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Mitos e verdades: uso de banheira de motel traz risco de gravidez ou de ISTs?

A partir de caso bizarro no Rio de Janeiro, Interessa conversa com especialistas para esclarecer algumas dúvidas

Sex, 11/03/22 - 03h00
Especialistas falam sobre mitos e verdades envolvendo o uso de banheiras e piscinas em motéis | Foto:

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Causou espanto e virou notícia a história de um homem que tentou processar um hotel de luxo no Rio de Janeiro depois de a esposa dele afirmar ter engravidado “sozinha” após fazer uso de uma banheira de hidromassagem no lugar. O caso foi divulgado pela advogada Lu Lage, que postou vídeos nas redes sociais descrevendo toda a situação. 

“Esse senhor quer que eu ajuíze uma ação para processar um hotel cinco estrelas no Rio, alegando que ele ficou fora de casa seis meses, a trabalho na Europa, e quando voltou para casa a esposa estava grávida. Ele, muito bravo, tirou satisfação”, descreveu a profissional do direito na publicação. “Ela falou: ‘amor, a única coisa que eu fiz de diferente foi quando eu estive no Rio com a minha irmã, fiquei em tal hotel e realmente eu entrei inúmeras vezes na hidromassagem. Então a única chance de eu estar grávida é porque eles não limparam, não esterilizaram a banheira de hidromassagem’”, completou.  

Lu acrescentou que o marido buscava receber uma indenização por danos psicológicos e exigia que o estabelecimento honrasse os custos da criança, justificando que “foi irresponsabilidade do hotel não esterilizar a banheira de hidromassagem”. Contudo, a mulher mudou de versão posteriormente, conforme um segundo vídeo publicado pela advogada. “Eu conversei com ela separadamente, com ele, e depois com os dois. Eu disse a ela que seria uma ação sem nexo algum”, disse. Então, ela revelou que havia sido vítima de um estupro e quis esconder esse fato do marido, tentando preservá-lo desse trauma. “A (história da) banheira seria menos dolorosa para o marido do que um estupro, pois ele é muito nervoso, se alguém mexesse com ela...”, conta a advogada.

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A história, além de revelar o profundo sofrimento desencadeado por um episódio de violência sexual, também indica como alguns mitos sobre sexualidade seguem presentes em nossa sociedade. Para trazer luz ao tema, a reportagem de O TEMPO ouviu o sexólogo Eduardo Siqueira Fernandes e a ginecologista obstetra e sexóloga Adriana Sad. As explicações dos dois profissionais estão condensadas neste tira-dúvidas. 

1. Sem ter havido ejaculação dentro da vagina, posso engravidar ao utilizar uma banheira ou piscina em que exista presença de esperma na água?

Adriana Sad: Se transar em uma banheira ou uma piscina e a ejaculação acontecer dentro da vagina em um período em que a pessoa esteja ovulando, e se ela não utilizar nenhum método contraceptivo, pode ocorrer a gravidez. Mas, se o casal está em uma banheira e há a ejaculação, mas sem a penetração, por exemplo, por meio da masturbação, não tem como esse espermatozoide sair nadando - principalmente em um meio hostil, uma vez que a piscina não vai sobreviver na água tratada de uma piscina -, entrar dentro da vagina e subir para o útero. Isso não existe. É uma dúvida até descabida, fantasiosa. As pessoas pensam em muitas possibilidades por haver falta de informação. Lembro do caso de uma paciente que imaginava que poderia ficar grávida se sentasse na cama dos pais. Para ficar claro: só há chance de gravidez se houver a penetração ou, pelo menos, o gozo acontecer muito perto da entrada da vagina. 

Eduardo Siqueira Fernandes: Não é possível engravidar em uma banheira ou piscina, principalmente tendo como contexto essa história recém-divulgada nas mídias, em que um homem imaginou que a má higienização de uma banheira de hidromassagem, em que havia restos de sêmen, poderia provocar a fecundação do óvulo. Importante destacar que o esperma, no meio ambiente, entra em processo de ressecamento depois de ser expelido. Além disso, precisamos lembrar que o simples contato do espermatozoide com a superfície da vagina não leva à gravidez. Para que ela ocorra, o gameta masculino precisa percorrer todo o canal vaginal e chegar ao óvulo, que precisa estar pronto para ser fecundado. Por fim, se a ejaculação ocorrer em uma piscina ou banheira em que a água é tratada com substâncias como o cloro, entre outras, o processo de ressecamento do sêmen é ainda mais rápido. Mas é importante ponderar que há risco de gestação no caso de haver a ejaculação dentro do canal vaginal, mesmo que o casal esteja dentro de uma banheira ou piscina.

2. Corro o risco de contrair uma Infecção Sexualmente Transmissível (IST) nesses lugares?

AS: Acho pouco provável. Para contrair uma IST você precisa ter tido uma relação sexual. Mesmo se você estiver em uma banheira em que uma pessoa com HIV estava, mesmo se essa pessoa tiver urinado na água, ainda assim é pouco provável que haja a infecção. O vírus precisa de matéria viva para sobreviver, não resistindo por muito tempo no ambiente externo. Aliás, essas infecções são consideradas sexualmente transmissíveis justamente por necessitarem de contato físico, precisando haver a troca de fluxo e, no coito, seja vaginal ou anal, haver microlesões que serão porta de entrada para que o vírus ou bactéria penetre o organismo.

ESF: Apesar de ser em uma incidência muito baixa, esse risco existe. Para que a infecção ocorra, seria preciso que a banheira estivesse mal higienizada após ter sido usada por uma pessoa com alta carga viral ou bacteriana, que tenha deixado fluídos corporais no local. O intervalo de uso também deve ser considerado, uma vez que esses micro-organismos não sobrevivem por muito tempo no meio ambiente – embora sobrevivam por mais tempo que o espermatozoide. É importante dizer que o cloro e outros produtos químicos funcionam como uma barreira à sobrevivência desses patógenos, reduzindo as chances de contração de ISTs, mas essas substâncias não inviabilizam a ação de todos os agentes infecciosos. Vale registrar que, nas piscinas em que há maior volume de água, o risco tende a ser menor do que em banheiras, já que a diferença em termos de diluição desses micro-organismos. 

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