Direitos autorais

Deputado diz que retomará discussão que prevê pagamento do Ecad por artistas

Taxa, pela lei atual, é paga pela produção do evento; parlamentar, que é produtor cultural, resolveu dar pausa após críticas, mas afirmou que vai levar adiante a proposta no futuro

Por Letícia Fontes
Publicado em 08 de maio de 2020 | 11:30
 
 
 
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Mesmo após ter retirado da MP 948/2020 a emenda que alterava a cobrança de direitos autorais dos compositores, o deputado Federal Felipe Carreras (PSB-PE) não desistiu de levar adiante a proposta futuramente. O parlamentar decidiu voltar atrás e "dar uma pausa" nas discussões depois de ter sido duramente criticado pela classe artística e de discutir com a cantora Anitta nas redes sociais. O deputado havia proposto que “somente o intérprete poderá pagar o direito autoral de músicas executadas em eventos”, isentando o produtores de arcar com tais custos.

A MP 948/2020 trata do cancelamento de serviços e eventos dos setores de turismo e cultura por conta da pandemia do coronavírus. A emenda proposta por Carrera mexeria com a cobrança de direitos autorais em eventos públicos e privados. Pela lei atual, são os empresários de eventos que arcam com os valores dos direitos autorais. Eles devem transferir um percentual de cerca de 10% da bilheteria para o Ecad (Escritório Central de Arrecadação e Distribuição), que os repassa aos compositores. A emenda de Carreras propõe a redução do repasse para 5% e tira a responsabilidade dos produtores de eventos pelo pagamento – a obrigação passaria a ser dos intérpretes.

Este conjunto da obra – a diminuição do valor e a mudança na responsabilidade pelo pagamento, ainda mais em tempos de crise econômica pela pandemia do coronavírus – incomodou vários músicos. Anitta, Teresa Cristina, Paulo Ricardo, Alceu Valença, Danilo Caymmi, Jorge Vercillo, além de duplas sertanejas como Maria Cecilia & Rodolfo e Guilherme & Benuto se manifestaram contra a proposta. 

Segundo o deputado, a decisão de retirar a emenda de pauta se deu pela falta de compreensão do setor. Na última terça-feira (5), a cantora Anitta fez uma transmissão ao vivo em seu Instagram pedindo esclarecimentos ao parlamentar sobre a medida. Durante a transmissão o clima ficou tenso entre os dois, que discutiram em vários momentos.

"Eu sou uma pessoa pública, não tenho nenhum problema em me explicar, mas ela nem me deixou falar. Não houve compreensão da classe artística sobre o real motivo da proposta, eles pensaram que perderiam dinheiro. Nossa sugestão foi alterar o critério de cobrança do Ecad. Na nossa proposta, o contratante vai pagar um valor adicional à entidade que representa os artistas, ou seja, o Ecad. Não será subtraído. Essa ideia é fazer com que eles (Ecad) tenham mais transparência, porque atualmente a forma como é feita é injusta e obscura", explicou o parlamentar.

"Hoje é assim: se o cachê for R$ 100 mil, o artista vai receber R$ 100 mil e o contratante paga R$ 10.000 à entidade, ao Ecad. Mais para frente vamos voltar a esse debate, é necessário. Queremos dar mais transparência e justiça a quem paga e a quem recebe", completou Carreas. 

Atualmente, o deputado pernambucano é representante da Associação Brasileira de Promotores de Eventos (Abrape), entidade que representa empresas promotoras de eventos. Umas das críticas da classe artística é que o parlamentar estaria legislando em causa própria. "Eu estou deputado, mas sou produtor há anos. Na Câmara dos Deputados tem médicos que defendem a área médica, também tem agricultores defendendo a agricultora assim como tem pastor defendendo a igreja. Eu estou defendendo um setor, não é o meu próprio umbigo. Eu represento uma categoria", pontuou. 

Temor 

Para o diretor-executivo da União Brasileira de Compositores (UBC), Marcelo Castello Branco, uma das questões mais problemáticas do projeto é se aproveitar de um momento delicado como o coronavírus para retirar direitos da classe artística e achar que não se deve pagar.

Segundo Castello Branco, a emenda é inconstitucional. "Estamos falando de uma medida provisória de caráter emergencial para minimizar o cancelamento de serviços e eventos dos setores de turismo e cultura por conta da pandemia. O direito autoral não cabe dentro disso, porque é um direito constitucional. O direito autoral não é um imposto, é um direito", avaliou.

"O mercado da música é um organismo mais vivo do que nunca, e o Ecad segue esta dinâmica, de portas e janelas abertas. Seus critérios e regras de arrecadação e distribuição não são imutáveis. Mas como discutir com uma medida provisória? Uma MP não tem diálogo", finalizou. 

Apesar do temor, de acordo com o violonista, compositor, arranjador e produtor mineiro Geraldo Vianna, a tentativa de retirar direito da classe artística é algo que sempre aconteceu e que, apesar da trégua do deputado, a luta continua. "Foi algo completamente baixo, malicioso, usou-se de um momento de fragilidade da população para retirar a conquista de quatro séculos de luta por um direito. Eu sou compositor como inúmeros no país e muitos não fazem shows e dependem da arrecadação de direitos autorais. Vários têm diversas músicas famosas, mas não são conhecidos. Não queremos nada além do que viver do que fazemos", defendeu Vianna. 

Outro lado
Procurado, o Ecad informou que "a proteção do direito autoral é garantida pela Constituição. E entendemos que a Medida Provisória 948, que trata da relação de consumo decorrente do cancelamento de serviços e reservas de shows e eventos por causa do coronavírus, não é o instrumento apropriado para um debate sobre os direitos autorais", informou o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição por meio de nota.

 

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