Do prego ou arame que prende a alça arrebentada do chinelo, e prolonga seu tempo de vida, à antiga 'tecnologia' da palha de aço na ponta da antena da TV, que melhorava o sinal: são muitos os exemplos de aplicação, no cotidiano brasileiro, da gambiarra, arte de, em meio à precariedade, se adaptar, improvisar e encontrar soluções para problemas do dia a dia.
É justamente sobre essa onipresente prática que Sabrina Sedlmayer, professora da Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais (Fale/UFMG), se debruça em seu novo livro, intitulado “Quem não tem cão caça com gato - estudando a gambiarra”.
Na publicação, a autora propõe uma análise da incidência dessa prática também na literatura, na cultura e nas artes visuais.
Segunda brasileira a tomar posse na presidência da Associação Internacional de Lusitanistas, ela também aborda as ambivalências dessas soluções improvisadas tanto em manifestações globais quanto locais.
Mas Sabrina não romantiza a gambiarra, refletindo, na obra, sobre as questões como a falta de recursos, a escassez e a fome, que, geralmente, estão no plano de fundo das gambiarras, motivando-as.
Ao propor essa série de reflexões sobre o assunto, algumas de suas referências são as obras de Carolina Maria de Jesus, Elvira Vigna e Lina Bo Bardi, além de uma série de trabalhos da cena artística contemporânea.
Vale registrar: antes de ser o título do seu livro, “Quem não tem cão caça com gato” foi o nome escolhido pela arquiteta e desinger Lina Bo Bardi para a primeira exposição do MASP sobre artesanato, mas a escolha foi vetada e a mostra acabou sendo chamada de “A mão do povo brasileiro”. “Quis fazer uma reparação, afinal a gambiarra faz parte da identidade do povo brasileiro”, situa Sabrina, que estuda sobre o tema há mais de 15 anos.