Até 2030, 39% das habilidades usadas no trabalho que conhecemos hoje devem ser transformadas ou tornarem-se obsoletas em um contexto de ampliação das automações e rápido desenvolvimento tecnológico. É o que aponta o relatório “Trabalho do Futuro 2025”, realizado pelo Fórum Econômico Mundial em parceria com a Fundação Dom Cabral, que destaca como a ampliação do acesso digital é vista como um dos motores das tendências mais transformadoras do universo profissional, sendo citada por 60% dos entrevistados, com destaque, principalmente, para a Inteligência Artificial (IA) e processamento de informações, robótica e automação.

Em particular, o estudo indica que a IA Generativa – aquela capaz de criar novos conteúdos, como textos, imagens e vídeos – apresenta um rápido crescimento, impulsionado tanto pelo aumento dos investimentos quanto por sua adoção em diversos setores da economia, com destaque para serviços financeiros, consultoria e educação. 

“Esse cenário gerou um aumento expressivo na demanda por habilidades relacionadas à IA refletindo o seu potencial de aprimorar o desempenho, ganhos de produtividade e a eficiência dos trabalhadores em suas atividades”, descreve o documento, que, por outro lado, adverte: “Sem estruturas adequadas de tomada de decisão, incentivos econômicos estratégicos e regulamentações governamentais, essas tecnologias podem ser utilizadas para substituir o trabalho humano, em vez de aprimorar suas capacidades, o que poderia resultar em maior desemprego e desigualdade”.

O cenário complexo e de rápidas transformações é visto como irreversível pela especialista em treinamento e desenvolvimento humano Vivian Wolff. “A automação e a tecnologia estão cada vez mais em nossas vidas e nos convidam a evoluir. O foco deve ser no desenvolvimento humano e na adaptação constante, é imprescindível sermos donos de nossas carreiras e nos mantermos relevantes”, assinala ela, cujos conselhos encontram eco nos resultados da pesquisa conduzida pelo Fórum Econômico Mundial e Fundação Dom Cabral. Segundo o relatório, treinamento, requalificação e aprimoramento de habilidades estão no centro das estratégias das empresas para lidar com essas mudanças, com 85% dos empregadores planejando priorizar o aperfeiçoamento de sua força de trabalho.

 

Capacitação

Respondendo às novas demandas do mercado de trabalho, o perfil do trabalhador está em franca evolução, tendo como prioridade o desenvolvimento de habilidades tecnológicas, com um foco em competências relacionadas justamente à IA, big data, e segurança cibernética, conforme indica o documento “Futuro do Trabalho 2025”, que aponta: 65% dos trabalhadores consideram a requalificação e a busca por novas competências como essencial para manter sua relevância no mercado e empregabilidade. “Além disso, 78% dos empregados buscam oportunidades de treinamento oferecidas por seus empregadores para aprimorar suas habilidades. Nesse sentido, há um aumento no interesse por oportunidades de aprendizado contínuo em ambiente corporativo, com 70% dos trabalhadores dispostos a dedicar tempo fora do horário de expediente para cursos de aprimoramento”, complementa a publicação.

Essa capacitação é tratada, de fato, como básica por Vivian. “Sem dúvida, o uso consciente da IA exige preparo, desde questões legais e de confidencialidade até o básico, como, por exemplo, a construção de um bom prompt (comando)”, assevera, diante dos diversos relatos de mau uso da ferramenta, que já vem causando dor de cabeça em muitas empresas. Há até casos midiáticos, como o episódio em que o um escritório de advocacia protocolou na Justiça, para seu cliente, um recurso escrita por IA, que foi negado a partir de um fato inusitado: mais de 40 jurisprudências citadas na petição haviam sido inventadas pela ferramenta. “Sem orientação, a IA pode gerar retrabalho e decisões frágeis. Então, ter times capacitados e diretrizes claras de uso é estratégico. Isso garante que a tecnologia seja aliada da produtividade, sem comprometer a ética, a qualidade e a confiança nos processos”, complementa a especialista em desenvolvimento humano.

A treinadora prossegue listando habilidades e competências que podem fazer a diferença nesse momento de transição. “Curiosidade, criatividade, pensamento crítico e inteligência emocional são diferenciais que eu sempre menciono. E aprender a aprender será a habilidade-chave para acompanhar as mudanças tecnológicas, devemos todos ser life long learners”, defende, mais uma vez alinhada aos resultados do relatório “Futuro do Trabalho 2025”. Entre as habilidades mais desejadas, as cinco primeiras são o pensamento analítico; a resiliência, flexibilidade e agilidade; a liderança e influência social; o pensamento criativo; e a motivação e autoconhecimento.

“Além disso, viajar, ler, ter interesses por temas que saem de nosso dia a dia nos ajuda a ter algo muito valioso que é o repertório. Com ele podemos ampliar o potencial da IA e usá-la para melhorar nossa performance e resultados”, defende Vivian.

Adaptação

O avanço tecnológico, a automação e a popularização das ferramentas de Inteligência Artificial (IA) são alguns dos elementos a compor um momento de transição no mercado de trabalho. Nesse cenário, a criação e a substituição de empregos devido a essas novas tendências tem potencial para afetar 22% dos empregos formais atuais, com a criação de 170 milhões de novos postos de trabalho (14% dos empregos atuais) e substituição de 92 milhões dos empregos atuais (8%), resultando em um crescimento de 78 milhões de empregos até 2030 (7% dos empregos atuais).

Em outras palavras, é provável que muitos estudantes e trabalhadores estejam se preparando, hoje, para profissões que nem sequer conhecemos ainda. Nesse sentido, o estudo identifica sobretudo que uma série de empregos tecnológicos está em crescimento acelerado, como especialistas em big data e na própria IA. Por outro lado, funções administrativos, secretariais e operacionais são apontadas como aquelas com mais acentuada tendência pela substituição de tecnologias digitais.

“Estamos vivendo a transformação digital ao vivo. Neste sentido, todos nós – sejam crianças, jovens ou adultos – estamos tendo a oportunidade de aprender a surfar a onda ao mesmo tempo. Essas transformações impactam o mercado de agora e ainda não sabemos ao certo quais serão as transformações em médio prazo”, comenta a consultora e doutora em tendências Suzana Cohen.

“Se olharmos para as profissões em declínio no relatório, veremos que a maior parte delas é impactada pela a automação de processos. E esse tipo de impacto, relacionado com a automação, não é nenhuma novidade. O ideal, portanto, é analisar a raiz do declínio e compreender quais os aspectos de mudanças. Designers gráficos, por exemplo, estão em declínio ou a profissão setá passando por transformações? E quais as profissões com promessas longevas? São essas as melhores apostas”, analisa a estudiosa, defendendo que os currículos das faculdades, universidades e escolas devem ser adaptados, prevendo investimento naquilo que tem indicativo de ser, de fato, uma tendência.

“Precisamos saber comandar a máquina para que não sejamos dominados por ela. Precisamos preparar os alunos para saberem dar os comandos corretos, ter capacidade para julgar e avaliar, saber extrair e interpretar dados, saber elaborar as perguntas, para que se obtenha as melhores soluções, cruzar informações. Quem souber orquestrar melhor a AI levará vantagem”, finaliza.