Na semana passada, a revista científica Current Biology publicou um estudo que repercutiu nos portais brasileiros e internacionais. O levantamento, realizado por pesquisadores da Universidade Pitié-Salpêtrière de Paris, aponta que o trabalho cognitivo intenso e prolongado, por volta de quatro a cinco horas, pode ser prejudicial ao cérebro, alterando a capacidade do indivíduo de tomar decisões e reagir a situações mais simples.

O experimento foi feito da seguinte maneira: os cientistas avaliaram dois grupos, um formado por pessoas que desenvolviam tarefas complexas do ponto de vista intelectual, que exigiam maior esforço cognitivo; e outro em que os integrantes deveriam cumprir funções de baixa intensidade. Os pesquisadores notaram que os marcadores de fadiga mental apareceram apenas no grupo que exerceu o trabalho de alto empenho e dedicação cognitiva.

Nele, verificou-se um acúmulo de substâncias potencialmente tóxicas – como níveis mais altos de glutamato – na parte do cérebro conhecida como córtex pré-frontal, relacionada às funções cognitivas e executivas, como atenção, tomadas de decisões e memórias de trabalho, e aos planejamentos comportamentais.

À comunidade médica, Mathias Pessiglione, um dos pesquisadores, afirmou: “As descobertas mostram que o trabalho cognitivo resulta em uma verdadeira alteração funcional, com acúmulo de substâncias nocivas”. E emendou: “Então, a fadiga seria de fato um sinal que nos faria parar, mas com um propósito diferente: preservar a integridade do funcionamento do cérebro”.

Neuropsicóloga, doutoranda em engenharia biomédica e professora de bases neurais da Faculdade Uniessa (Uberlândia), Vanessa Coelho se inteirou do estudo e o levará para debate em sala de aula. Ela pontua que é preciso entender que todos nós temos, no cérebro, o glutamato, aminoácido que age como neurotransmissor excitatório: “O problema é quando há excesso e ele começa a ser degenerativo, podendo ser oxidativo e causar doenças como Alzheimer e Parkinson”.

O corpo dá sinais

A neuropsicóloga reforça que atividades não automáticas são, de fato, mais cansativas. “Jogadores de xadrez, por exemplo, têm tendência a sofrer um cansaço mental após 4h, 5h. Trata-se de uma atividade na qual, para ter um bom resultado, é preciso monitorar, mapear as ações, pensar, raciocinar”, observa.

A professora considera fundamental que haja estudos periódicos que se dediquem a analisar e entender o funcionamento do cérebro. Quando o assunto é fadiga mental, cansaço e estresse é delicado contar somente com a autopercepção individual.

No estudo da Pitié-Salpêtrière, membros do grupo em que foi verificado o acúmulo de substâncias potencialmente prejudiciais ao cérebro, quando questionadas se estavam cansados, disseram que não. “É interessante estar atento aos erros que aparecem após um período intenso de esforço. Se há cansaço, há dificuldades na leitura de um artigo, por exemplo. O corpo dá sinais”, ressalta Vanessa Coelho.

Técnica Pomodoro

Para evitar um quadro de burnout ou Síndrome do Esgotamento Profissional, classificada pela Organização Mundial da Saúde (OMS), em janeiro deste ano, como uma doença ligada ao trabalho, fazer uma gestão do tempo é primordial. “Temos que estabelecer momentos e regras de lazer”, afirma Vanessa.

A Técnica Pomodoro, popular entre quem estuda horas e horas para concursos públicos, é outra estratégia recomendada por ela. O método, desenvolvido pelo italiano Francesco Cirillo no fim dos anos 1980, consiste em desenvolver um gerenciamento de tempo. Assim, a cada 25 minutos, cinco são dedicados ao descanso. “Não somos máquinas. Ligado muito tempo, até o computador começa a esquentar”, alerta.