Eleições

Com dura cláusula de barreira, metade das siglas corre risco de acabar

Aumento do mínimo de votos válidos força mudanças de estratégias nos partidos políticos

Por Franco Malheiro
Publicado em 12 de julho de 2021 | 07:00
 
 
Câmara dos Deputados Foto: Najara Araújo / Câmara dos Deputados

Desde que foi criada, em 2018, a cláusula de barreira passou a ser uma pedra no sapato de muitos partidos e uma preocupação a ser levada em consideração na construção de chapas.

Com uma regra mais rígida para 2022, o dispositivo, que restringe o acesso de siglas com baixa representatividade ao Fundo Partidário e ao tempo de propaganda gratuita no rádio e na TV, ameaça mais da metade as legendas. 

Se em 2018 a regra exigia que os partidos tivessem pelo menos 1,5% dos votos válidos, no pleito do ano que vem, para sobreviver à cláusula, as legendas precisam conquistar ao menos 2% desses votos, ou eleger pelo menos 11 deputados federais distribuídos em nove Estados.

Nos próximos pleitos, a corda vai ficar ainda mais esticada, exigindo dos partidos 2,5% dos votos válidos em 2026 e 3% a partir de 2030.

Mesmo não sendo considerados pela cláusula de barreira, os desempenhos eleitorais dos partidos nas eleições municipais de 2020 ajudam a mensurar os riscos que cada sigla corre.

No pleito do ano passado, PSOL, PSC e o Patriota receberam 2,18%, 2,09% e 2% dos votos válidos, respectivamente, ou seja, ficaram no limite da regra. Já Solidariedade, Avante, PROS, PCdoB, PRTB, PV, Novo, Rede, DC, Agir, PMN, PMB, PSTU, UP, PCO e PCB ficaram abaixo do mínimo exigido, e, se repetirem esse desempenho em 2022, perderão a verba dos fundos e o tempo de TV.

Diante dessa perspectiva, legendas ameaçadas já ligaram o alerta e trabalham em estratégias para superar o mínimo exigido.

Deputada estadual pela Rede e membro das executivas nacional e estadual do partido, Ana Paula Siqueira diz que o foco da legenda tem sido a construção de chapas competitivas para a Câmara Federal. Atualmente o partido só tem uma deputada na Casa: Joênia Wapichana (RR).

Segundo Ana Paula, para isso o partido busca aumentar o espaço e a representatividade para jovens, mulheres, negros e LGBTQIA+ entre os quadros. 

“Queremos ampliar na Rede o espaço para esses grupos que querem participar da política e não o encontram em outras legendas”, afirmou a deputada, que é a única representante do partido na ALMG atualmente. Segundo ela, a sigla espera eleger, em 2022, pelo menos dois deputados federais por Minas e ampliar para três o número de assentos no Legislativo estadual. 

O presidente do PV em Minas, Osvander Valadão, diz que a legenda investe politicamente nos quadros orgânicos da sigla.

“Em Minas, por exemplo, vereadores e vice-prefeitos eleitos pelo partido em cidades acima de 100 mil habitantes já são pré-candidatos a deputado federal e estadual; com isso criamos a estratégia de uma chapa homogênea”, explicou Valadão, que aposta na força política dos seis deputados do partido na ALMG, sobretudo na do presidente da Casa, o deputado Agostinho Patrus.

O presidente nacional do Avante, deputado federal Luis Tibé, também acredita na superação da cláusula em 2022. “Ganhamos prefeituras importantes, como Manaus, que é primeira capital que a gente ganha; São Gonçalo, que é uma prefeitura grande no Rio; o vice-prefeito de Canoas (RS) é do partido; em Pernambuco elegemos 11 prefeitos e não tínhamos nenhum. O partido está crescendo”, ressaltou.

Deputado federal pelo Novo, Tiago Mitraud também acredita que a legenda vá superará a cláusula. “Não sei se tranquilidade é uma palavra certa, mas o cenário aponta para uma tendência de que o Novo consiga superar a cláusula. Evidentemente não podemos dar bobeira e já estamos trabalhando na construção de uma chapa forte e competitiva para ampliar nossa bancada”, pontuou o deputado, que também cita a posição central do governador Romeu Zema no debate de 2022 como um trunfo da legenda.

Federação pode se tornar alternativa 

Em 2018, algumas legendas já sofreram os efeitos da cláusula de barreira. Siglas deixaram de existir, enquanto outras se juntaram para superar a regra exigida. Foi o caso do PCdoB, que só escapou em 2019 porque incorporou o PPL aos seus quadros. 

Para 2022, com a regra mais rígida, chegou até a circular a possibilidade de uma fusão do partido com o PSB, criando uma nova legenda. Essa proposta foi aventada pelo governador do Maranhão, Flávio Dino, que deixou o partido para se filiar ao PSB. No entanto, a ideia mais defendida pelos comunistas é a volta das coligações proporcionais, ou a criação das federações partidárias, outra proposta discutida no Congresso. 

As federações funcionam como uma coligação permanente, ou seja, os partidos somariam seus desempenhos eleitorais a fim de alcançar o mínimo exigido e durante os quatro anos de mandato atuariam em conjunto nas Casas legislativas, sem que precisassem fundir as estruturas.

“Você cria essas frentes políticas, de caráter mais estável, com programa que preserve a fidelidade para os próximos quatro anos. Eu acho que isso vai moralizar a política. Diferente do que é esse troca-troca de partidos a todo momento, infidelidade no voto”, argumentou o presidente do PCdoB em Minas, Wadson Ribeiro. 

Ele ainda classifica a cláusula de barreira como antidemocrática e danosa a “partidos históricos e programáticos”. 

O presidente estadual do PV, Osvander Valadão, também considera a regra “um ataque direto aos partidos”. “A cláusula de barreira é um mecanismo que ataca os partidos ideológicos, com bandeira. Que fazem uma política com formação de quadros e investimento na base. Que não são agrupamentos políticos de pessoas com potencial de voto, mas sim organizações que atuam no campo programático de suas bandeiras defendidas”, destacou. 

O verde, embora acredite na superação da cláusula de barreira pelo PV, não descarta a possibilidade da federação. 

“Ainda que o PV supere a cláusula e outros partidos não superem, como partidos aliados, estar na federação é uma forma de você existir coletivamente no campo programático, principalmente em momento difícil como esse que vivemos”, destacou.

Já para o deputado Luis Tibé (Avante), que é presidente da Comissão da Reforma Política da Câmara, são remotas as chances para que a proposta seja aprovada. 

“A federação nacional em todos os Estados, e nenhum partido consegue replicar isso a não ser PCdoB e Cidadania hoje, então dificilmente passa”, afirmou o deputado. Segundo ele, dificilmente a PEC vai também excluir a cláusula de barreira e voltar às coligações proporcionais.