CASO MARIELLE

Disputa por regularização de terras no RJ motivou assassinato de Marielle

Os irmãos Chiquinho e Domingos Brazão são apontados com mandantes do assassinato, enquanto Rivaldo Barbosa é apontado pela PF como responsável por orquestrar o crime e obstruir as investigações

Por Manuel Marçal
Publicado em 24 de março de 2024 | 14:28
 
 
Ministro da Justiça e Segurança Pública (MJSP), Ricardo Lewandowski, durante coletiva de imprensa sobre o caso Marielle neste domingo (24) Foto: Manuel Marçal - O TEMPO 24.03.2024

O ministro da Justiça e Segurança Pública (MJSP), Ricardo Lewandowski, afirmou neste domingo (24) que um dos motivos que levaram ao assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL) em março de 2018 foi uma disputa por regularização de terras na cidade do Rio de Janeiro. 

De acordo com investigação da Polícia Federal, o grupo político que ela pertencia se opunha ao projeto de lei que tramitava na Câmara dos Vereadores. O texto visava regularizar terras para uso comerciais, enquanto Marielle, junto da bancada do PSOL, era a favor que os terrenos fossem utilizados para fins de moradia popular. 

O grupo responsável como mandante do crime eram os irmãos Chiquinho e Domingos Brazão, envolvidos, de acordo com investigações da PF, com milícias e grilagem de terra.

 

Os presos são o deputado federal Chiquinho Brazão (União Brasil-RJ), o conselheiro do TCE (Tribunal de Contas do Estado) do Rio Domingos Brazão e o delegado Rivaldo Barbosa, ex-chefe da Polícia Civil no Rio. Os irmãos Brazão são apontados como suspeitos de serem os mandantes do assassinato, enquanto Rivaldo Barbosa foi preso por orquestrar o crime e tentar obstruir as investigações.  

Para Lewandowski, está "bem claro" quem são os executores do crime e que, sob este ponto de vista, "os trabalhos foram dados como encerrados", descartando, assim, a possibilidade de haver outros mandantes do assassinato da vereadora.

Na mesma linha, o delegado geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, explicou que a prisão dos suspeitos de serem os mandantes "encerra etapa das investigações". No entanto, ele frisou que não é possível apontar um único fato motivador pelo assassinato de Marielle Franco.

“A motivação precisa ser olhada no contexto, não podemos dizer que houve um único e exclusivo fato. São várias situações que envolvem a vereadora e levaram esse grupo de oposição, o ministro (Lewandowski) falou da questão política que envolve essa situação, envolve também milícia, disputa de territórios, e que naquele contexto é importante”, narrou Andrei Rodrigues.

O diretor geral da PF descreveu ainda, na coletiva de imprensa, que "havia uma relação indevida" de Rivaldo Barbosa com os irmãos Brazão antes da morte de Marielle Franco. 

Barbosa assumiu o cargo para comandar a Polícia Civil do Rio de Janeiro um dia antes do assassinato da vereadora. "Pode ser dito que, já antes do crime, havia uma relação indevida desse que era então chefe da Delegacia de Homicídios e depois chefe de polícia para desviar o foco da investigação daqueles que são os verdadeiros mandantes do crime", narrou Andrei Rodrigues. 

Segundo o ministro da Justiça e Segurança Pública, a colaboração premiada do ex-policial militar Ronnie Lessa permitiu que a Polícia Federal concluísse o relatório. Lessa admitiu ter atirado em Marielle Franco e no motorista Anderson Gomes em março de 2018.

Entenda mais sobre a disputa de terra

 

Milicianos infiltraram criminoso no PSOL para vigiar os passos de Marielle

Segjndo relatório da Polícia Federal, os irmãos Chiquinho e Domingos Brazão infiltraram um miliciano no PSOL para monitorar os passos de Marielle. Esse criminoso teria sido o responsável de reportar que a vereadora do PSOL pediu para população não aderir a novos loteamentos situações em áreas controladas pela milícia. 

Como Chiquinho Frazão é deputado federal, ele tem foro privilegiado, o que fez o caso ser analisado no Supremo Tribunal Federal (STF). O relator do inquérito, ministro Alexandre de Moraes, citou na decisão que determinou a prisão dos suspeitos os episódios narrados por testemunhas.

As investigações apontam que a época de tramitação do projeto de lei sobre regularização fundiária para fins comerciais, sem o aval da Prefeitura do Rio de Janeiro, Chiquinho Brazão, então vereador, se irritou com Marielle Franco e com a bancada do PSOL por se oporem ao projeto. Ainda assim, mesmo sem o apoio do PSOL, Chiquinho conseguiu maioria dos votos para aprovação do texto. A Justiça do Rio de Janeiro suspendeu a lei pouco tempo depois por considerar a matéria como inconstitucional. 

O projeto de lei citado pelos investigadores da Polícia Federal é citado no relatório da corporação, que se tornou público por decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Na coletiva de imprensa, Lewandowski leu um trecho do relatório que cita a disputa política e o envolvimento dos irmãos Brazão. "Diversos indícios do envolvimento dos Brazão, em especial Domingos, em atividades criminosas como milícias e grilagem de terras. Ficou delineada divergência no campo politico em regularização fundiária e direito à moradia".

"Quanto à motivação do crime em investigação, testemunhas ouvidas ao longo da investigação foram enfáticas ao apontar que a atuação política de Marielle Franco passou a prejudicar os interesses dos irmãos Brazão no que diz respeito à exploração de áreas de milícias. A vereadora não escondia o seu entendimento de que as iniciativas de regularização fundiária, pela caracterização de Áreas de Especial Interesse Social (AEIS), seriam adequadas para atender aos interesses dos segmentos sociais que mais sofrem com o déficit habitacional existente no Rio de Janeiro. No entanto, tais instrumentos teriam sido empregados de forma distorcida pelos irmãos Brazão, apenas para viabilizar a exploração econômica de espaços territoriais que, não raro, eram dominados por milicianos", escreveu Moraes.