Estética

Arrependidos: mais pessoas buscam reverter harmonização facial

Para profissionais, banalização do procedimento fez aumentar o número de queixas


Publicado em 12 de agosto de 2021 | 03:00
 
 
 
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O que era para ser motivo de alegria e contentamento se torna um pesadelo em que expectativas são frustradas, e a autoestima, abalada. É assim que se sentem as pessoas vítimas de procedimentos malsucedidos de harmonização facial, que se veem representadas pelo sertanejo Lucas Lucco. No ano passado, em entrevista ao “Fantástico”, da Rede Globo, ele relatou ter se sentido angustiado após a intervenção estética. “Você se olha e simplesmente não consegue enxergar mais seus traços. Isso é muito ruim”, comentou. Hoje, por causa dessas transformações, o cantor diz evitar as fotos do próprio noivado. 

Insatisfeito, Lucco foi atrás de profissionais que fossem capazes de reverter da harmonização. Um caminho que vem sendo trilhado por um número cada vez maior de pessoas. É o que observa a cirurgiã plástica Cíntia Mundin, membro titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP). “Esse fato se deve à banalização desse procedimento tão sério, que vem sendo realizado indiscriminadamente por profissionais não médicos que não têm formação adequada nem noção estética apurada. Com isso aumentou muito o número de intercorrências e principalmente o número de maus resultados”, critica, em alusão à autorização para que profissionais da odontologia possam realizar a intervenção. 

Ocorre que, desde 2016, graças a uma resolução do Conselho Federal de Odontologia (CFO), dentistas podem aplicar toxina botulínica, o botox, e outros preenchedores faciais em procedimentos estéticos desde que seja na área anatômica que vai do osso hioide, na base da garganta, até o ponto násio, no nariz. Desde 2019, exigindo que os profissionais realizem um curso com carga horária de 500 horas, a entidade passou a reconhecer a harmonização orofacial como especialidade odontológica. A decisão foi questionada na Justiça pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), que pediu a suspensão da resolução. Mas a liminar foi indeferida. 

Cíntia indica que, na maioria das vezes, as pessoas descontentes com o tratamento dizem ficar parecendo “caricaturas de si mesmas”, o que gera insatisfação e um consequente aumento pela procura da reversão do procedimento. 

A dermatologista Hellisse Bastos acrescenta que, na maioria das vezes, o exagero está por trás dos dissabores experimentados por pacientes inconformados com os resultados da harmonização. “É uma intervenção que cai muito bem em peles com sinais de envelhecimento. Porém, o que vemos não é essa estética sendo usada como prevenção ou melhoramento, como seria o ideal”, pondera, informando que pacientes cada vez mais jovens têm recorrido ao expediente, que está “transformando seus rostos, o que contribui para a (sensação de) perda de identidade”, diz. 

Síndrome da face superpreenchida 

O biomédico Gabriel Magalhães, especializado em estética avançada, relata que, de tão comuns, as queixas sobre a harmonização facial malsucedida ganharam nome próprio. Ele expõe que, na maior parte dos casos, a insatisfação está relacionada ao aspecto de inchaço que alguns procedimentos causam, minimizando os traços e dando menos naturalidade para o resultado. Essa condição tem sido chamada de “síndrome da face superpreenchida”, ou “overfilled syndrome”, em inglês. “É a famosa cara de boneco que todos temem”, detalha o profissional. 

“Nesses casos, as causas podem ser manipulação inadequada do produto, retoques com uma frequência maior que a necessária ou mesmo a aplicação de ácido hialurônico em excesso”, aponta. 

Reversão 

“Desde que tenha sido usado ácido hialurônico de boa qualidade, é possível a utilização de uma enzima reversora do produto, que se chama ‘hialuronidase’. E isso pode ser feito a qualquer momento”, observa Cíntia Mundin. Ela detalha que o preço e a quantidade de sessões necessárias para desfazer a intervenção dependem da extensão dos danos. “Muitas vezes pode custar mais caro do que a própria harmonização”, sinaliza. 

A cirurgiã plástica adverte que a ação não é sem riscos. Isso porque o corpo humano já produz, naturalmente, o ácido hialurônico, de forma que, durante o processo de reversão, existe o risco de a enzima destruir a substância própria da pessoa, além daquela que foi injetada, levando a deformidades e afinamento da pele. “Até para desfazer a harmonização facial, o médico tem que ter treinamento específico para não sequelar o paciente”, indica. 

Reverter a harmonização é mais difícil no caso do uso de produtos que não são absorvíveis e que não respondem à enzima hialuronidase, como o ácido hialurônico de qualidade duvidosa e a PMMA, uma substância sintética liberada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para casos de lipodistrofia em pessoas com HIV/AIDS, mas que, aplicada inadvertidamente, pode causar complicações em qualquer etapa da vida. Nesses casos, intervenções cirúrgicas são necessárias para desfazer as mudanças.  

Portanto, se o sujeito optar pela harmonização, “além de pesquisar um médico capacitado e a forma como trabalha, respeitando traços, é preciso estar atento ao material utilizado”, alerta Hellisse Bastos. 

No mesmo sentido, aos que decidiram realizar o procedimento, como forma de evitar possíveis arrependimentos, Gabriel Magalhães aconselha: “Busque especialistas capacitados e que tenham o mesmo senso de estética que você, de forma que será mais fácil encontrar o equilíbrio entre as expectativas e os limites impostos por quem vai realizar a intervenção”.

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