O TEMPO

Os inimigos ocultos

O presidente eleito está certo quando diz que sua morte interessa a muita gente

Por Vittorio Medioli
Publicado em 02 de dezembro de 2018 | 04:30
 
 

O presidente eleito postou em sua rede social: “Minha morte interessa a muita gente e não interessa somente aos inimigos declarados, mas também aos que estão muito perto”. Ele está certo.

Continua vivo por uma série de circunstâncias milagrosas que o preservaram da morte quase certa quando uma lâmina de 20 cm perfurou seu intestino, provocando um estrago de graves proporções.

Passou a temer mais os inimigos, adotando colete à prova de bala e um cinturão de agentes que o cercam por onde anda. Figuras poderosas passaram a detestá-lo quando seu discurso reformista e moralizador o colocou como favorito entre eleitores.

Adélio Bispo, o esfaqueador, segundo seu diário de Facebook, estava no encalço de Bolsonaro desde julho, aguardando uma oportunidade de cometer seu atentado.

O “capitão” é o típico “acidente de percurso” numa via histórica que nunca ofereceu oportunidade a um desalinhado. Nem Lula pode ser considerado como tal, mantinha relações institucionais com a Volkswagem e com grandes empresários. Quem o tirou da cadeia em 1980 foram os advogados da Volkswagen, e Miguel Jorge, um executivo da montadora com assento na nata paulista, participou e foi ministro dele.

Bolsonaro não teve e não tem esse trânsito, ele o está construindo agora, apenas na caserna transcorreu sua existência. Não sabe lidar com o ambiente das finanças e da economia, se apresenta como uma incógnita por esse lado e uma ameaça brutal para quem ganhou dinheiro no caos e na corrupção endêmica brasileira, que promete eliminar, custe o que custar.

Desponta no ranking dos temidos pelo capitão, em primeiro lugar, quem mais ganhou e dessa forma mais poderia perder: o setor financeiro. Este não parou de aumentar sua lucratividade de ano em ano até a estratosfera, quando controlou de fato o Banco Central e todos os entroncamentos por onde passam as diretrizes econômicas nacionais. Bolsonaro deu um aceno de conciliação com Joaquim Levy no BNDES, um banco operacional, mas distante das decisões políticas maiores.

Bolsonaro tem ameaçado enquadrar o sistema que surfa numa pororoca de ganhos abismais e superiores aos fantásticos que a Companhia das Índias Orientais (da Coroa Britânica) teve ao longo de séculos, dominando o tráfico de ópio no mundo inteiro.

Em segundo lugar entre os temidos, Bolsonaro tem o crime organizado, que movimenta valores enormes e se serve do sistema financeiro. Como os banqueiros, ao crime servem o “caos criativo”, os desequilíbrios, a gangorra, e a situação caótica favorece seus negócios escusos. O capitão, que prega que é legítimo atirar em quem carrega um fuzil, se apresenta como ameaça para as forças de segurança. Ele pode ser um flagelo para os traficantes.

Em terceiro lugar, entram por direito os grupos, quase sempre grandes empreiteiras e operadores de negócios, que assumiram grande parcela da economia nacional. A definição vem de dentro para fora com o recém-falecido Murilo Mendes: “São aqueles que para ganhar dinheiro fazem de tudo, até obras”. No “tudo” de Mendes entra o diabo que se manifestou com o petróleo e o quadrilhão. Bolsonaro é uma encrenca certa, nunca dialogou com o setor, é carta fora do baralho aparentemente não administrável. O temor sobe com a nomeação de Moro, contrário aos acordos de leniência e favorável a recuperar em peso os bilhões amoitados no exterior. Essa entrada enorme e rápida para amortizar dívidas e devolver a capacidade de investimento ao governo.

Por incrível que pareça, o lado político vem em último lugar; apesar de terem muita vontade de comemorar um enterro do presidente eleito, os movimentos políticos não têm capacidade de organizar um atentado pra valer. Podem emprestar a matéria-prima para execução da obra. O fanatismo serve para selecionar mentes mais perturbadas ou fáceis de serem controladas.

Dediquei aqui dois longos capítulos ao projeto MKultra, da CIA americana, que condiciona pessoas a ser como um Jason Bourne; existem na KGB russa, no Mossad israelense, no Mi6 britânico, no MOIS iraniano, que opera via Hezbollah, e até no DGI cubano.

Mais ainda, Bolsonaro manifesta que teme também “aqueles que estão muito perto”, quer dizer, quem veste a farda militar?

Um filho de Bolsonaro afirmou que será fácil descobrir o que se esconde por trás de Adélio, talvez difícil será revelá-lo ao mundo.

Resta que os lucros fáceis e o poder usado para se locupletar estão na origem dos temores, e a nomeação de Sergio Moro representa uma declaração de guerra aos bandidos de todas as espécies e cores.