Vittorio Medioli

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Manter a juventude

Publicado em: Dom, 10/11/19 - 03h00

Certamente a tradução que fiz dos versos de Dante Alighieri, dedicados à mulher amada, Beatriz, não reproduz a musicalidade do texto original, em “dolce stil novo”, mas vale a pena sua leitura para se ter um vislumbre de um ser iluminado. Espero que possa servir às jovens, mocinhas, moças e mulheres que iniciam sua vida à procura do amor em todas as suas formas.

O ser feminino, por instinto, não abre mão de ser admirado. Gasta o que tem, e às vezes o que não tem, para atrair os olhares e encantar. Aprende a voltar-se para os raios dourados do entardecer e emanar seu melhor perfume. Em cada mulher há uma dama-da-noite escondida.

As jovens de hoje vivem pressionadas pela vulgaridade de um mundo sexualmente intoxicado, que faz desperdiçar o melhor da vida. As palavras de Dante, distantes 700 anos de nós, podem servir como eterno recado: É tão gentil e tão honesta/ a mulher minha, quando alguém saúda/que toda língua permanece trêmula, muda/ e os olhos não se afoitam de fitá-la.

Ela passa sentindo-se louvar/ benignamente de humildade absorta/, como se descida dos céus/ para milagre mostrar.
Tão afável se mostra a quem a admira/ que pelos olhos concede ao coração doçura/ que não consegue compreender quem nunca a provou./ Como se de seus lábios emanasse/ uma aura suave, repleta de amor,/ que vai dizendo à alma: “Suspira!”
A beleza melhor e mais encantadora é simples e pura. 

Bem por isso o ser humano, ao nascer, deixando esferas onde seu espírito eterno se purgou, aparece como um pequeno anjo. Puro e indefeso que não permite lembrar que é sujeito a se transformar numa megera ou num monstro, intolerável, cruel, como os eventos malvividos poderão transformá-lo.

Segundo o alquimista, o “mediador plástico” – força invisível e poderosa que molda as aparências – é ativado pelas vontades, desejos, experiências e contatos.

Transforma as formas corpóreas pelo bem, pelo mal, pela grandeza e pela pequenez do indivíduo. Não há nada debaixo do sol que não determine e altere um semblante. 

Para sair desse espiral de retornos ao planeta, o espírito eterno (a centelha divina) encontrará a porta aberta de outra dimensão paradisíaca só após muito aprender.

Uma jovem moça, pode acreditar, manterá sua beleza se for fiel aos sentimentos benévolos, à compaixão, ao perdão e à prática de bondades.

Como o recém-nascido com pele macia e traço delicado, adquiridos no período de imaterialidade quase angelical, a jovem poderá entender que a beleza lhe vem de uma origem certa.

Deverá, assim, cultivar a suavidade, fugir da crueldade, estar pronta quando o forjador a cobrar para ser aquecida e moldada nas chamas da tentação.

Podemos imaginar que é aqui, na vida material, que reside o inferno, e a forma de suavizá-lo são as boas práticas.

Se o corpo da criança é imaculado, o do ancião parece vestimenta desgastada no intenso e árduo trabalho de uma vida que deixará ao merecer um repouso. Ficará na paz espiritual até retornar com novas vestimentas. Na Bíblia inteira explicam-se por suas metáforas e códigos esses ciclos evolutivos. 

Prazeres, ouro, honras e glória pertencem a um mundo de ilusões e se tornarão pó. Mas como as folhas de uma árvore se renovam a cada primavera no verde tênue e brilhante, de beleza fulgurante, o ser humano passa na juventude por igual fenômeno.

A jovem que procura seu protagonismo, sua realização tão complexa como transitar entre espinhos sem sangrar, precisa estar ciente de que a bondade é imprescindível. 

O ser humano vencerá mais batalhas usando a sabedoria do que a força bruta, o perdão do que a vingança. Esta, um mero esquecimento da existência de Deus como dispensador insuperável de justiça.

Eliphas Levi dava sermão às mulheres que o procuravam avisando da existência de um mediador plástico, força que molda as aparências externas.

O poder de transformar quem usa as manifestações individuais do bem, do mal, da grandeza, da pequenez, das virtudes e dos pecados para determinar a aparência física e, ainda, preservar a juventude e conceder saúde. O que se planta se recolhe.

Semear sofrimentos e crueldade é retribuído. A mulher perde o charme, deixa de ser atraente. 

O mediador plástico é justo, provoca a dilatação do ventre do guloso e lhe acentua as mandíbulas, afia os lábios do avarento, torna impudente o olhar da mulher impura, e venenosa a expressão do invejoso.

Os animais que nos nutrem, o ar que respiramos, a roupa que vestimos transmitem sua semelhança ao indivíduo. São eles os elementos da alquimia que transforma nossa exterioridade. 

O egoísmo, as atitudes covardes e mesmo as negatividades dissimuladas acabam com a beleza mais que os radicais livres. Retiram brilho do olhar, a maciez da pele e dos cabelos. A acidez aflorará no cheiro da pele, do hálito, na opacidade dos olhos, no envelhecimento precoce dos tecidos.

A beleza é um empréstimo que a natureza faz à virtude. Perdida esta, a beleza termina, e a tentativa de preservá-la é tão inglória quanto inútil.