O Supremo Tribunal Federal (STF) começa a julgar na tarde desta quarta-feira (3) a constitucionalidade das alterações na Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/1992) inseridas pela Lei nº 14.230/2021, a chamada Lei de Improbidade Administrativa. Os 11 ministros da Corte vão decidir se as mudanças podem ser aplicadas retroativamente às ações de ressarcimento e aos atos de improbidade administrativa na modalidade culposa (intencional).
Há ao menos 1.147 processos sobre o tema espalhados por tribunais de todo o país à espera de uma definição da Corte. A previsão é que o julgamento leve quatro sessões. Ou seja, poderá se estender por duas semanas.
O plenário do STF analisa um caso específico, que servirá de parâmetro para os demais. O processo julgado é o de uma procuradora condenada a ressarcir os prejuízos causados ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) por sua negligência na função. A ré foi contratada para defender em juízo os interesses da autarquia e reivindicar o ressarcimento dos prejuízos causados em razão de sua atuação atuou entre 1994 e 1999. A ação contra ela foi proposta em 2006.
O julgamento no STF tem como relator o ministro Alexandre de Moraes. Ele ressaltou em voto no Plenário Virtual que a controvérsia é de “suma importância” para o cenário político, social e jurídico, e que o interesse sobre a matéria ultrapassa as partes envolvidas.
O caso tem repercussão geral, ou seja, a decisão valerá como parâmetro para outros casos em instâncias inferiores. Se os ministros decidirem que a mudança na lei, que agora exige o dolo (intenção) do agente para configurar a improbidade, ela será aplicada para casos já julgados antes da sanção da norma.
Por isso, o julgamento é tão aguardado por políticos e outros agentes públicos, em especial aqueles condenados por improbidade que desejam disputar as eleições deste ano. Caso do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e dos ex-governadores Anthony Garotinho (RJ) e José Roberto Arruda (DF), e do ex-prefeito do Rio de Janeiro Cesar Maia, vice na chapa de Marcelo Freixo ao Palácio Guanabara. Todos foram condenados por um colegiado e, por isso, estariam impedidos de concorrer pela Lei da Ficha Limpa.
Mudanças na Lei da Improbidade, que beneficiam condenados, foram sancionadas por Bolsonaro
As mudanças que enfraqueceram a Lei de Improbidade foram sancionadas em outubro de 2021 pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), após aprovação da Câmara e do Senado.
A lei foi criada para punir enquadrar condutas contra princípios da administração pública que causem prejuízos ao erário e resultem no enriquecimento ilícito dos agentes públicos.
A partir das alterações aprovadas, o texto passou a exigir o dolo do agente, ou seja, a intenção de cometer irregularidade, para a condenação. Antes, os atos culposos, sem intenção, também eram punidos.
A lei também alterou prazos de prescrição, o tempo previsto para que o estado possa processar o agente pelo ato de improbidade, que diminuiu em alguns casos.
O texto ainda determina que só será cabível ação por improbidade se houver dano efetivo ao patrimônio público.
Políticos condenados já foram beneficiados por mudanças
Tribunais de Justiça de todo o país já deram decisões com base na nova lei. Em maio, a Justiça Federal da 1ª Região negou uma ação de improbidade administrativa do Ministério Público Federal contra o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello e outras cinco pessoas pela crise do oxigênio no Amazonas durante a pandemia. O juiz entendeu que a conduta não está mais prevista em lei.
Em junho, o ex-deputado federal Rôney Nemer, do Distrito Federal, voltou a ser elegível graças à mudança nos prazos de prescrição. A decisão foi do ministro Nunes Marques, do STF. Nemer foi condenado acusado de receber valores em troca de apoio ao governo de José Roberto Arruda, no maior esquema de corrupção já desvendado na capital da República, por meio da Operação Caixa de Pandora, que também resultou na condenação e inelegibilidade de Arruda.
O ex-governador do DF chegou a conquistar uma decisão favorável do ministro Humberto Martins, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que suspendeu sua inelegibilidade. Martins suspendeu o efeito de duas condenações atendendo ao argumento de que o STF ainda julgaria a aplicação retroativa da Lei de Improbidade. Mas a decisão liminar, concedida mês passado, no recesso do Judiciário, foi derrubada pelo ministro Gurgel de Faria, relator do caso.