No centro de polêmicas, nas esferas criminal e eleitoral, a ex-prefeita de Santa Luzia Roseli Pimentel (PSB) foi figura recorrente em noticiários nos últimos meses. Acusada de mandar executar um jornalista da cidade da região metropolitana de Belo Horizonte e alvo de cinco ações na Justiça Eleitoral, sendo que em todos os processos os mandatos foram cassados, ela concedeu entrevista exclusiva ao jornal O TEMPO e a rádio SUPER NOTÍCIA.

Roseli recebeu a reportagem no apartamento em que mora em em São Benedito, distrito de Santa Luzia. Em prisão domiciliar desde outubro do ano passado, sem uso de tornozeleira eletrônica, ela passa os dias em um apartamento de 72 metros quadrados. O imóvel tem três quartos, sala, cozinha e banheiro. No local moram ela e dois dos seus três filhos - eles têm 10, 25 e 27 anos.

Na entrevista, a ex-prefeita garantiu que é inocente em todos os processos e afirmou ser vítima de perseguição política. Ela também declarou que a prisão é injusta, já que não mandou matar o jornalista, e disse ser uma presa política.

 

Roseli conta também que foi muito bem tratada no Complexo Penitenciário Estevão Pinto, na região leste da capital mineira, onde ficou detida em setembro de 2016. Ainda segundo a política, durante o período que esteve no cárcere, quando não estava acordada se mantinha sedada com medicamentos, uma vez que sempre ouvia a voz do filho, de 10 anos.

Confira a íntegra da entrevista exclusiva:

As investigações da Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG) indicam que a senhora mandou executar o jornalista Maurício Campos Rosa, do jornal O Grito, em agosto do ano passado, porque ele teria pedido dinheiro para não publicar uma reportagem que dizia que a senhora comprou uma casa com verba do município. Ainda segundo a investigação, a senhora teria pago R$ 20 mil para bancar o crime e esse dinheiro teria saído dos cofres da própria prefeitura por meio de uma nota fiscal de compra de mamão para merenda escolar. A senhora teve alguma participação nisso? Conhecia o Maurício?

Eu conversei com o Maurício três vezes nesse tempo todo que eu moro na cidade. A nossa conversa era de que ele queria ser jornalista oficial da prefeitura e participar da empresa que ganhasse a licitação do marketing. Ele não publicava só coisas minha, mas de vereadores, de tudo que acontecia na cidade e uma coisa ou outra ele falava sobre a gestão de 2016. Não teria motivo nenhum para eu fazer isso, e isso também não é verdade. Eu não seria burra a ponto de pegar R$ 20 mil da prefeitura. Eu não sei porque o inquérito apontou para mim numa situação dessas. Eu não sei como isso surgiu, eu sou professora da cidade há muitos anos, a comunidade inteira me conhece e eu não faria isso nunca. Em relação a compra de casa, eu tenho o recibo dos alugueis de todo o período que eu morei lá, que foi um ano. Nesse um ano tentaram me assassinar, atiraram em mim, colocaram fogo ao redor da minha casa, fui seguida e ameaçada várias vezes, tenho vários boletins de ocorrência.

Onde era a casa?

No (bairro) Industrial Americano, que segundo eles (PCMMG) é uma casa de R$ 3 milhões. É muito difícil encontrar uma casa desse valor em Santa Luzia e mais ainda de eu colocar uma casa de R$ 3 milhões em meu nome.

Mas de quem eram essas ameaças? A senhora desconfia de algúem?

Desconfio, mas acho prematuro falar sem provas.

Mas seria um adversário político?

Inimigo político. Eu não diria adversário porque adversário é apenas por um tempo, você ganha ou perde a eleição e cada um vai seguir seu rumo. Então, virou uma questão pessoal por conta da questão política de Santa Luzia.

Então por qual motivo a senhora acredita que foi presa?

No dia 6 de setembro à tarde eu fiz um desfile simbólico do dia 7 setembro na porta da prefeitura e pelo o que fiquei sabendo a ordem de prisão era para ser cumprida na hora do evento. Porém, nós tínhamos uma pessoa no palanque conosco que não deixou que aquilo acontecesse porque achou um absurdo. Então, esse mandado foi cumprido no dia 7, às 6 horas da manhã na minha casa. Quando eu perguntei para o delegado porque eu estava sendo presa ele falou que era por pertubação de ordem pública e ameaça à testemunha. Eu fiquei completamente desnorteada. Eu achei que era uma brincadeira. Eu estava na minha casa com os meus três filhos e eles invadiram bruscamente a minha casa, arrebentaram o meu portão e só não arrebentaram a porta da minha casa porque na hora o meu filho viu o que estava acontecendo, abriu a porta e falou que não precisava daquilo. A única ação que eu tive no momento foi ligar para o meu advogado, que encontrou comigo na delegacia. Foi um cenário artístico. Não sei se eles já tinham avisado para algumas redes de TV, tinham várias viaturas, e eu me senti como um criminosa sem saber o porquê. Eu fui tomando conhecimento do que tinha acontecido e o que motivou o pedido de prisão preventiva, assinado pelo desembargador. Foi que a diretora do RH da prefeitura demitiu uma funcionária que é casada com uma testemunha contra mim no caso (do homicídio) e que se sentiu ameaçada. Até então, eu não sabia que era investigada e indiciada no processo, porque o indiciamento aconteceu um dia depois da minha prisão. Foi um absurdo.

A senhora considera que a sua prisão foi injusta?

Completamente injusta, descabida e absurda. Hojeuma pessoa para ficar presa antes do processo de instrução, pode ficar presa por 85 dias preventivamente. Em determinado casos, 102 dias podendo ser prorrogado por mais 20 dias, na situação de ouvir testemunhas. Eu tenho 320 dias que estou presa. Ou seja, isso é antecipação de pena e constrangimento ilegal porque eu não fiz defesa até hoje.

E como na Penitenciária Estevão Pinto, em Belo Horizonte, onde a senhora ficou cumprindo pena por um mês? Como foi a relação com as outras detentas?

Eu escrevi um livro nesses 30 dias e não publiquei ainda porque eu acredito que tenham páginas em branco. Fui muito bem recebida por todas elas. Eu nunca tinha ido numa delegacia nem para fazer um boletim de ocorrência, eu pensei que o meu advogado me tiraria na hora. Então, eu fui muito calma. Eu lembro que um dos delegados que estava lá na operação era muito educado e muito ético, não o que estava comandando, e falou que tinham muitos repórteres lá fora e ofereceu um pano para cobrir a cabeça e passar entre eles. Eu falei que “não” e que ia andar de cabeça erguida, como sempre andei, porque eu não devia nada. Fui para o Instituto Médico Legal (IML) e depois para a Estevão Pinto. Chegando lá fui muito bem tratada pela diretora do presídio, pelas detentas e pelos agentes. São pessoas que estão ali, cada um com sua história, e me trataram muito bem.

Como era a rotina?

Para mim que não estou acostumada era acordada 24 horas ou sedada com medicamento. Ficar sem os filhos (chorou) não é muito fácil. Isso foi o que mais pesou. As pessoas responsáveis por apurar esses casos deveriam ser mais responsáveis. Se trata de uma mãe de família, residência fixa, 20 anos de trabalho na cidade, a minha família toda mora aqui e de repente ser acusada de um crime de homicídio? Lá, o pior momento era quando eu ia almoçar e pensava que meu filho estava almoçando. Já à noite eu ouvia ele me chamando. Os meus dois filhos mais velhos passaram por momentos de depressão e meu filho menor faz tratamento psiquiátrico, como eu. Eu não tive prazo para a defesa e até hoje não fiz. Mas foi um aprendizado muito grande (no cárcere). Eu não utilizei esse tempo para ficar mancomunado coisas contra as pessoas, mas sim para conseguir perdoar quem fez isso e dar valor aos que convivem comigo. Foi um tempo bom para pensar.

Em outubro do ano passado o Superior Tribunal de Justiça (STJ) autorizou que a senhora cumprisse prisão domiciliar. Como têm sido esses dias?

Essa rotina de ficar em casa a gente tem que ter muito cuidado para não ficar louca. Eu sou uma pessoa muito ativa, na prefeitura aquilo ali era 24 horas. E, de repente você tá num lugar que não pode sair, isso mexe com a cabeça da gente. Eu não tenho rotina. Às vezes é ficar no sofá da hora que eu acordo até a hora que eu vou dormir. O que mais me dói é o meu filho (de 10 anos) chegar com um convite do dia da família e da festa da escola, e eu não poder ir.

Sobre política, a senhora e o seu vice, Fernando César (PRB), foram alvos de cinco ações no Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais (TRE-MG) e em todos os processos a Justiça Eleitoral pediu a cassação dos mandatos. Em uma das ações é dito que a senhora teria enviado mensagens para que os diretores de escolas municipais influenciassem pais de alunos durante as eleições de 2016. A senhora pediu voto? Fez uso de veículos de comunicação para se promover?

Eu fico muito feliz de abrirem um processo por eu ter pedido voto, por ter ido em lugar público em período de campanha, não por ter desviado dinheiro público, não por fazer parte de organização criminosa como a gente vê na televisão todos os dias. O que os adversários ou o adversário achou na minha campanha foi: pedir voto. Claro que os diretores vão pedir votos para os pais de alunos, mas isso fora do horário de trabalho. Eles fazem o que eles quiserem. Agora, se tiveream conversas de WhatsApp, antes de se dar a cassação deveria ter sido feita uma perícia telefônica.

A senhora enviou as mensagens?

Não, claro que não. Eu fiz uma perícia com um perito, se não me engano, enviei pro ministro e comprovei que a voz (das mensangens) não era minha. Eu queria saber por qual motivo esses outros órgãos não fizeram essa perícia de contrapartida. Muito fácil acatar uma denúncia e falar: “vamos cassar por abuso de poder econômico”. O que é abuso de poder econômico? O ex-prefeito de Santa Luzia (Carlos Alberto) colocava um outdoor ou uma placa de posto de saúde e jogava isso (na prestação de contas) como marketing. Isso não é marketing, é informação. Então, no período dele, quem trabalhou nessa área não trabalhou muito bem. Eles não dividiram o que era marketing e o que era informação. Então, eu não poderia ter gasto mais do que os três últimos anos (com marketing). E no meu período como eu fiz a coisa certa deu-se a entender que eu gastei mais em marketing do que ele, mas não foi. Isso ficaria provado nessas cinco ações que estavam no TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Mas, o que eu quero deixar bem claro é que o meu processo criminal e os meus processos eleitorais muito estranhamente andavam juntos.

A senhora acredita que tanto a Justiça Eleitoral quanto a Polícia Civil, essas duas instituições, estão erradas em relação ao julgamento que fizeram nos seus processos?

A Polícia Civil é uma corporação respeitadíssima. Na minha gestão, creio eu que em um ano eu fiz muito mais pela Polícia Civil de Santa Luzia do que o próprio governador. E não estou dizendo a corporação, eu disse que infelizmente nunca na política de Santa Luzia aconteceu o que aconteceu ultimamente. Inclusive, rstamos tendo eleições suplementares aqui e já foram presas três pessoas. Então, eu sinto em lhe dizer que a gente está vivendo numa ditadura. Eu sou presa política, porque ninguém fica preso nove meses. Isso é constrangimento ilegal e, para mim, é antecipação de pena por um crime que eu não tenho participação nenhuma. Não tem nada que me ligue a esse crime. Como decretam uma prisão preventiva antes do encerramento de um inquérito, se o inquérito foi concluído no dia 8 de setembro de 2017? Se o inquérito foi concluído no dia 8 de setembrode 2017.

Mas a senhora vê ligação nessa questão da Justiça Eleitoral com a questão criminal?

Vejo.

Mas qual é a ligação que a senhora faz em relação a isso?

Acho que tem uma pessoa muito forte, numa esfera muito maior do que de Santa Luzia, que para ela não era interessante me manter como prefeita pela minha honestidade. Isso porque quando chegavam pra mim pra oferecer determinadas coisas, eu falava “não”. Então, esse monte de “nãos” que eu fui falando atingiu alguém que se vocês me perguntarem quem, eu não sei, mas é alguém muito forte, que tem acesso a várias instâncias na questão da política e que me fez ficar presa arbitrariamente nove meses. E o meu próprio advogado, que só de experiência criminal tem 40 anos, falou que não vê isso acontecer. Então, eu já não sei o que fazer mais.

Isso a senhora vai mostrar na defesa?

Eu não sei como ele (advogado) vai fazer. Que pé que ele vai pegar essa defesa. Se vocês me perguntarem hoje qual que é a minha defesa, eu não sei.

Para os dois casos?

Eu tive que renunciar, fui obrigada. Eu não sou mulher de renunciar, quem me conhece sabe disso e eu ia até o fim. Só que o meu vice (Fernando César) não sei o motivo porque se ele não tivesse renunciado estaria prefeito da cidade. Depois da renúncia dele o Habeas Corpus me libera pra ficar na domiciliar, mas eu não posso voltar pro meu cargo e tenho que ficar 24 horas presa, não posso trabalhar. Não tinha jeito, eu tinha que renunciar e deixar o povo de Santa Luzia legitimar o governo que eles acham que é o melhor pra cidade. Não poderia ficar interinamente (como prefeito) o presidente da Câmara esse período todo porque isso só sairia esse resultado do TSE depois da apuração de tudo, ou seja, no final de 2020.

E a senhora pretende voltar à vida política?

Nada hoje me impede de ser candidata a deputada, talvez em 2020 à prefeitura. Mas eu vou falar de todo o meu coração: a política é decepcionante. Se você não fizer o que te mandam fazer, você simplesmente é excluída do processo, como fizeram comigo. Não compensa. Você assume uma cadeira e você não tem liderança e nem pode liderar. Você não pode ser nem honesta, porque se você for pode ser presa.

Hoje, a senhora sente que por conta de todos esses processos e acusações, principalmente em relação a acusação criminal, as pessoas têm medo ou receio da senhora?

De forma alguma. Pelo contrário. Eu moro no Centro do distrito de São Benedito. Aqui é o maior colégio eleitoral da cidade e sou muito bem tratada por todas as pessoas. Ninguém tem medo de conversar comigo e as pessoas que estão aqui sabem que eu nunca faria uma coisa dessas, e nem se tivesse uma motivação.

A senhora gostaria de fazer uma consideração final?

Eu só queria continuar batendo na mesma tecla de que sou inocente, não cometi crime nenhum, nunca desviaria dinheiro público porque eu vejo essa cidade como a minha casa. Eu vivi por essa cidade e espero que isso seja levado em conta. E quem tinha intenção em me prejudicar acabou me ajudado. Esse tempo todo foi uma lição de vida, um aprendizado muito grande, talvez eu tenha errado realmente, escutando pouco uma pessoas e muito quem não devia. E isso tudo é aprendizado.

Quem a senhora não deveria ter escutado?

Às vezes você chama um secretário que é político e ao invés de você ir lá e conferir o que foi feito, você dá autonomia. Talvez eu tenho errado.