Com adeptos e críticos igualmente fervorosos, a astrologia é um tema que divide opiniões. Enquanto alguns acreditam firmemente em seu poder preditivo e na influência dos astros sobre comportamentos humanos, outros a consideram uma mera pseudociência, baseada em suposições infundadas e, por isso, uma crendice nociva ao bem comum.

Nesta reportagem, enumeramos alguns mitos da astrologia, analisamos o que realmente parece funcionar e questionamos se existe alguma relação entre astrologia e autoconhecimento. Para isso, ouvimos o astrólogo e tarólogo Flávio Campos Christo, defensor da validade dessa doutrina milenar, e o doutor em psicologia social Cláudio Paixão Anastácio de Paula, crítico da prática.

O que é astrologia?

A astrologia é um controverso sistema que visa estabelecer uma correlação entre a posição dos astros no momento do nascimento de uma pessoa e características de sua personalidade, tendências comportamentais e até mesmo eventos futuros em sua vida. E, embora seja praticada há milênios em diferentes culturas ao redor do mundo, trata-se de uma doutrina que carece de evidências científicas que comprovem sua credibilidade.

Não por outro motivo, Flávio Christo reconhece que a prática pode ser, sim, considerada uma pseudociência. Apesar disso, ele diz que existem motivos que sustentam sua relevância. “O tradicionalismo histórico, por exemplo, traz informações que coincidem com observações empíricas, como a pesquisa de Michael Gauquelin sobre correlações entre mapas astrológicos e profissões”, argumenta ao mesmo tempo que admite que a amostragem usada nesses estudos é considerada insuficiente do ponto de vista científico. Christo ainda completa que a astronomia, o estudo científico dos corpos celestes, confirmou influências importantes e cíclicas no âmbito físico e comportamental da natureza, incluindo plantas e animais. “Essas questões suscitam dúvidas sobre a capacidade de esses corpos celestes influenciarem também psicologicamente os seres humanos. No entanto, é um assunto de difícil comprovação prática”, pontua.

Cláudio Paixão Anastácio de Paula concorda que a astrologia não pode ser considerada uma ciência por não possuir fundamentos sólidos baseados em evidências científicas. Ele lembra que as alegações de influência dos astros na vida das pessoas também carecem de embasamento, além de citar que estudos sobre a astrologia são frequentemente contraditórios e não oferecem resultados conclusivos. Por fim, o psicólogo cita que o apelo ao simbolismo e ao conceito filosófico de sincronicidade utilizados para justificar a astrologia não possuem validade à luz da ciência.

Mitos da astrologia

Existem vários mitos associados à astrologia que contribuem para sua reputação controversa. Um dos principais mitos é que as posições dos astros no momento do nascimento têm uma influência direta sobre o destino e a personalidade de um indivíduo. No entanto, essa afirmação carece de evidências científicas sólidas. Outro mito é a ideia de que os horóscopos genéricos, baseados apenas no signo solar, podem fornecer insights precisos sobre a personalidade de alguém ou prever eventos futuros. Na realidade, a personalidade é moldada por uma variedade de fatores complexos, como a genética, o ambiente e as experiências de vida, e não pode ser reduzida apenas a um signo zodiacal.

Pensando nisso, Flávio Christo admite que, como qualquer estudo que envolva subjetividade, a astrologia pode ser prejudicial se não for compreendido corretamente. Ele alerta que essa prática esotérica não deve limitar o indivíduo a uma crença determinista, mas ensinar a diversidade de possibilidades na vida, e adverte que estigmatizar as características atribuídas aos signos é uma simplificação equivocada. Para o astrólogo, é crucial entender que as pessoas mudam e que os signos podem ser aliados para impulsionar objetivos, caso sejam usados com sabedoria.

O que funciona na astrologia?

Embora muitos aspectos da astrologia sejam contestados, há elementos que têm certo respaldo. Um deles seria a capacidade da astrologia de fornecer uma linguagem simbólica que pode ajudar as pessoas a refletir sobre elas mesmas e a compreender melhor suas emoções, desejos e padrões comportamentais. Nesse sentido, seus defensores argumentam que a interpretação dos símbolos astrológicos pode servir como uma ferramenta de autoconhecimento e desenvolvimento pessoal. É o que defende Flávio Christo. “A mitologia associada à astrologia contém símbolos que proporcionam valiosas lições para entender o comportamento humano e a própria natureza, do ponto de vista filosófico”, comenta, citando que teóricos como Sigmund Freud e Carl Jung utilizaram mitologias para enriquecer suas análises – e lembrando que Jung também era astrólogo. 

Além disso, algumas pessoas relatam que as consultas astrológicas foram um bom suporte para a obtenção de uma perspectiva diferente sobre seus desafios, possibilitando que encontrassem soluções criativas para os problemas que enfrentavam. Em contrapartida, isso pode ser atribuído em parte ao efeito placebo e à habilidade do astrólogo em fornecer insights e sugerir reflexões, afinal, não há evidências científicas sólidas de que a astrologia possa prever eventos futuros.

Por sua vez, Cláudio Paixão Anastácio de Paula rechaça que esse sistema de crenças seja um instrumento para o autoconhecimento. Destacando que oferecer conselhos não é o mesmo que oferecer conhecimento e que essa doutrina é mais determinista do que outras práticas esotéricas, como o tarô, o psicólogo sublinha que “as pessoas tendem a buscar respostas específicas e conformar seus desejos através da astrologia, em vez de realmente se conhecerem”. “Portanto, a astrologia não é um caminho efetivo para o autoconhecimento”, conclui.

O psicólogo considera a astrologia nociva em qualquer contexto. Ele lista dois principais motivos para isso: primeiro, as pessoas a usam como desculpa para atribuir culpa a outros e evitar responsabilidades próprias, o que leva a comportamentos de culpar os outros e justificar falhas com base nos signos astrológicos; o segundo motivo é que temos tendência a filtrar informações de acordo com nossas crenças preexistentes.

Anastácio de Paula complementa que, por ser popular e difundida, a astrologia pode ainda abrir portas para aceitação de pseudociências e ideias falsas, uma vez que, segundo ele, acreditar que nosso destino é controlado por forças astrológicas facilita a absorção de conceitos sem embasamento científico. “É importante desmistificar a astrologia desde cedo, para evitar a propagação de ideias falsas e perniciosas”, crava.