Rodrigo Vilela, presidente da Samarco, é o entrevistado de hoje na Temporada Minas S/A Governança nas plataformas de O TEMPO.

Nascida em Mariana (MG), a Samarco completa no dia 24, 48 anos.

Engenheiro metalúrgico com mais de 30 anos de experiência na mineração, Rodrigo assumiu a presidência da Samarco há sete anos.

A Samarco é uma empresa de capital fechado que pertence à Vale e à BHP Brasil.

Com sede em Belo Horizonte, tem unidades em Minas Gerais e Espírito Santo com estrutura da mina ao porto.

Em 2028, o objetivo é alcançar a capacidade máxima de produção de 27 milhões de toneladas de pelotas e finos de minério de ferro.

O executivo comanda o pagamento das indenizações individuais pelo rompimento da barragem de Fundão, em 2015, recuperação da Bacia do Rio Doce e reassentamento das famílias no Novo Bento Rodrigues e Paracatu, e o fim da recuperação judicial da empresa.

A Samarco pertence à Vale e à BHP Brasil. A Samarco tem uma estrutura integrada com logística própria, da mina ao porto. Como estão as unidades operacionais da Samarco?

A Samarco é uma empresa brasileira fundada em 1977 com um projeto inovador para tratar e processar minério de baixo teor. Antes de mais nada, a gente gostaria de reconhecer o impacto causado pelo rompimento da barragem de Fundão, que esse ano faz 10 anos. Mudou o rumo da nossa história, a gente lamenta muito o que ocorreu e internamente, a gente desenvolve todo o nosso processo e esforços para que eventos como esse jamais ocorram. A Samarco é uma joint-venture entre a Vale, maior produtora de minério brasileira; e a BHP, maior produtora mundial de minério. A gente tem uma produção totalmente independente e integrada da mina ao porto. A lavra é feita em Minas Gerais. O processo de transferência é via mineroduto, sem caminhão na estrada. Operamos um porto próprio, o Porto de Ubu, no Espírito Santo.

Como a Samarco tem contribuído para a descarbonização?

As pelotas serão o futuro do processo de mineração, principalmente, pelo processo de descarbonização. O nosso produto pode ser usado pelas siderurgias do mundo todo com uma emissão relativamente baixa se considerarmos os outros minérios. Uma tonelada de pelotas da Samarco emite 80% a menos do que um produto do competidor.

O projeto de operar com capacidade total de 27 milhões de toneladas em 2028 está mantido?

Fizemos um processo de retomada gradual iniciado com 26% da capacidade instalada, que priorizou a segurança da retomada sem barragem de rejeitos. A operação com 60% da capacidade esperamos cumprir a partir deste ano e 100% a partir de 2028. Já temos, inclusive, as licenças para essa implementação.

A retomada da produção tem novas tecnologias, monitoramento 24 horas, o processo de descaracterização da barragem do Germano termina mesmo em 2028?

Nossa licença operacional corretiva considera: operar sem barragem de rejeito e fazer a descaracterização. Existiam duas barragens de alteamento a montante naquela época na Samarco (a cava do Germano e a barragem do Germano). A barragem do Germano, inclusive, foi a maior barragem de alteamento da América do Sul. A cava foi descaracterizada em 2023 e a barragem será terminada no ano que vem com uma antecipação de dois anos, o que demonstra o foco estratégico da empresa com investimento de R$ 3,5 bilhões para garantir a segurança na retomada.

Além do trabalho de retomar a capacidade total de produção da Samarco, tem o desafio de concluir os reassentamentos do Novo Bento Rodrigues e de Paracatu, finalizar as indenizações individuais aos atingidos e reparar a Bacia do Rio Doce impactada pelo rompimento da Barragem de Fundão. Como você está comandando todas essas frentes? Em qual estágio de resolução estão essas ações da Samarco?

Desde novembro do ano passado, a Samarco assumiu integralmente a responsabilidade por todas essas atividades. Até então, elas estavam com a Fundação Renova, que foi criada em 2016 para fazer frente a todo o processo de reparação. Com a repactuação, a Samarco assume e, com isso, essa obrigação de fazer as indenizações, terminar todos os reassentamentos e todo o projeto ambiental. Além das obrigações de pagar, que também são um compromisso da empresa. O reassentamento foi entregue em julho. Depois da repactuação, foram definidas seis novas casas que ainda vão ser feitas. Os novos distritos foram entregues.

As famílias já estão morando lá.

Já tem escola, unidades de saúde, coleta de lixo, água e esgoto, campo de futebol. Tudo já está funcionando. É uma entrega relevante e emblemática. As indenizações também tiveram um avanço significativo depois da repactuação. As indenizações estavam muito dificultosas, em função de uma série de discussões judiciárias. A repactuação permite uma revisão de todo esse processo. Indenizaremos mais de 300 mil pessoas (o que significa mais de quatro vezes o tamanho da cidade de Mariana), além das pessoas já indenizadas até 2024. Então estamos bastante satisfeitos com esse alcance da indenização até agora, permitido em função do acordo firmado em novembro.

A gente sabe que não dá para mudar o passado, mas tem-se conseguido um equilíbrio no relacionamento entre os acionistas, conselho de administração, diretoria, stakeholders e órgãos de fiscalização para que as ações sejam feitas de forma transparente e que a Samarco possa fechar esse capítulo na história dela?

A gente lamenta muito; novembro de 2015 é um fato que nenhum de nós gostaria de ver. Todas as ações são pautadas no sentido de que eventos como esse nunca mais ocorram. A revisão gerencial e o legado que a gente espera deixar passa por uma revisão de nossos processos não somente para a Samarco, como para a mineração como um todo. Somos conscientes do impacto que nós causamos. Como integrar todos esses stakeholders é um grande desafio. Para isso, usamos um mantra na Samarco, que é a transparência e a humildade de poder aprender e escutar. Como foi importante e como foi doloroso a gente passar por um processo de retomada sendo supervisionados pelo Ministério Público, que foi um grande incentivador de mudança de processo. De 2018 até a nossa retomada, eu participava de reuniões mensais com o Ministério Público de Minas Gerais dando explicações e mostrando resultados de monitoramento e apresentando como seria o processo de retomada.

O acordo de reparação homologado com prazo de 20 anos de repasses vai garantir o usufruto de mais gerações de moradores não apenas concentrando os recursos numa única administração? 

Tenho convicção de que foi uma decisão acertada. Vivemos muitas críticas de que dilatar em 20 anos seria um prejuízo financeiro. Com certeza não. Investimentos estruturados e planejados no local durante 20 anos têm um poder de alavancagem infinito. Pode imaginar o que R$ 100 bilhões de maneira estruturada podem fazer com o Vale do Rio Doce? Serão 20 anos de investimentos que serão feitos, ininterruptos, e que permitem planejamento de longo prazo. Eu acredito muito na capacidade de transformação que o acordo de reparação pode trazer para todos.

A recuperação judicial da Samarco foi encerrada na semana passada. Foi a maior da história no Brasil. Como você conseguiu isso?

Fizemos um processo de reestruturação da nossa dívida, fizemos a priorização de pagamento dos nossos empregados, dos nossos fornecedores, tivemos um apoio integral, das pessoas, dos sindicatos, eles foram incríveis com a empresa, não cortaram crédito, não cortaram fornecimento. Com isso, criamos um processo de reestruturação, apresentamos aos credores, conseguimos uma negociação dessa repactuação de dívidas em 2023 e, na semana passada, o juiz autorizou a saída antecipada da recuperação judicial. Isso mostra que conseguimos preservar o valor social da empresa, conseguimos fazer os pagamentos das nossas despesas, dívidas e compromissos e conseguimos investir para que a empresa pudesse incrementar sua produção de 26% para 60% da capacidade e vamos conseguir investir para sair dos 60% para 100%.

O ano de 2025 é um ano emblemático para a Samarco?

Sim, nós saímos da recuperação judicial, assumimos o processo de reparação, entregamos o Novo Bento Rodrigues, fizemos as indenizações. Esse ano seremos o segundo maior exportador de pelotas novamente do Brasil, colocando a empresa num local de destaque e de muita responsabilidade e humildade porque ainda temos muito o que fazer.

O Porto de Ubu, no Espírito Santo, tem capacidade nominal de aproximadamente 12 mil toneladas por hora. A capacidade anual de embarque é de 33 milhões de toneladas. Essa deve ser a elevação total de produção da Samarco para projetos futuros ou também pode haver uma expansão do porto para suportar uma alta na produção?

Nosso porto é um ativo extremamente estratégico, com uma capacidade acima dos 30 milhões de toneladas, podendo inclusive ser expandido. Nós temos um porto extremamente estratégico para o Espírito Santo, para a Samarco. É claro que a Samarco está sempre buscando oportunidades de geração de valor. Mas hoje estamos focados na reparação e na retomada. É aquele foco feito em 2018 com a retomada gradual, com prazos estabelecidos. 

Com os pés no chão.

Inclusive esse é um dos nossos mantras, pés no chão, para a gente entregar a empresa com seus 27 milhões de toneladas ou utilizando 100% dos seus ativos, o que já é um grande avanço. Mas não tenha dúvida nenhuma de que o porto é um ativo extremamente especial para a Samarco, como é o mineroduto, que também é um ativo com um potencial, seja de expansão, seja na utilização de maior ou menor escala. Mas a Samarco tem como grande vantagem competitiva, além do seu produto que é de alta qualidade, o seu porto e o seu mineroduto.

A venda da Samarco é toda para o mercado externo?

Hoje a Samarco exporta praticamente 98% da sua produção. Por estratégia interna, definimos atender todos os continentes. A gente vende para a Europa, Ásia, Japão, esperamos atender as necessidades dos nossos clientes que buscam, além de preço, produtos que permitam a eles também ser competitivos e, com isso, vem a questão da descarbonização como um grande fator decisivo.

O produto da Samarco tem um apelo muito forte.

 A Samarco, apesar da paralisação de suas operações, manteve a grande fidelização dos seus clientes. Nossos clientes internacionais acreditam na empresa, no histórico, no legado que a empresa construiu ao longo dos anos, na qualidade e na capacidade de entrega. Imaginar o desafio que a empresa passou e continuar vendendo e ser querido pelos nossos clientes é muito importante.

É reconhecer a excelência do produto e a entrega do produto.

É um conjunto de fatores. A Samarco não entrega só commodity, não entrega só pelota. Entrega um produto que é reconhecido em todo o planeta. A Samarco tem dois produtos basicamente: um produto para alto-forno e um produto para redução direta. Cada um com seu nicho de mercado, cada um com seus desafios. A gente espera entregar o produto que eles necessitam para desenvolver seus processos.

Como estão as reservas da Samarco?

A Samarco tem recursos da ordem de 6 bilhões de toneladas. As nossas reservas estão na ordem de 1 bilhão de toneladas. A diferença de recurso e reserva está na capacidade de extração. Recurso é a geologia. A reserva é quanto você consegue extrair dessa geologia.