A Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) viu o déficit previdenciário do município disparar 39% em 2019 em relação ao ano anterior. Na prática, a gestão do prefeito Alexandre Kalil (PSD) precisou aportar R$ 639,6 milhões no Fundo Financeiro (Fufin) para garantir o pagamento dos benefícios de 19,2 mil servidores inativos e pensionistas. O aporte foi de quase R$ 180 milhões a mais que em 2018, quando a PBH precisou aplicar R$ 461,1 milhões para que as contas fechassem. Com isso, a atual gestão fechou 2019 com uma despesa de pessoal 7% maior em relação a 2018.
Os dados estão disponíveis no relatório de execução das ações governamentais, encaminhado à Câmara de Belo Horizonte na semana passada. Os gastos previdenciários foram os responsáveis por puxarem a despesa de pessoal para cima, conforme explicou Bruno Passeli, subsecretário de planejamento e orçamento da PBH. “O déficit cresceu muito e vem aumentando a cada ano em virtude de ter havido, nos últimos anos, uma corrida para a aposentadoria”, disse, referindo-se aos servidores que já tinham preenchido o requisito para solicitar o benefício e adiantaram os pedidos por conta da reforma previdenciária, aprovada no fim do ano passado.
Outro motivo para o crescimento da despesa com o pessoal foram reajustes concedidos pela gestão. Em 2018, a PBH concedeu uma recomposição geral de 2,43% para todo o funcionalismo, impacto que foi sentido nas contas do ano passado. “Além disso, em 2019 tivemos alguns reajustes pontuais de determinadas carreiras, como médicos e guardas municipais”, pontuou Passeli.
Para 2020, as previsões são ainda mais preocupantes, já que a estimativa é de um crescimento de 28% no déficit. Pelos cálculos, a prefeitura vai precisar remanejar R$ 821,3 milhões do Orçamento para cobrir o rombo da previdência. Um estudo já está em andamento e, conforme adiantou o secretário, em breve mudanças nas regras previdenciárias deverão ser encaminhadas ao Legislativo municipal para análise. “Temos o estudo, mas não temos ainda a conclusão, nem a condição de apresentá-lo agora. Se a gente não mudar a própria legislação municipal com relação ao tema, o que vamos ter é cada vez menos dinheiro para as atividades fim (em função do aumento de gastos)”, explicou.
Coronavírus
A situação fica ainda mais complicada devido à queda da arrecadação municipal, tida como certa devido ao desaquecimento da economia e à paralisação de algumas atividades em função da pandemia de coronavírus. “O déficit previdenciário já está previsto no Orçamento. Se não tivesse o coronavírus, esse dinheiro estaria garantido. Com a redução da receita da prefeitura, nós vamos ter dinheiro para pagá-lo? Acho que a dúvida é mais ampla: vamos ter dinheiro para pagar as outras despesas da prefeitura?”, ponderou Passeli.
Nesse cenário, ele explicou que o contingenciamento de despesas é inevitável, mas garantiu que não há riscos para o funcionalismo. “Não estamos falando em deixar de pagar funcionário. Isso não passa em nossa cabeça. Não vamos deixar de pagar aposentados. Isso tudo está completamente fora de questão”, assegurou, explicando que há uma atualização semanal, feita em conjunto com a secretaria de Fazenda municipal, sobre a queda da receita tributária. A expectativa é de que hoje a prefeitura divulgue dados sobre o impacto na arrecadação.
Em paralelo, a gestão também tem feito estudos para o enxugamento de gastos. A estratégia, até o momento, passa por duas frentes: a diminuição de despesas de custeio e a renegociação de dívidas. “O nosso objetivo é estudar, dentro do custeio, dentro das atividades que a prefeitura tem ao longo do ano, o que pode ser adiado para 2021”, explicou o subsecretário, exemplificando que eventos de rua que já fazem parte do calendário da cidade podem ser adiados. “Algum evento que temos o costume de fazer, até em vias públicas, e que aglomeram um grande número de pessoas, nós não poderíamos mais fazer. Então, isso será adiado e o recurso poderá ser realocado”.
Com relação à negociação de dívidas, o subsecretário explica que existe uma articulação liderada pelo Congresso nacional para adiar o pagamento de dívidas de Estados e municípios com bancos. “Nós temos um grande volume de empréstimos com a Caixa Econômica e o Banco do Brasil. Pagamos algo em torno de R$ 500 milhões por ano. Não falamos de adiar todas as dívidas, mas se postergarmos o pagamento com esses dois bancos, teríamos uma grande margem de recurso, que alinhado com a redução de custeio, seria suficiente para termos recursos para compensar a queda na receita”.
Enxugamento na folha
Apesar de admitir que o enxugamento de despesas será necessário, por enquanto a PBH não estuda diminuir o número de cargos comissionados. Os trabalhadores terceirizados, no entanto, podem vir a ser atingidos pela redução na despesa de custeio – já que os contratos com as empresas que prestam serviço entram nessa conta.
“Tivemos as chuvas e agora o coronavírus. Aí muda a nossa realidade e temos necessidade de fazer o contingenciamento de despesas planejadas para redirecionar esse dinheiro para áreas essenciais”, explicou Bruno Passeli. Questionado sobre a possibilidade de diminuição no quadro de servidores, ele destacou que não há perspectivas nesse sentido e que não foram encomendados estudos sobre a questão.
“Terceirizado é custeio. Então, pode ter algum impacto, mas não é o foco. Pode ter algum impacto marginal. Por exemplo: tem um evento que contrata uma empresa terceirizada para ajudar na organização. Se esse evento for cancelado, essa empresa provavelmente não será contratada mais. Pode ter um efeito cascata”, admitiu, ressaltando que esse não será o foco dos cortes nos grandes contratos que a prefeitura atualmente tem.