O apelo emocional do Natal tem efeito tão forte que pode levar endividados até a deixarem de pagar o básico. Vinte por cento dos brasileiros admitem comprar mais na data do que conseguem pagar. Mas, para 5% dos consumidores, afundar em dívidas não é suficiente. Eles estão dispostos a não quitar contas correntes como TV a cabo, luz, água e telefone para presentear os entes queridos e festejar, segundo pesquisa da Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL) e do Sistema de Proteção ao Crédito (SPC Brasil).
O levantamento mapeou o comportamento de consumidores das 27 capitais brasileiras com recortes por classe social, idade, sexo e classe econômica. E uma das conclusões é que as mulheres são as mais empolgadas quando o assunto são as compras natalinas. Tanto que 23,4% delas disseram comprar mais do que cabe no bolso, enquanto isso ocorre entre 14,7% dos homens ouvidos. Entre os integrantes das classes C, D e E, isso é comum para 22,1% dos entrevistados. Nas classes A e B, ocorre apenas entre 9,9%.
O efeito de uma compra fora do orçamento pode ser sentido por vários meses. O mesmo levantamento mostrou que 22,9% dos consumidores ficaram com o nome sujo por causa das festas do fim do ano passado. Para 15,1%, a situação foi tão tensa que ainda estão negativadas. O percentual de endividados nessa condição foi maior em 2017 do que no ano anterior, quando 17,8% ficaram com restrição no CPF e 11,4% permaneceram assim, pelo menos, até o Natal de 2017.
Até o valor médio da dívida adquirida subiu entre os que sujaram o nome em 2017 frente a 2016. A alta foi de 11,43%, passando de R$ 960,71 para R$ 1.070,53.
Para o consultor financeiro e professor de economia do Ibmec, Felipe Leroy, essa opção dos consumidores reflete a força emocional da data. Mas também mostra que, depois de tantos anos de crise e desemprego, as pessoas estão tomando atitudes mais extremadas. “As pessoas começam a pensar que não vale mais a pena se privar das coisas porque não enxergam chances de conseguir presentear alguém se não for estourando o orçamento”, afirma.
É mais ou menos o pensamento da belo-horizontina Michelly Sales, 30. Desempregada há mais de um ano, nesta segunda-feira (17) ela foi comprar os presentes das filhas Clara Cristina e Sara Vitória, de 7 e 13 anos, respectivamente. Elas voltaram para casa felizes com as sandálias escolhidas pelas próprias crianças. “Eu tento ser controlada nas minhas compras, mas Natal é Natal! Não dá para não comprar nada”, afirma.
Também desempregado, o mecânico Walisson Oliveira, 25, comprou nesta segunda-feira o presente da namorada no primeiro Natal que passam juntos. “Eu sei que ela vai me dar um presente. Então, não deixaria de comprar alguma coisa para ela”, conta.
Com as mãos cheias de sacolas, a professora Paloma Damasceno, 38, conta que, mesmo com o nome negativado, já está preparando uma ceia melhor do que a do ano passado. Neste ano, quem comemorar a data na casa dela vai sair com uma lembrancinha de festa feita por ela. “Fiquei desempregada por dois anos. Comecei a mexer com decoração de festas e as coisas estão indo bem. É momento de comemorar”, afirma.
Inadimplência segue em níveis altos
A inadimplência entre os belo-horizontinos ficou em 32,2%, em novembro. O percentual de pessoas com contas em atraso é o segundo maior para o mesmo mês desde o início da série histórica, em 2012. Ficou menor apenas do que o apurado em 2015 (33,6%), segundo pesquisa da Federação do Comércio de Minas Gerais (Fecomércio MG).
“Estamos saindo de uma crise econômica e ainda temos muitos desempregados. É normal que tenhamos muitos endividados”, avalia o economista da Fecomércio, Guilherme Almeida. Para ele, o alto endividamento pode afetar um pouco as vendas de Natal.
Negativados
Sem crédito. Entre os consumidores que pretendem fazer compras no Natal, mas estão endividados, 69% estão com o nome sujo, 25,4% não estão e 4,7% não souberam responder.
Dívidas
Vilão das contas. O maior vilão entre os belo-horizontinos endividados é o cartão de crédito. Pelo menos é o responsável pela dívida de 75,6% das pessoas entrevistadas.