Erotismo

Fantasias muito além das quatro paredes

“Muitos casais gostam de usar a criatividade como fator-surpresa no encontro sexual, diz terapeuta sexual


Publicado em 30 de outubro de 2020 | 03:00
 
 
 
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Em uma carruagem, durante uma longa viagem em uma estrada erma, a cena de sexo entre Emma Bovary e Léon é, certamente, uma das mais famosas da história da literatura. Não deixa de ser curioso que o máximo de nudez presente nessa passagem do romance “Madame Bovary” (1857), do escritor francês Gustave Flaubert, é a “mão nua” que, “no meio do dia, em pleno campo”, desliza sob a cortininha amarela do coche. Sutil, é detalhe que escapa aos leitores menos atentos o fato de o trecho – em que a protagonista se entrega a um segundo amante – trazer à tona uma fantasia sexual um tanto comum ainda nos dias de hoje: são fartos os relatos daqueles que fantasiam transar ou que já chegaram ao ato dentro de um veículo e/ou em um lugar isolado e esvaziado, como no meio de uma estrada. 

“Esses são, sem dúvida, os locais que mais aparecem como desejados pelos casais”, comenta a psicóloga e terapeuta sexual da clínica Sexestima Graziela Chantal, confirmando que Flaubert acerta em cheio ao trazer para a discreta cena os lugares mais habitualmente eleitos como palcos do prazer nas fantasias eróticas. Mas, claro, o desejante imaginário das pessoas não está circunscrito a tais elementos. Em uma ronda rápida pelo centro da capital mineira, a reportagem ouviu sobre outras diversas possibilidades. Para ficar em alguns exemplos, praias, piscinas, banheiros de bares e até elevadores foram citados por entrevistados. 

“Muitos casais gostam de usar a criatividade como fator-surpresa no encontro sexual. Por isso, o lugar pode ser um fator para a qualidade do sexo. Afinal, as fantasias fazem parte do encontro sexual”, comenta Graziela. Ela observa que lugares diferentes propiciam maior tensão sexual “por estarem ligados ao imaginário do proibido e por significar uma quebra da rotina”, assinala. Então, ao propor um novo espaço para a transa, uma série de mecanismos que podem aumentar a excitação são ativados. 

A terapeuta sexual adverte que riscos devem ser avaliados a fim de evitar que o que era para ser um momento de prazer se torne um problema. “Não podemos nos deixar dominar pelo impulso sexual”, alerta. “Se as pessoas estão a fim, a primeira regra é não deixar de ter o encontro sexual e usar a criatividade para trazer a novidade na relação, mas de forma controlada”, situa. 

Atenção aos riscos é essencial para uma boa experiência 

A atenção a segurança dos espaços é essencial para que se evite contratempos. No caso do sexo em banheiros, a louça de um lavabo ou da bacia sanitária pode não suportar o peso do corpo e, ao se quebrar, causar ferimentos. “As pessoas devem estar atentas a esses perigos e evitar se expor em locais em que não estão familiarizadas. Como vai ter certeza, por exemplo, que a pia de um motel é segura?”, questiona Graziela Chantal. 

No caso de praias, cachoeiras e piscinas, os riscos também são grandes, e a transa pode se tornar apenas desconfortável – e nada prazeroso. “A água pode conter bactérias e outros germes que, na penetração, podem ser empurradas para dentro do canal vaginal e para o corpo”, explica a psicóloga. Além disso, diferentemente do que fazem crer as erotizadas  cenas em ambientes aquáticos, vale ressaltar que a água retira o lubrificante natural do corpo e acaba ressecando os órgãos sexuais. Essa falta de lubrificação pode gerar um atrito maior, o que pode reverberar em machucados nos genitais e causar prejuízos em relação ao uso de preservativos. Para saciar esse desejo, a solução é apostar no sexo sem penetração, sugere ela. 

Por fim, se a fantasia é se deleitar dentro de um veículo, outros riscos devem ser examinados. Neste caso, lembre-se como, mesmo discreta, a cena descrita por Gustave Flaubert e citada no parágrafo que abre esta reportagem ficou vastamente conhecida. Detalhe que a história é de um tempo em que as cartas eram o suprassumo das tecnologias de comunicação – o aparelho de telefone só seria criado 13 anos depois de “Madame Bovary” ser publicada pela primeira vez. Dito isso, não é difícil imaginar como a prática pode ter se tornado ainda mais perigosa em tempos em que smartphones a tudo registram.

“Muitos se sentem seguros dentro de um carro, mas se esquecem que há câmeras de segurança que podem registrar o ato, que pessoas, com celulares, podem fazer cliques. E, se isso vai para a internet, pode gerar danos para a pessoa que for flagrada nesse momento”, pontua Graziela. Sem contar que, segundo o artigo 233 do Código Penal Brasileiro, praticar ato obsceno em local público, aberto ou exposto ao público é crime. A pena é de três meses a um ano de detenção ou o pagamento de uma multa. “Se o desejo é fazer sexo dentro do carro, uma alternativa é deixar o carro na garagem, um ambiente em que você controla e domina”, sinaliza a terapeuta sexual. 

Pequenas mudanças. A psicóloga Graziela Chantal lembra que mudar de cômodo já pode ser algo funcional, trazendo uma melhora para a qualidade do sexo. “Corre o risco de cair na rotina o casal que está há muito tempo junto e faz só do quarto o lugar do jogo sexual. Até os movimentos podem ficar repetitivos. Neste caso, ir para outro cômodo, explorando os espaços da casa, é algo que já pode trazer uma surpresa e ativar a criatividade”, avalia.

Parafilia. A terapeuta sexual explica que é preciso diferenciar uma simples fantasia de um transtorno parafílico, que ocorre quando o sujeito elege um objeto ou prática e só se excita dentro de um comportamento muito estrito.

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