Diante do menor desconforto nas costas, é comum o hábito de pedir que alguém nos ajude a “colocar a vértebra no lugar”. Então, como em um passe de mágica, o simples som do estalar da coluna parece, por si, causar em nós uma prazerosa sensação de relaxamento e redução da tensão muscular. Agora, com a promessa de ser um instrumento que garante maior autonomia na busca por bem-estar, viralizam nas redes sociais – notadamente no TikTok – vídeos com tutoriais que ensinam o passo a passo de como estalar, sozinho, as próprias costas. Mas será que essa prática é mesmo benéfica? E será que aqueles estalinhos realmente indicam que a coluna está voltando ao eixo? 

Contrariando aqueles que juram sentir outra disposição após a aplicação da técnica, o médico ortopedista Daniel Oliveira, especializado em coluna vertebral e diretor do Núcleo de Ortopedia e Traumatologia de Belo Horizonte (NOT), explica que, por trás disso, como em todo passe de mágica, se descortina um truque. 

“Na verdade, o barulho causado pelo estalar da coluna, ao contrário do que muita gente pensa, não significa necessariamente que a coluna foi ‘colocada no lugar’ nem quer dizer que algum problema esteja sendo resolvido”, pontua. “Pelo contrário, um movimento de torção muito intenso, com o corpo despreparado para tal, pode, na verdade, causar complicações, até mesmo favorecendo a formação de lesões mais graves, como hérnia de disco, se feito recorrentemente e de forma inadequada”, alerta. 

Oliveira lembra que o sistema musculoesquelético é complexo e todo interligado, de forma que quaisquer dores nas costas, principalmente persistentes, devem ser avaliadas individualmente. “Às vezes, a pessoa acha que vai estalar e aliviar uma dor, quando, na verdade, não está ajudando em nada a resolver o problema de fato”, adverte, reconhecendo que, em geral, o ato não é um problema, mas, se for feito com muita força, pressão ou frequência, esse movimento pode causar desgastes, dor ou problemas mais severos, como as hérnias de disco. 

O ortopedista ainda ressalta que pacientes que estejam se recuperando de alguma lesão ou dor ou que sofram de algumas patologias, tais como anomalias na coluna ou no pescoço e osteoporose em grau avançado, devem evitar o hábito ilusoriamente relaxante de estalar a coluna. “O ideal – que é o que sempre falo com meus pacientes – é praticar alongamentos: eles são fundamentais para melhorar a qualidade de vida e a postura e evitar lesões. E, é claro, praticar atividades físicas regularmente, inclusive aquelas responsáveis pelo fortalecimento do core (conjunto da musculatura que fica na região central do nosso corpo, responsável por estabelecer todo equilíbrio e centro gravitacional), e ter uma dieta equilibrada”, conclui. 

No mesmo sentido, o fisioterapeuta Cristóvão Oliveira, fundador do Centro de Reabilitação C.O., reforça a importância do tão negligenciado alongamento para a saúde do corpo. “O estiramento das fibras musculares (famoso estica e puxa) ajuda a preparar o corpo para outras atividades físicas, prevenindo lesões e liberando possíveis tensões”, detalha. 

Comumente desprezadas nas academias de musculação, as sessões de alongamento são tão importantes quanto os treinos de força e aeróbios, garante o especialista. “O corpo precisa estar apto para diversos aspectos da vida. Ou seja, nós precisamos de força, agilidade, flexibilidade e mobilidade em equilíbrio para fazer nossos esportes preferidos e até para executar as tarefas mais corriqueiras, como se abaixar para pegar um objeto”, diz. 

“Dessa maneira, se os nossos músculos não forem alongados frequentemente, há um grande risco de ocorrer enfraquecimento e até mesmo ruptura deles. O alongamento é importante porque trabalha a flexibilidade muscular e articular, melhorando a amplitude dos movimentos corporais”, informa o fisioterapeuta. 

Contraindicações. Cristóvão Oliveira pondera que o alongamento, embora seja benéfico para a maior parte da população, não é indicado para casos de bloqueio ósseo, fratura recente, inflamação ou infecção nas partes do corpo envolvidas, presença de dor aguda ou mal-estar, integridade óssea, articular ou vascular comprometida, presença de hematomas ou traumatismos teciduais. 

Quando fazer. Já Eduardo Netto, diretor técnico da Bodytech Company, informa que os alongamentos podem ser utilizados durante a sessão de treino, desde que suavemente, sem o objetivo de ganhar amplitude, e após o treino, quando o objetivo for relaxar e recuperar. “E, no caso do objetivo de ganhar amplitude, deve-se realizar sessões diferentes. Ou até mesmo, por exemplo, quando o treino for de ênfase em membros inferiores, a pessoa focar a flexibilidade dos membros superiores, e vice-versa”, sugere. 

Dor. Netto comenta ser normal sentir um leve desconforto para que realmente os fusos musculares relaxem a musculatura. “A flexibilidade é conquistada pelo tempo de sustentação, e não pela intensidade”, diz. 

Como aliviar o desconforto nas costas no dia a dia? 

Sabendo que, diante de uma dor nas costas, as técnicas de estalar a coluna pouco adiantam, a reportagem pediu ao ortopedista Daniel Oliveira que listasse estratégias mais efetivas para o alívio desse desconforto. Lembrando que tudo vai depender da intensidade e da gravidade e que é importante procurar ajuda profissional para identificar o que está causando o transtorno, ele listou algumas estratégias mais resolutivas para o enfrentamento da questão. 

- Em casos de lesões, podem ser usadas compressas de gelo imediatamente e nos primeiros dias, para conter a inflamação, por cerca de 20 minutos no local para aliviar a dor e anestesiar os nervos da área afetada, reduzindo o inchaço. 

- As compressas quentes devem ser realizadas em casos crônicos ou após 48 horas da lesão, pois o calor acalma e relaxa os músculos doloridos e aumenta o fluxo sanguíneo, o que ajuda o processo de cicatrização. 

- Massagens também são úteis por relaxar a musculatura e liberar endorfinas que aliviam a dor. As sessões de massagem profissionais são as mais indicadas. 

- O repouso relativo também é indicado. Ao contrário que muita gente pensa, o repouso completo, na cama, é contraindicado, pois pode causar dores maiores ainda. A melhor forma de curar um músculo machucado é tentar se manter em movimento, para não atrofiar o músculo durante a lesão. 

- Prática de atividades físicas constantes e de fortalecimento de core, alimentação saudável, momentos de prazer, intervalos regulares durante a atividade física de longa duração, além da ginástica laboral, realizada no trabalho ou em espaços físicos na empresa, com exercícios de curta duração e envolvendo técnicas de alongamento da cabeça, tronco, membros superiores e inferiores, além de respiração, também são bem-vindos. 

- É fundamental evitar alguns hábitos, tais como o tabagismo, obesidade, estresse e postura incorreta. 

- Já os exercícios de alongamentos ajudam a relaxar a musculatura e, principalmente, evitam que os músculos fiquem muito rígidos, causando ainda mais dor. Vale ressaltar que é necessário cuidado para não se exceder e machucar ainda mais os músculos.