Johnny Hooker decide falar a verdade. “Queria muito ter o meu ‘Na Cama com Madonna’”, admite, referindo-se à vontade de registrar e lançar em filme a turnê comemorativa de seus 20 anos de carreira, com a qual ele aporta neste sábado (9) em Belo Horizonte. A alusão conversa de maneira profunda com a trajetória de Hooker.
O cantor ainda carrega “nitidamente na memória” o instante que a música o pegou pelo laço. Por um “acaso do destino”, ele se deparou, no meio de uma coleção, com o VHS que focava os bastidores e a intimidade da Rainha do Pop, num acontecimento marcante para a década de 1990. “Coloquei para assistir e meu queixo foi ao chão. Nunca tinha visto aquela mistura de música, cinema, teatro, era impressionante”, conta.
A inspiração rege a atual empreitada. “Finalmente estou realizando o meu ‘sonho dourado’ de misturar as linguagens que mais amo, com música, cinema, dança, e isso vem da minha admiração pela Madonna, que, lá atrás, criou esse formato que era, ao mesmo tempo, Broadway e cinematográfico”, reforça.
Outro aspecto indispensável aos espetáculos do artista é “a provocação”. “A arte está aí para tocar em assuntos sensíveis e chacoalhar a gente”, defende Hooker. Com projeções que resgatam suas duas décadas de atividade, ele selecionou um repertório calcado em hits e músicas “artisticamente importantes”, que perpassa os álbuns “Coração” (2017), “Orgia” (2022) e o inaugural “Eu Vou Fazer Uma Macumba Pra Te Amarrar, Maldito!”, do ano de 2015.
“Qualquer trabalho meu vai ter várias facetas diferentes, com samba, rock, brega, axé, todos esses ritmos que são a explosão de referências de uma pessoa que cresceu no Nordeste”, salienta o pernambucano. Essa diversidade também sobe ao palco através de balé, coreografias e intervenções típicas da sétima arte.
“É o show mais emocionante que já fiz na minha vida. Olhar para esses 20 anos e ver os momentos de glória, dificuldade, dúvida. Foi uma montanha-russa doida que trouxe muitas alegrias e, no final das contas, dá um orgulho danado de saber que foi só o começo”, aposta Hooker, que enaltece a sua relação “olho no olho” com a plateia. “Minha carreira só continua existindo graças a esse abraço do público. Sou um artista independente!”, diz.
Estrada
Na adolescência de Hooker, um jeito de “encontrar a própria tribo” era montar uma banda de rock, e com ele não foi diferente. O artista já compunha quando, aos 16 anos, descoloriu o cabelo, pegou uma roupa emprestada da amiga e estreou num concurso ao som de Sex Pistols, Nirvana e algumas canções autorais.
“Ficamos em segundo lugar”, recorda. Vindo do interior de Pernambuco, ele ressalta que teve que “correr como um maluco atrás das oportunidades”, o que justifica a distância temporal entre o seu primeiro EP, de 2004, e o reconhecimento nacional uma década mais tarde. “Toquei em todos os lugares que você possa imaginar, do cabaré à garagem”, sustenta.
Ao vencer o reality show “Geleia do Rock”, comandado por Beto Lee no canal Multishow, em 2010, ele viu algumas portas serem abertas, logo escancaradas com o convite para cantar a música tema do filme “Tatuagem”, que abordava a temática LGBTQIAPN+, em 2013. Na sequência, Hooker atuou na novela “Geração Brasil”, da Globo.
“Minha relação com o cinema me leva para a TV, que, junto com o disco de 2015, nacionaliza a minha carreira”, observa o intérprete, que reflete sobre o suor que escorreu de seu corpo nesses primeiros “dez anos de muita luta”. “O Brasil é como se fosse um continente mesmo, porque a pessoa que nasce em São Paulo ou no Rio está vários passos à frente de ter oportunidades na arte em relação a quem vem de Recife”.
Ele tampouco deixa de notar as diferenças nos modos de consumir e produzir que atingiram sua profissão nesse percurso. “O mercado da música é uma loucura, porque as mudanças são a jato, ele se transforma a cada segundo!”, constata Hooker, que enumera uma série de plataformas digitais que se tornaram obsoletas até a consolidação do streaming.
“Acho que ninguém do mercado independente tem uma relação boa com as plataformas, porque mudaram-se os nomes, mas a concentração de espaço e poder continua a mesma. Nesses 20 anos, nunca houve um momento tranquilo, de ‘vacas gordas’. É saber ir se adaptando e estar antenado ao que acontece e, ao mesmo tempo, não ficar refém dessa lógica, afinal a arte não é fast-food”, pontua.
Futuro
Em setembro, Hooker colocou na praça o single “Entre o Bem e o Mal”, que integra “Mania de Você”, ampliando para doze o número de participações do cantor em trilhas de novelas da Globo, numa lista que congrega hits como “Amor Marginal”, “Alma Sebosa” e sua versão para “Beija-Flor”, dentre outras.
O que toca em sua playlist diária atualmente são influências da juventude que ele tem redescoberto, como as bandas inglesas Sade e The Cure, que acaba de lançar um novo álbum, além de Johnny Cash. Para o ano que vem, ele promete “uma surpresa para os fãs” em virtude da comemoração dos dez anos de “Eu Vou Fazer Uma Macumba Pra Te Amarrar, Maldito!”, que o revelou ao país com baladas como “Volta”, gravada por Fafá de Belém.
Hooker aproveita o ensejo para exaltar o que ele chama de uma “renascença artística e cultural em Belo Horizonte”, que teria começado em 2016, quando ele participou de uma Virada Cultural na capital, mas que, agora, “está mais pronunciada, com a força do funk, do rap, Djonga, Marina Sena, e o cinema mineiro”, enumera.
“A juventude da cidade tomou as rédeas da própria narrativa”, constata ele, que declara o seu amor por BH. “O público é muito carinhoso, elegante, e se entrega às sensações. “O (diretor de cinema Francis Ford) Coppola disse que não existe filme sem plateia e eu faço o mesmo paralelo com a música. Se o público não se emocionar, o show fica frio, ele não existe, a gente precisa do calor da plateia e dessa sintonia fina”, arremata o compositor.
Serviço
O quê. Turnê de 20 anos de carreira de Johnny Hooker
Quando. Neste sábado (9), às 21h
Onde. Sesc Palladium (rua Rio de Janeiro, 1.046)
Quanto. De R$40 (meia) a R$120 (inteira) na bilheteria do teatro ou no site www.sympla.com.br