Há três décadas atuando na gestão cultural, Eliane Parreiras acumula uma vasta experiência tanto no setor público como no privado. Desde julho de 2022, quando Fuad Noman (1947-2025) assumiu a Prefeitura de Belo Horizonte, Eliane assumiu a Secretaria Municipal de Cultura, cargo que ela segue ocupando, agora sob a gestão do prefeito Álvaro Damião (União Brasil).
À frente da pasta municipal, a gestora tem lidado com importantes desafios para a cultura da capital mineira, como a administração dos repasses dos recursos da Lei Paulo Gustavo na cidade, a regência das demandas dos centros culturais espalhados pelas regionais de BH e os processos envolvendo a reforma do Museu de Arte da Pampulha.
Agora, em entrevista ao programa Café com Política, do canal de O TEMPO no YouTube, Eliane Parreiras fala sobre os projetos que pretende emplacar com a nova gestão municipal, a parceria com outras instâncias do poder público, as ações de fomento para a cultura de Belo Horizonte, entre outros assuntos.
Leia a entrevista na íntegra
Secretária, gostaria que a senhora fizesse um balanço das ações feitas até então. A senhora já vinha de uma gestão do Fuad Noman e o que não deu para poder fazer, o que ficou de pendência até agora? E qual a marca que a senhora quer deixar à frente da Secretaria de Cultura?
Eu acho que Belo Horizonte se caracteriza por algumas questões que são importantes a gente falar primeiro. Acho que temos uma política cultural muito estruturada, é um trabalho que vem de décadas e que teve muito apoio do prefeito Fuad. Ele tinha um olhar muito especial para isso. Então, inclusive devo um agradecimento para ele, porque tudo o que pode ser feito no sentido de institucionalizar, de fortalecer, a gente contava com o apoio dele de forma muito intensa. Ao mesmo tempo, a gente tem também uma diversidade cultural enorme, uma riqueza cultural muito grande em todos os territórios. Em qualquer regional, qualquer região de BH que você chegar, você vai ter essa cultura pulsante. E tem uma outra característica que é muito de BH, e que a gente fica muito orgulhoso, que muitos movimentos culturais são espontâneos. A gente tem grandes iniciativas, grandes ações que surgem a partir dos movimentos culturais espontâneos, dos movimentos da própria sociedade. E aí cabe ao poder público não só fomentar e apoiar essas manifestações, mas inclusive incorporar isso como política pública. Então, muitas das coisas que a gente tem hoje, dos festivais, a estrutura física, os centros culturais nas regionais, por exemplo, elas vêm da sociedade civil. Eu acabei de fazer três anos de prefeitura, nessa experiência municipalista, que é algo que é muito interessante, porque a cultura acontece na cidade, na ponta. E acho que a gente tem já uma consolidação realmente muito grande, de várias áreas, vários processos, o aperfeiçoamento e uma ampliação do acesso ao fomento cultural, que é bem importante. Então, não só do ponto de vista do volume, mas do ponto de vista de mais gente participando, mais oportunidades, mais democratização desse conteúdo, o fortalecimento da infraestrutura cultural da cidade, que eu acho que é outro enfoque muito grande. Mas sobre o que é que não foi feito, a gente tem alguns projetos, de médio prazo e longo prazo dentro do poder público, que não vai parar, que a gente tem que continuar atendendo. Tem a prestação de serviço público, a relação com o artista, com a ponte, mas sem perder de vista projetos também de médio e longo prazo. E o que a gente tem mais de médio e longo prazo são duas grandes frentes. Uma é o Conjunto Moderno da Pampulha, porque ele envolve ações que são estruturadoras, desde restauração do Museu de Arte da Pampulha até uma série de intervenções, um conjunto para que a gente tenha cada vez mais uma apropriação desse espaço. Essa relação com o todo, com a Lagoa (da Pampulha). E aí vem muita notícia boa pela frente. Foi inclusive incorporado como um projeto transformador da PBH pelo prefeito (Álvaro Damião) e a parte de infraestrutura cultural que a gente também tem fortalecido. E a gente tem um grande espaço cultural que vai ser inaugurado também. Agora, no final desse ano ou início do ano que vem, que é o Espaço Cultural Multiuso, no Parque Municipal, que é um grande equipamento cultural. Acabamos de institucionalizar mais um passo no Centro de Referência das Culturas Urbanas, no Viaduto Santa Tereza. Então, esse esforço também de qualificar e ampliar a infraestrutura cultural, que eu acho que aí são projetos mais a médio, longo prazo.
Sobre o Conjunto Moderno da Pampulha, como andam as ações para a reforma do Museu de Arte da Pampulha e a criação da Casa MAP? Será que a cidade pode ter estas entregas ainda neste ano?
Esse é um compromisso nosso. O processo de restauração de um bem como o Museu de Arte da Pampulha é muito complexo. As planilhas tem milhares de itens, tem processos que precisam de aprovação, tem proteção nos três níveis, municipal, estadual e federal, mais da UNESCO, como patrimônio cultural, e os processos têm que ser todos compatibilizados. Eles tem que ser aprovados nas três instâncias. Então é um processo que é longo mesmo. E a gente sabe da agonia que dá para a sociedade civil, que muitas vezes pode parecer que não está sendo feito, mas é porque o processo é longo mesmo, do ponto de vista da preparação para que ele seja feito da melhor maneira possível. A gente tem tentado manter essa transparência de cronograma, de compartilhar com a sociedade, e aí a gente já estamos com a Casa MAP, que estamos chamando de Núcleo de Pesquisa do Museu de Arte da Pampulha. Do ponto de vista de obra, esse espaço já está na sua etapa final. Agora são detalhes finais dessa parte da reserva técnica, que vai receber o acervo do Museu, para poder fazer o transporte do acervo. Então, sobre a reforma do Museu de Arte da Pampulha, a nossa meta é começar entre julho e agosto. A gente está com a licitação na rua para já viabilizar essa restauração. E a gente está incluindo nesse processo de licitação, que é algo que é bem importante para a gente, uma espécie de processo expositivo dentro do museu, na área do Museu de Arte da Pampulha, para que aquele visitante, para que o cidadão que mora na cidade, etc, possa acompanhar o processo de restauração. Porque também é um processo que não é tão rápido. E a nossa ideia é não só ter uma exposição, mas ser uma espécie de estande mesmo. Um espaço onde as pessoas vão poder acompanhar o que está sendo feito de restauração, o que é aquele prédio, qual é a sua história, como se fosse um trabalho de educação patrimonial, mas também de exposição e até de transparência com a sociedade, para poder entender o que está sendo feito, como está sendo feito. E por que é tão complexo? Porque achar o fornecedor do espelho belga que já não existe mais, precisamos afazer mil testes... Aí a esquadria, que é supercomplexa. Como é que a gente lida com aquilo? Então, é um processo que é muito bonito, mas longo, demorado. E o que a gente quer fazer é compartilhar isso com a sociedade também, no sentido de transparência e de compromisso público. Mas, como já foi dito, os recursos estão todos garantidos. A estimativa inicial de investimentos para restauração do Museu de Arte da Pampulha, algo em torno de R$ 25 milhões, são recursos do Fundo do Patrimônio já viabilizados e reservados, e o Núcleo de Pesquisa também já está todo avançado para que possa receber a reserva técnica e, em seguida, a gente já começa esse trabalho também de receber público, de pesquisas, etc.
Eliane Parreiras chegou à Secretaria Municpal de Cultura em 2022, quando Fuad Noman assumiu a prefeitura. Foto: Reprodução / Canal O Tempo
A senhora falou que completou agora três anos na Prefeitura de Belo Horizonte. Da gestão do Fuad Noman para a gestão do Álvaro Damião, o que mudou de diretriz? Quais são as principais diferenças que a senhora percebeu do ponto de vista de plano de governo e de diretrizes?
O prefeito Álvaro Damião tem apoiado intensamente tudo que foi construído, tem dialogado com vários setores da cultura, do Conselho (Municipal de Cultura) a setores específicos, e tem nos apoiado muito nesses processos. Colocou esse conteúdo do Conjunto Moderno da Pampulha como um todo, porque essa ação integrada, transformou esse conteúdo em um projeto transformador, com um olhar realmente muito integrado para a cultura. Mas eu acho que a gente tem uma mudança que é um pouco do perfil. O prefeito Álvaro Damião é um grande comunicador, então eu acho que a gente tem uma oportunidade muito grande de conseguir comunicar com a sociedade de maneira ainda melhor. Esses resultados e essas ações que estão sendo feitas. Ele tem apoiado todo o plano de governo. A gente está agora num momento que é superestratégico, que é a Constituição do PPAG e a construção do planejamento para os próximos quatro anos. Por isso eu falei do projeto transformador, porque ele faz parte disso. Mas, então, todas as diretrizes, todos os projetos de continuidade, as ações de fomento, todos esses processos estão sendo apoiados e continuados dentro desse plano, que é superimportante. Eu falava aqui com vocês que é muito menos sobre mim e muito mais sobre a continuidade de um projeto de política pública de cultura, que é superimportante para a cidade de Belo Horizonte e está preservado, está no planejamento. A gente passa também por um ano muito especial, que a gente vai ter a Conferência Municipal de Cultura e vamos ter a elaboração do Plano Municipal de Cultura, que será de 2026-2035. O plano anterior finaliza em 2025. Então é um ano muito estratégico para a cultura. A gente está cheio de energia com esse aporte que o prefeito Álvaro Damião traz de integração, de pensar a cidade, de pensar os eventos, de fortalecer as culturas regionais. A gente tá bem animado. Será um ano estratégico de planejamento e que vai impactar muito para Belo Horizonte nos próximos anos, não só dos próximos quatro anos (da atual gestão), mas nesses dez anos, por meio do Plano Municipal.
Esse Plano Municipal seria também uma estratégia de proteger a cultura, as ações culturais para o município, de mudanças de governo? Tornar menos vulnerável, menos suscetível a que essas mudanças de governo possam atuar em cima da cultura?
Sem dúvida. O Plano Municipal de Cultura, os planos de cultura de modo geral, são instrumentos de controle social, onde a sociedade participa ativamente. É evidente que isso é compatibilizado com a legalidade, com as possibilidades de cada gestão. Então, é claro que ele é também um plano que traduz as demandas da sociedade, mas para uma realidade possível também. Mas para isso, é preciso planejamento. E ele é um instrumento muito importante. A gente faz esse monitoramento. O Plano integra o chamado Sistema Municipal de Cultura, que tem outras questões que são superimportantes, como os conselhos, o sistema de financiamento, o sistema de indicadores, que é muito importante para o monitoramento das políticas públicas. E o plano é fundamental, é a nossa bússola. Tem meta, tem acompanhamento, tem resultado. E ele se desdobra nesses instrumentos de planejamento que eu falei dos quatro anos de gestão. Estamos discutindo Belo Horizonte para 2050, com a cultura muito presente por causa da vocação da cidade. Minha cidade tem essa vocação. Então, sim, é um momento realmente muito especial. Ao mesmo tempo que a gente tem políticas nacionais que estão impactando muito também, não só no fomento, mas no pensamento, como marco regulatório do fomento. Então, é um momento muito especial para a cultura, de fortalecimento, institucionalização e, ao mesmo tempo, a garantia da participação social. A gente está falando de quem faz a cultura, os agentes culturais, os gestores, os coletivos, os espaços e as instituições culturais.
Recentemente, o prefeito Álvaro Damião fez algumas nomeações na Fundação Municipal de Cultura (FMC), promovendo algumas indicações da vereadora Cida Falabella. Como a senhora viu essa mudança e como enxerga esse trabalho?
O trabalho da Fundação Municipal de Cultura e da Secretaria Municipal de Cultura precisa ser um trabalho absolutamente integrado, pois há uma interdependência entre as instituições, as políticas públicas e o planejamento. É pensar de maneira conjunta, apesar das atribuições serem diferentes. E acho muito simbólico que no ano que a Fundação Municipal de Cultura completa 20 anos - e isso é uma das programações que a gente vai ter ao longo do ano também, com a discussão desses modelos de gestão pública, a importância da FMC para a cidade - que temos a nomeação de uma profissional que vem da própria FMC. Há oito anos, a Bárbara Boff é diretora de uma área superestratégica dentro da Fundação, uma área que trabalha não só a descentralização e a territorialização por meio dos centros culturais, a gestão dos 17 centros culturais, a gestão do Centro de Referência das Culturas Urbanas, recém-implantado, e o Centro de Referência das Culturas Populares e a Escola Livre de Artes. A Arena da Cultura, que atende 9.000 estudantes, jovens e pessoas de todas as idades nas suas atividades educativas. Então, é alguém que conhece profundamente a Fundação com uma visão muito importante de território, com uma competência técnica muito importante, com uma ligação muito forte com algo que o prefeito Álvaro Damião tem nos pedido muito, que já estava dentro dos desejos do prefeito Fuad. Também que a questão da cultura periférica, das vilas e favelas, com essa atuação mais próxima, mais forte, com essa política cultural de base comunitária, como por exemplo a política Cultura Viva, que vai ser muito fortalecida nesses próximos tempos. Então eu acho que é muito simbólico essa chegada da Bárbara, do Gustavo Bones como vice-presidente, que também é uma pessoa que é dedicada à área cultural, dedicada também a esses processos de ocupação cultural no território. Então, a gente está muito animado. Bárbara já estava participando desse processo de planejamento inteiro que eu estava falando. Esse ano foi construído de uma maneira superespecial, junto com a equipe, então a gente fez num processo mesmo de escalada das equipes, com as diretorias em quatro dias de imersão onde a gente construiu o Plano Plurianual de uma maneira muito estruturada para garantia das políticas públicas, dos projetos da gestão para conseguir mais recurso, sejam das emendas, sejam recursos nacionais. É um conforto mesmo, um alívio, que eu acho que a gente está em um caminho muito estruturado do ponto de vista de uma política pública que vai ter continuidade e que está com todos os seus instrumentos institucionais garantidos para ter essa continuidade e seguir fazendo a diferença na vida cultural de BH.
Secretária afirma que 2025 será um ano estratégico para a cultura em Belo Horizonte. Foto: Reprodução / Canal O Tempo
Secretária, falando sobre a garantia de recursos, a captação e o fomento cultural para Belo Horizonte, em que ponto estamos em relação as leis de incentivo, especialmente a Lei Paulo Gustavo, e a execução dos projetos? A Política Nacional Aldir Blanc (PNAB) também segue com um aporte importante para a cidade?
Sem dúvida nenhuma essas leis federais, de âmbito nacional, foram muito importantes para ampliar o fomento cultural. Belo Horizonte também tem uma tradição nesse aspecto. A Lei Municipal de Incentivo à Cultura foi criada há 35 anos. Então, a gente pensa o tanto que Belo Horizonte foi inovadora quando a gente pensa em uma lei. A Lei Sarney (primeira política pública de incentivo à cultura no Brasil) fez 40 anos, cinco anos depois Belo Horizonte já tinha uma lei de incentivo fiscal, que foi sendo aperfeiçoada ao longo do tempo. Hoje, a legislação é de 2016, mas o instrumento surgiu lá em 1990. Então, tem uma estrutura com um sistema de fomento. Hoje a gente pensa de maneira muito integrada, é sistêmico. Não adianta a gente pensar o incentivo fiscal, o Fundo Municipal de Cultura ou a Lei Paulo Gustavo ou a PNAB de maneira isolada. Isso tudo é sistêmico. A gente tem que pensar como é que a gente consegue trabalhar isso de maneira integrada. E aí são vários passos. Mas o primeiro que a gente está trabalhando, que é algo muito simples, mas é muito difícil pra gente, muito desafiador de ser feito, que é a previsibilidade para o agente cultural. Quando que vai (sair um edital), quais instrumentos que vão ter. Então, a gente passou a lançar um calendário anual, já tem dois, três anos que a gente está fazendo isso, que é um calendário para ele se organizar. Ele sabe quando vai sair cada um dos editais ou cada um dos processos, como é que ele vai trabalhar, quais são os momentos de participação social para essa construção desses editais ou dos planos que vão ser apresentados para o governo federal... Uma outra questão é essa escuta ativa para entender quais são as demandas e como é que a gente pode aperfeiçoar cada um desses instrumentos. E, no caso de Belo Horizonte, do ponto de vista da Lei Municipal de Incentivo à Cultura, a gente tem o compromisso de que já está também como meta do plano municipal a revisão dessa lei de incentivo, porque ela já tem quase dez anos e precisa ser remodelada. A gestão pública é muito dinâmica e agora a gente tem algo que é muito importante, que é o Marco Regulatório de Fomento, o marco nacional. A gente vai fazer a regulamentação municipal e isso muda completamente a forma de visão da questão do fomento cultural, porque muitas coisas que a gente acabava trabalhando por meio da Lei de Licitações e Contratações, mas que na verdade se tratam de fomento, elas passam a ter agora uma legislação nacional que regule sobre isso. Vou citar um exemplo... a gente tem o prêmio Mestres e Mestras da Cultura Popular. Não faz o menor sentido esse prêmio ser feito numa lei de licitações e contratos. A relação não é essa. Não é uma relação de prestação de serviço. Só que até então a gente não tinha uma regulamentação que abarcasse isso do ponto de vista nacional. Acabamos de sair de um seminário junto com o Tribunal de Contas do Estado (TCE-MG), que aconteceu exatamente no sentido de estimular os municípios, os estados, que regulamentem e passem a utilizar (o marco regulatório nacional). Acho que isso é um grande marco e a revisão da nossa lei municipal será feita com base nisso. Ele simplifica a prestação de contas, a apresentação, é muito mais acessível. É muito importante do ponto de vista da democratização e, ao mesmo tempo, foca naquilo que é importante, que é o impacto, o resultado da atividade e não necessariamente só numa planilha financeira ou numa prestação de contas superdetalhada. É muito interessante. É uma lei muito importante pra gente e, além da lei municipal, que vai ter essa revisão, que hoje a gente fica em torno de R$ 30 milhões, um pouco mais, que são de recursos próprios do município, a gente teve Lei Paulo Gustavo, que foi completamente executada do ponto de vista do investimento, mas que agora as produções audiovisuais, elas têm um tempo de de maior produção, etc. Então, nesse ano a gente já vê um volume maior de pedido de licenciamento das filmagens, etc. Então está superaquecido. Esse ano a gente já fez mais de uma diária, mais de uma produção por dia nos quatro primeiros meses do ano pela BH Film Comission. Então a gente vê que essa produção está superativa. Desde produções de fora de BH que a gente está prospectando até as daqui. E daqui a pouco a gente começa a ver esses resultados, que a gente também tem discutido, como abrir janelas de exibição para esses produtos, a circulação, que é algo que nos preocupa. E do ponto de vista da PNAB, a gente fica superfeliz, pois em 30 de junho tinha chegado à execução de 102% - os 2% é porque tem rendimento -, em relação ao que a gente tinha recebido no ano passado. Estamos agora em plena preparação para o Ciclo 2, que já traz também um amadurecimento não só nosso, mas da sociedade civil e do próprio Ministério da Cultura, que já propõem alguns outros modelos, alguns avanços para se tornar uma política pública. Efetivamente, não só um sistema de financiamento, mas que passe a ser uma política pública integrada. Então a gente tem dialogado muito e estamos exatamente nesse momento de preparação. E esse ano ainda tem uma boa notícia para o audiovisual, que são os arranjos regionais, que é uma política onde o Ministério da Cultura e a Ancine aportam recursos, normalmente de R$ 3 a R$ 4 reais para cada real colocado pelo município ou pelo estado. Então a gente está se preparando para isso, nos reunindo com o comitê do BH nas Telas, nosso programa de audiovisual, pra gente construir junto esse programa. Já estamos com a contrapartida também garantida.
Este arranjo regional seria a ampliação do BH nas Telas?
Sim, o BH nas Telas entra como recurso próprio investido pelo município. Ele entra como essa contrapartida junto ao arranjo regional para poder receber recurso federal. Então, é uma política que a gente acredita muito, essa política onde o outro ente federado tem que ter a participação com recursos próprios, porque a cultura é responsabilidade de todas as instâncias. Ela não é uma atribuição só do governo federal. Então os municípios, os estados, eles precisam se organizar para poder ter no seu orçamento recursos dirigidos para essa atividade. E o governo federal vem suplementar isso num círculo virtuoso. A gente está bem feliz assim, porque estamos preparando essa inscrição, que acontece até o fim de agosto. A gente tem que estar com todas essas propostas, mas BH está superpreparada e com algo que a gente não abre mão, que é de ser uma construção coletiva, dessa construção não ser feita só dentro da secretaria (Municipal de Cultura), mas ser feita junto com os agentes que promovem, que executam a política cultural na cidade.
O prefeito já disse que tem a intenção de transformar BH em um polo de grandes eventos. Como que tem sido essa articulação com a Belotur? Como a secretaria tem trabalhado e o que se pode esperar?
A gente tem, dentro da estrutura própria da Fundação Municipal de Cultura e da secretaria, alguns grandes eventos. Nós temos cinco festivais, que são eventos de maior porte, porque as outras ações também são, mas elas são continuadas, então elas ficam mais diluídas. Mas a gente tem esses cinco grandes eventos. Esse ano a gente tem a Virada Cultural agora, em 23 e 24 de agosto. Depois temos o Festival Literário Internacional, que também tem o impacto, e vai ser em outubro, e nós temos o Festival de Arte Negra, que vai ser em novembro. No ano que vem teremos os outros dois festivais, que são bienais: o Festival Internacional de Quadrinhos e o Festival Internacional de Teatro. Então, uma das vertentes que a gente tem feito é ampliar e fortalecer esses festivais, que não só dão um espaço muito grande para produção local, mas dialogam com essa produção nacional e internacional, como o próprio nome desses festivais já diz. Então, estamos tentando fortalecer muito dentro dessa vertente de ter mais negócios e ter mais atividades. E, claro, estamos dialogando também com a Belotur, no sentido de não só ampliar, mas criar as nossas ações e os projetos próprios, criar um ambiente de negócios adequado para que cada vez mais a gente tem essas produções acontecendo. Isso passa por uma ação também com as políticas urbanas, com a Secretaria de Políticas Urbanas, de Regulações e Licenciamento. Passa pelo fomento, seja da Belotur, seja da Secretaria de Cultura. Passa por uma ação integrada de calendário, um diálogo maior. A gente tem grandes festivais na cidade que são referência do ponto de vista nacional, de modelo. A gente teve agora o Sensacional, a gente tem o Sarará, a Festa da Luz, a gente tem uma série de iniciativas. Citei aqui só alguns, mas temos grandes eventos que acontecem em vários espaços. Temos uma infraestrutura muito boa na cidade, com os estádios, o Mineirão agora fazendo 60 anos também se abrindo para várias ações, o Independência querendo também atuar de uma maneira diversificada. Então, eu acho que é uma grande ação integrada, que precisa fomentar esses produtores. É muito impressionante quando você chega num evento desse porte, quando você vê o volume de pessoas trabalhando, a cadeia produtiva acontecendo. Ela é extensa, tem gente de alimentação, de segurança, de limpeza, tem tradutor, tem toda a parte de logística de van, de táxi, de carro, de aplicativo. É realmente muito emocionante quando a gente vê os bastidores desses grandes eventos e a ideia é prospectar e apoiar para que isso possa ser realizado nessas diretrizes que o prefeito tem passado de maneira muito firme, mas sem perder de vista o apoio ao artista local, à manifestação regional, que está lá na ponta, essa política de base comunitária. Temos a cultura viva como grande eixo, que são os pontos de cultura que estão lá dentro da comunidade, que muitas vezes é onde o Estado, onde o poder público não consegue chegar. É a junção disso tudo que vai fazer BH pulsar ainda mais cultura do que a gente vê hoje. Já temos um calendário amplo, a gente já não consegue acompanhar tudo que acontece na cidade, porque a gente tem uma diversidade cultural acontecendo que é muito positivo, mas queremos fortalecer isso ainda mais.
Secretária, você mencionou o Mineirão enquanto um espaço de receber grandes eventos, e o Independência, que está fazendo 75 anos, tem algo preparado para que o espaço e as redondezas receba alguma iniciativa cultural?
A gente está iniciando essa conversa. O Independência, por causa até de questões de gestão, vive outro momento, que é de poder estabelecer políticas próprias também de eventos, de manifestações e da organização disso. Mas eu tenho certeza que a gente vai ter boas notícias pela frente. Assim, a gente vive esse ano de muitas celebrações, do Independência, do Mineirão... A gente está tentando estar o mais próximo possível dessas iniciativas e tentando facilitar ao máximo aquilo que depende do poder público, do ponto de vista de organização ou institucionalidade. E tentando fomentar e apoiar mesmo. E para os artistas e gestores, eu acho que também é muito importante que esses espaços tenham essa intenção de se abrir, de estar mais perto, de propor atividades, porque todo mundo ganha. Então, esse tem sido o diálogo com esses grandes espaços da cidade, para que a gente tenha cada vez mais essa ação integrada de parceria pela cidade.
Há projetos e propostas de descentralização das atividades do hipercentro de BH, de criar outros espaços de diálogo, de acolhimento e de fruição da cultura, ao mesmo tempo que também está no ar algum projeto de que os centros culturais da cidade também ganhem um outro tipo de olhar, não só de programação, mas também de restauro, de um cuidado de estrutura?
No nosso planejamento do Plano Plurianual estes são eixos que a gente tem trabalhando. A territorialização é algo que é muito importante, mas não no sentido de levar cultura, porque isso não existe. Cada um dos territórios tem uma cultura imensa, riquíssima e o que a gente tem que fazer é potencializar cada vez mais aquilo que está acontecendo. Essa questão da nossa rede de centros culturais, que é muito mais que uma rede de equipamentos culturais, são equipamentos públicos e de uma política pública muito estruturada. Mais de 90% dos nossos centros culturais foram criados a partir do Orçamento Participativo. Ou seja, foi a própria comunidade que pediu que aqueles equipamentos culturais estivessem dentro das comunidades. Tem uma relação muito umbilical com cada uma das comunidades. Existem comissões locais para cada um desses centros culturais, mas a gente tem consciência que existem limitações físicas, que existem espaços que foram adaptados e que muitas vezes demandam novos investimentos. Então, para além da manutenção, a gente tem feito esse levantamento de como fortalecer essas infraestruturas. A gente inclusive agradece o Legislativo, porque vários vereadores têm indicado emendas para poder melhorar também, para poder colaborar com esse processo de melhoria desses centros culturais, desses espaços que são superimportante, que toda a comunidade ganha. Então, a gente tem um programa, por exemplo, como o Descontorno Cultural, que mostra essa produção que está no território e joga luz sobre ela, garante esse espaço. Do mesmo jeito que a gente tem esse esforço de que essas produções consigam acessar programas como Circuito Municipal de Cultura, como a Virada Cultural. E tem algo que é superimportante, que para além do Fundo Municipal de Cultura, a PNAB, nos nossos editais, 20% obrigatoriamente tem que ir para proponentes, gestores que estão vindo dessas áreas periféricas. Então a gente fez, e é um conceito superamplo, um trabalho junto com a Urbel para poder entender quais seriam os critérios para determinar o que é área periférica, o que é vila, o que é favela, o que é ocupação, etc, e a partir disso eles têm essa garantia desse investimento, além do Cultura Viva, que conta com 25% dos recursos, que são os pontos de cultura. Por isso que eu falava que a gente vive um ciclo muito importante, de um movimento, de uma política pública muito integrada e que dialoga com isso tudo. Então, a gente está dialogando com a Coordenadoria de Vilas e Favelas como é que a gente vai trabalhar os pontos de cultura que estão todos dentro dessas vilas e favelas e como é que a gente vai atuar junto com eles para poder fortalecer. Então é tudo integrado. Como os bons desafios das cidades, você não fala de uma política temática, isolada. Não existe. Tudo está interligado ou com políticas urbanas, com a Educação, que a gente tem uma parceria muito grande, ou com Meio Ambiente. Em todas as áreas. A gente tem essa integração, obras o tempo inteiro, manutenção, que a gente faz um agradecimento muito grande, porque isso é um olhar muito atencioso para a cultura. Então é um trabalho integrado, mas que a gente está muito focado nisso, de começar a colocar isso não só como orçamento, mas como meta dentro do nosso planejamento. O cidadão que olhar no nosso planejamento vai enxergar isso com essa preocupação de termos não só programas e atividades para isso, mas que a gente possa ter também programas estruturadores, projetos que vão atender a essas demandas para a gente fortalecer também esses espaços. Os centros culturais tem algo que ele é muito bonito, porque ele não fica limitado a sua área física. Esses centros culturais, de maneira geral, eles têm uma atividade que dialoga com a comunidade inteira, seja recebendo dentro dos seus espaços manifestações culturais, atividades, etc. Seja recebendo, seja trabalhando junto com esses ativos culturais que tem em cada regional, também atuando fora do seu espaço físico. A gente pega, por exemplo, o atual momento - que é lindo -, mês de junho e julho, com as festas juninas nos centros culturais... Tudo acontece na rua e junto com a comunidade inteira, a comunidade organiza, tem economia solidária. A própria comunidade se organiza. É muito bonito porque é uma presença realmente muito legitimada dentro da comunidade e construído junto com a comunidade. A comunidade nos cobra muito e a gente acha que tem que cobrar mesmo. Nos demanda, reclama, fala. E isso é o processo de fortalecer, porque só faz sentido se fizer sentido para eles.
Sobre o seminário promovido pelo Tribunal de Contas do Estado, em parceria com o Ministério da Cultura, como foi a participação da prefeitura?
A prefeitura participou desde o começo nessa elaboração, porque esse tema do fomento cultural, do marco regulatório é algo que é muito transformador e muito impactante para a cultura. Eu tendo a dizer que depois da lei do Sistema Nacional de Cultura, é o marco legal mais importante que a gente tem do ponto de vista de transformação, num modelo de atuação que a gente vinha fazendo no qual tinhamos que encaixar na Lei de licitações e contratos e contratações, o que é, por natureza, fomento cultural, e aí tem outra necessidade de avaliação, de execução, etc. E nesse seminário eu participei não só como representante da Prefeitura de Belo Horizonte, mas eu sou também presidente do Fórum Nacional de Secretários e Secretarias de Cultura das Capitais e dos Municípios Associados. Então, o Fórum participou dessa discussão, porque a ideia agora é que o Brasil inteiro repita esse tipo de atuação. E ele foi tão importante porque reuniu os órgãos de controle externos, Tribunal de Contas, Ministério Público de Contas, órgãos de controle interno, as controladorias municipais e estaduais, as procuradorias municipais e estaduais... Ele reuniu num mesmo ambiente esses órgãos de controle e a própria classe cultural para um processo não só de escuta, mas de criação de consenso a respeito da implementação desse marco do fomento, desse marco regulatório. A gente aguarda agora o Ministério da Cultura publicar a regulamentação federal, o decreto, e Belo Horizonte já está preparada. A gente já está com um grupo de trabalho interno dentro da prefeitura também com o envolvimento dessas outras áreas, para a gente criar também a nossa regulamentação municipal. E se desdobra nos procedimentos, porque aí todas as áreas têm que entender como é que elas vão executar. Do mesmo jeito que todas as áreas aprenderam a utilizar a Lei de Licitações, elas vão aprender agora. E para isso precisa ter procedimento, precisa ter regra de como é que vai ser, qual vai ser o impacto. As comissões de acompanhamento, de prestação de contas. Então a gente tá superanimado, porque eu acho que, sem dúvida nenhuma, é uma quebra de paradigma no setor cultural. É um entendimento real do que é a ação cultural, a natureza dessa atividade, a natureza dessa relação de parceria do poder público com o agente cultural, com o artista, com a instituição cultural. E eu acho que a gente vai ter um cenário transformador nos próximos anos. É claro que isso requer um tempo de implementação, requer capacitação. O presidente do Tribunal de Contas do Estado, conselheiro Durval Ângelo, está fazendo um trabalho extraordinário nesse sentido. A gente só tem a agradecer muito porque ele tem trazido esse olhar, não só agora com o marco regulatório, mas inclusive na avaliação das prestações de contas, nos processos que chegam lá, de acabar com essa criminalização da cultura, acabar com essa visão muito equivocada de muitas vezes perseguir essa questão financeira em detrimento de resultados e de impactos culturais, sociais, econômicos inclusive para as cidades e para os estados, que é onde a gente tem que focar e qualificar essa avaliação. Isso é o mais importante; que o Marco Regulatório do Fomento dá como instrumento, ele viabiliza isso. E agora está todo mundo debruçado pra criar esse consenso. É a união desses órgãos todos para criar o consenso e a gente avançar nesses marcos institucionais da cultura.
Secretária, nós estamos há um pouco mais de um mês da Virada Cultural... Tem alguma novidade, algum spoiler para nos adiantar?
Olha... (risos) a Virada vai continuar na região central, esse desenho permanece assim. Mas eu acho que temos esse ano de ganho é essa Praça da Estação maravilhosa, a rua Sapucaí já com o fechamento da via, o Centro de Referência das Culturas Urbanas já implementado, o Parque Municipal com as portarias todas abertas, um circuito gastronômico maravilhoso... Então, a gente acha que teremos uma Virada muito simbólica dessa ocupação. Mas é o máximo que eu posso falar.