Charme

Cobogó: elementos vazados trazem ar retrô a ambientes e garantem ventilação

'Tenho uma grande admiração pela forma com o cobogó reage à incidência da iluminação solar com uma sombra belíssima para compor o espaço', diz a arquiteta Barbara Marins

Por Da Redação
Publicado em 14 de julho de 2019 | 03:00
 
 
Acima, ambiente montado com a linha Rizoma, de Guto Requena, inspirada no universo da botânica Foto: CasaCor/Divulgação

Coimbra, Boeckmann, Góis. Somadas, as iniciais dos sobrenomes de três engenheiros radicados em Recife (PE) – Amadeu, Ernest August e Antonio, respectivamente – passaram a designar uma peça que, surgida nos anos 20, logo se popularizou no Brasil: o cobogó. E embora ainda seja restrito o contingente de pessoas que de pronto consiga atrelar o nome ao objeto, todo mundo, de alguma forma, retém, na memória afetiva, a imagem de alguma construção no qual o elemento vazado – feito de cerâmica ou cimento – aparece como parte fundamental. Mas, na verdade, nem é preciso recorrer ao passado: já há alguns anos, o cobogó voltou a marcar presença em projetos tão cool quanto arrojados. “Eles estão em alta tanto por sua concepção principal – de proporcionar ventilação – como pela estética. Os cobogós imprimem graça aos projetos e, ao mesmo tempo, não bloqueiam a visão dos ambientes”, pontua Barbara Marins, arquiteta do Estúdio Uvva. Não só. A função de dividir ambientes também é citada. A arquiteta Luiza Dornelas, da Inversa – Arq Decor, acrescenta ainda uma outra função citada pelo colega Marcio Kogan, autor da Casa Cobogó (SP). “Ele observou que, quando a luz passa pelo cobogó, produz sombras ao longo do dia, ou seja, a casa ganha desenhos formados pela luz que passa por eles”.

Barbara Marins acredita que a inserção crescente do cobogó na decoração ultrapassa um movimento de resgate. “Trata-se de uma evolução do cobogó. Na arquitetura e na decoração, ele sempre esteve presente. Todavia, nos últimos dez anos, foi valorizado ainda mais. Assim como a indústria da moda vai se reinventando, a arquitetura também segue esse conceito. Percebo que estamos revivendo o antigo com itens que estiveram em alta em outras décadas. É como um resgate da beleza, uma continuidade com um olhar apurado de aceitação”, acrescenta.

Luiza Dornelas adiciona que a arquitetura, hoje, não é mais aquela fechada, fragmentada, seccionada. “A tendência é que fique cada vez mais integrada, e o cobogó é um elemento que pode ser usado para dividir o ambiente sem necessariamente interrompê-lo, o que o faz tão interessante e incrível, tanto na arquitetura, em fachadas, quanto em interiores”.

História

Se o cobogó surgiu no Nordeste, a inspiração, lembra Luiza Dornelas, veio da arquitetura árabe. “Foi inspirado no muxarabi, elemento feito com treliças. Como ele é vazado – tem microburaquinhos –, quem está por dentro da edificação consegue ver o que está lá fora, mas o contrário não acontece, para dar a privacidade às mulheres, que não podiam ser vistas”.

Barbara relembra que o cobogó nasceu de “uma forma mais bruta, de cimento e concreto”. “Com o tempo, a indústria foi aprimorando a peça de acordo com as demandas e tendências indicadas pela arquiteta. Hoje, o mercado dispõe de uma infinidade de opções em materiais como argila e cerâmica. Os de cimento foram reinventados e há modelos variados. Já os de cerâmica, vemos numa infinidade de cores – como cinza, mostarda e rosa – além das tradicionais”.

No caso de edificações históricas, Luiza cita o Pavilhão Brasileiro projetado por Lúcio Costa e Oscar Niemeyer para a Feira Mundial de 1939, situado no Queens, em NY. “Ou o Parque Eduardo Guinle (em Laranjeiras, Rio de Janeiro), que é um conjunto habitacional de prédios horizontalizados. A fachada é praticamente toda composta por cobogós”, cita. Em BH, edifícios históricos, como o Pilar, no Centro, ou o Mercado Novo, ostentam cobogós. Ou casas estilosas, como o Birosca S2, bistrô localizado no bairro de Santa Tereza. “A casa sempre teve piano, e o som sai na varanda. Então, colocamos para limitar a estrutura e, ainda, por questões acústicas”, diz a chef Bruna Martins.

História

Presença

Em 2020, Brasília completa 60 anos de fundação. A capital federal abriga vários edifícios que incluem os cobogós em seu projeto arquitetônico, a exemplo de seu primeiro prédio residencial, o Bloco D da 106 Sul.

Niemeyer

Os cobogós tornaram-se queridinhos de Oscar Niemeyer, como atesta a fachada do Edifício Eiffel (1956), situado no centro de São Paulo. Aliás, foi o primeiro prédio de projeto de luxo do arquiteto.

Saiba mais

Variações

Em alguns pontos do Nordeste, onde o cobogó nasceu, o nome sofreu algumas variações, como combobó, combogó, comogó, comongol, comogol e comungó.

Memória

Em 2013, foi lançado o livro “Cobogó de Pernambuco”, de autoria de Cristiano Borba, Josivan Rodrigues e Antenor Vieira. Os autores propuseram um inventário visual da utilização do elemento naquele Estado, embasado por vasta pesquisa teórica e documental. A primeira edição está esgotada.