“Deixe-me ir/ Preciso andar/ Vou por aí a procurar/ Rir pra não chorar”, entoa Cartola nos versos fundamentais do samba “Preciso me Encontrar”, que embala algumas das cenas-chave da peça “Um Jardim para Tchekhov” – espetáculo que estreou nacionalmente no Centro Cultural Banco do Brasil Belo Horizonte (“CCBB BH”), em 23 agosto, e, agora, entra em sua última semana em cartaz na cidade, onde a montagem amadureceu, em uma progressiva sincronia dentro e fora do palco. Uma crescente que se estendeu, inclusive, para além dos limites do teatro, com os artistas se entregando à capital mineira.

Nas publicações mais recentes do ator Erom Cordeiro no Instagram, por exemplo, BH aparece em destaque. Estão lá cartões postais como a Serra do Curral, em frente e verso, as curvas Edifício Niemeyer, os arcos do Viaduto Santa Tereza e a Pampulha, para ficar em alguns exemplos. O artista, diga-se, é um fã declarado da capital mineira, atração que só aumentou nas últimas três semanas em que a peça foi apresentada na cidade – o espetáculo segue em cartaz, na quarta e última semana da temporada, entre sexta-feira (13) e segunda-feira (16).

“BH é um lugar que eu sempre gosto muito de voltar. Gosto das pessoas, da cultura, enfim, gosto da cidade. Então, sempre que venho, quero aproveitar ao máximo e, como já tinha um tempo que eu não vinha para cá… Acho que tinha um desejo represado, sabe?”, elabora o ator, narrando em detalhes as corridas ao ar livre por diversos destinos entre uma apresentação e outra. Em um só dia, levando a sério a composição de Cartola, ele deixou-se ir por nada menos que 10,5 km.

O gosto pela cidade, aliás, fica mais evidente – agora do ponto de vista profissional – com a escolha de BH para abrigar as primeiras exibições de “Um Jardim para Tchekhov”. Decisão comemorada por Erom. “A gente teve a alegria de estrear em Belo Horizonte, que tem uma plateia muito, muito acolhedora, que fez muito bem ao espetáculo, que estava saindo do forno depois de três meses de ensaios, que fizemos no Rio”, entusiasma o ator, feliz por encontrar sessões sempre cheias e uma plateia muito interessada. 

“Desbravei alguns lugares do Centro, o bairro Santa Tereza”, cita, já em tom saudoso, destacando que aproveitou essa passagem para fazer passeios menos convencionais também. “Tinha lugares que eu queria conhecer, tipo a própria Serra do Curral, que finalmente consegui ir”, menciona, elogiando a vista panorâmica que se tem de lá, atualmente embaçada pelos rios de fumaça originados pelas queimadas que atingem todo o país.

Esse pendor pela exploração da cidade e seu entorno rendeu a Erom uma bem-humorada comparação: “Ele é nossa Dora Aventureira. Sempre foi”, brinca Olívia Torres, companheira de palco do ator. Não que ela própria também não tenha um quê da famosa personagem dos desenhos animados, conhecida por seu ímpeto em desbravar o mundo à sua volta. 

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“Hoje eu tenho não é nem mais um só lugar favorito, mas, sim, lugares favoritos, no plural”, reconhece. “Comi muito bem em BH, que tem essa coisa de ter uma comida excepcional. Estive no Mercado Novo (na região central), fui a um lugar chamado INCC (um café e bar, localizado no bairro Floresta), que gostei muito. No dia, estava rolando uma jam de jazz, uma delícia. E fui dançar em um lugar onde a (artista baiana) Karina Buhr estava discotecando”, enumera, se referindo à tradicional boate A Obra, na Savassi. 

Movida por todas essas histórias, ela encara as últimas sessões com um antecipado sentimento de saudade. “Acho que fiquei bem apaixonadinha por BH nesse último final de semana, (quando) conheci alguns lugares muito legais e pessoas ótimas. Então, acho que vou sentir falta de voltar para a cidade todo fim de semana e, por isso mesmo, quero aproveitar ao máximo essa reta final”, admite. 

A experiência, diga-se, foi tão inspiradora que, talvez, Olívia e Erom façam juntos uma sessão de discotecagem neste fim de semana. Mas, ela avisa, nada está certo ainda. Quer dizer, quase nada. Afinal, pode até faltar data e lugar, mas o desejo, este está muito bem resolvido.

Sereníssima

Curiosamente, entre as tantas emoções vividas por Olívia Torres em BH, uma delas veio de uma travessia transatlântica, diretamente do Festival de Veneza, onde o filme “Ainda Estou Aqui”, de Walter Salles, cumpriu bem-sucedida estreia. A produção, baseada no livro do escritor Marcelo Rubens Paiva, aborda a busca de sua mãe, Eunice, por explicações após o desaparecimento do seu pai, o deputado Marcelo Rubens Paiva, vítima da Ditadura Militar brasileira. A atriz, no caso, interpreta uma das filhas protagonista, vivida por Fernanda Torres e Fernanda Montenegro, em diferentes períodos cronológicos. 

A atriz Olívia Torres
A atriz Olívia Torres em cena do espetáculo "Um Jardim para Tchekhov" | Crédito: Guto Muniz/Divulgação

“Fui muito emocionante. Eu, aliás, ia para Veneza, mas, como coincidiu com esse momento em que a peça estaria na sua segunda semana, optei por ficar. Mas acompanhando tudo”, relata ela, que estava no teatro quando o longa recebia o prêmio de Melhor Roteiro. “Estou muito ansiosa para assistir. Por enquanto, vi apenas uma parte, a primeira, em que minha personagem ainda é uma criança. Então, já consegui ter uma noção da beleza que é esse filme”, detalha.

SERVIÇO:
O quê. Últimas sessões do espetáculo “Um jardim para Tchekhov”
Quando. De sexta-feira (13) a segunda (16), às 19h. Palestra no sábado (14), às 15h
Onde. Teatro I do CCBB Belo Horizonte (praça da Liberdade, 450, Funcionários)
Quanto. As entradas para a peça custam a partir de R$ 15 (meia-entrada), enquanto a palestra é gratuita. Ingressos disponíveis no site ccbb.com.br/bh e na bilheteria do centro cultural.