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BH investiga caso de síndrome rara associada à Covid-19 em duas crianças

Síndrome Inflamatória Multissistêmica Pediátrica pode surgir semanas depois da contaminação pelo coronavírus e atinge crianças e adolescentes

Qui, 13/08/20 - 18h04
Minas Gerais investiga seis casos da síndrome, mas Secretaria de Estado de Saúde não informa em quais cidades | Foto: Douglas Magno / AFP

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Passados cinco meses de pandemia, aspectos da Covid-19 permanecem um mistério. Um deles é a Síndrome Inflamatória Multissistêmica Pediátrica (MIS-C), uma rara inflamação que pode decorrer da contaminação pelo coronavírus e atinge apenas crianças e adolescentes. Em Belo Horizonte, de acordo com a prefeitura da capital, dois pacientes de 2 anos de idade estão sob avaliação médica — eles apresentaram sintomas da síndrome e, agora, os profissionais tentam entender a relação dos casos com a Covid-19.

Questionada pela reportagem, a prefeitura não informou se as crianças estão internadas ou quais exames estão sendo realizados, mas afirmou que o quadro de ambas evolui bem. Em Minas Gerais, são seis casos em investigação, segundo a Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG), distribuídos entre as regiões Central e Noroeste de Minas.

A síndrome levou pelo menos três crianças à morte neste ano, de acordo com o Ministério da Saúde, que, em julho, contabilizava 71 casos em pessoas com até 16 anos: 29 no Ceará; 22 no Rio de Janeiro; 18 no Pará e dois no Piauí. As mortes aconteceram no Rio, e casos em Minas ainda não aparecem no último boletim do ministério, divulgado no início de agosto. Ao menos 300 casos da síndrome foram relatados em todo o mundo, e a relação entre ela e a Covid-19 ainda não é clara para cientistas. Os pacientes costumam desenvolver sintomas até quatro semanas após a contaminação pelo coronavírus, havendo ou não apresentado sinais da Covid-19 anteriormente.   

Os sinais se confundem ao de outras doenças e incluem febre persistente, manchas no corpo e lesões nas mucosas, como olhos e boca, e apenas com exames de sangue médicos conseguem avaliar se o caso é inflamação generalizada. Outra pista são os testes de Covid-19, tanto o PCR, que detecta presença do vírus no organismo, quanto o sorológico, que indica se o paciente teve contato com o vírus anteriormente. 

O infectopediatra Marcelo Otsuka explica que ela não é um sintoma da Covid-19 ou uma sequela da doença, mas um resposta do corpo à infecção. “Para combater a infecção, o corpo desencadeia um quadro imunológico. Mas essa resposta do organismo pode atacar ele mesmo”, explica. Atendendo em São Paulo, ele próprio tratou um paciente com a síndrome, uma criança de 3 anos que, semanas antes, havia tido sintomas gripais. Os pais não chegaram a apresentar sintomas de Covid-19, porém um exame posterior da criança revelou que ela teve contato com o vírus.  

Doença se confunde com síndrome descoberta na década de 60

A lógica e os sintomas são parecidos aos da Síndrome de Kawasaki,doença rara conhecida desde a década de 60 pela ciência. Mas, segundo Otsuka, a MIS-C pode ser mais grave e, diferente da Kawasaki, atingir crianças acima dos 4 anos. A infectologista Andrea Lucchesi, do hospital infantil João Paulo II, em Belo Horizonte, relata que tem havido aumento dos casos similares à Síndrome de Kawasaki no hospital: foram 11, neste ano, e a instituição trabalha em um levantamento para precisar a variação em relação aos anos anteriores. 

Nesta quarta-feira (12), um dos pacientes, uma criança de 3 anos, teve alta após dez dias internada, conta a médica. “Têm sido casos graves, de pacientes internados, e vemos inflamações em maior número e em maior gravidade neste ano. Esse paciente não teve sintomas respiratórios iniciais da Covid-19, mas o exame para detectar o vírus teve resultado positivo, e o que chamou atenção para a síndrome foi o choque (diminuição da irrigação de sangue em tecidos do corpo)”, diz. 

As causas da Síndrome de Kawasaki também não estão totalmente esclarecidas pela ciência, mas ela tem tratamento. Para tratar a MIS-C, médicos utilizam estratégias similares, como uso de corticoides e imunoglobulina (anticorpos). 

Mini entrevista com Lilian Diniz, pediatra e professora da Faculdade de Medicina de Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)

Como identificar os sinais da Síndrome Inflamatória Multissistêmica Pediátrica?

É preciso haver alteração nos exames laboratoriais, porque sintomas como febre e manchas no corpo podem ser várias outras coisas, como dengue e catapora. O alerta é que os pais fiquem atentos a crianças com febre de mais de três dias, associada, por exemplo, a lesões na pele e na mucosa. Também é importante saber se ela teve Covid-19 ou contato com quem tenha tido no último mês. 

Todos os casos da síndrome são graves?

Aqui, nós ainda tivemos poucos casos e nem todos foram graves. Nem todas as crianças precisam ser internadas, mas acompanhas por um pediatra. Eu tratei crianças que tiveram sintomas variados, de 1 a 5 anos. 

Que exames precisam ser feitos para detectar a síndrome?

São exames de sangue que mostram que há uma inflamação importante no corpo. Isso pode ter sido tardiamente desencadeado pela Covid-19 ou ser outra coisa. Por isso, o diagnóstico precisa se aliar à avaliação clínica e ao histórico de contato da criança com pessoas contaminadas.

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