acabar”, diz.