A declaração de líderes do Brics, divulgada neste domingo (6) no encontro do grupo que acontece no Rio de Janeiro, traz condenação a ataques militares em países em situação de guerra. Um dos casos citados é o do Irã, mas sem menção direta aos Estados Unidos e Israel, que têm financiado ataques há quase um mês.
“Condenamos os ataques militares contra a República Islâmica do Irã desde 13 de junho de 2025, que constituem uma violação do direito internacional e da Carta das Nações Unidas, e expressamos profunda preocupação com a subsequente escalada da situação de segurança no Oriente Médio”, diz o documento.
A carta dos líderes tem 38 páginas e expressa, ainda, “preocupação” e “apreensão” com outros conflitos pelo mundo e com “o atual estado de polarização e fragmentação da ordem internacional”. Além do Irã, é abordado o cenário na Ucrânia (sem citar Rússia) e a disputa pelo território Palestino, na guerra que tem Israel e afeta, ainda a Faixa de Gaza.
“Recordamos que a Faixa de Gaza é parte inseparável do Território Palestino Ocupado. Salientamos, a este respeito, a importância de unificar a Cisjordânia e a Faixa de Gaza sob a Autoridade Palestina e reafirmamos o direito do povo palestino à autodeterminação, incluindo o direito a um Estado independente da Palestina”, informa o documento.
A carta dos líderes conclama a comunidade internacional a responder à situação com medidas político-diplomáticas para reduzir o potencial de conflitos, buscando segurança e solução pacífica “por meio do diálogo, da consulta e da diplomacia”.
Ainda sobre os ataques de Israel contra Gaza, como citado no documento, há uma condenação às “tentativas de politizar ou militarizar a assistência humanitária" e o pedido por negociações para um “cessar-fogo imediato, permanente e incondicional”, saída de forças israelenses e libertação de reféns.
“Reafirmamos que uma solução justa e duradoura para o conflito entre Israel e Palestina só pode ser alcançada por meios pacíficos e depende do cumprimento dos direitos legítimos do povo palestino, incluindo os direitos à autodeterminação e ao retorno", diz a declaração.
Comércio
O documento afirma que “o sistema multilateral de comércio está há muito tempo em uma encruzilhada” e que a proliferação de ações restritivas a negócios, “seja na forma de aumento indiscriminado de tarifas e de medidas não-tarifárias, seja na forma de protecionismo sob o disfarce de objetivos ambientais, ameaça reduzir ainda mais o comércio global, interromper as cadeias de suprimentos globais e introduzir incerteza nas atividades econômicas e comerciais internacionais”.
O cenário, segundo os líderes, pode aumentar disparidades econômicas existentes e afetar as perspectivas de desenvolvimento econômico global. “Expressamos sérias preocupações com o aumento de medidas tarifárias e não tarifárias unilaterais que distorcem o comércio e são inconsistentes com as regras da Organização Mundial do Comércio (OMC)”.
Há a declaração de apoio “a um sistema multilateral de comércio baseado em regras, aberto, transparente, justo, inclusivo, equitativo, não discriminatório e consensual”, com tratamento especial e diferenciado para países em desenvolvimento.
Os líderes expressaram condenação à imposição de medidas coercitivas unilaterais, que consideram contrárias ao direito internacional. Eles apontaram que essas medidas têm implicações negativas de longo alcance em direitos humanos, com impacto, por exemplo, na saúde e segurança alimentar, “afetando de maneira desproporcional os pobres e as pessoas em situações vulneráveis, aprofundando a exclusão digital e exacerbando os desafios ambientais”.
Os integrantes da reunião no Rio de Janeiro destacaram a inteligência artificial como uma “oportunidade singular para impulsionar o desenvolvimento rumo a um futuro mais próspero”, mas ressaltaram a necessidade de uma governança global para mitigar potenciais riscos e atender às necessidades de todos os países, incluindo os do Sul Global.
Saúde e Meio Ambiente
Os líderes fizeram um compromisso com o fortalecimento da governança global da saúde e defenderam a atuação da Organização Mundial da Saúde (OMS) como autoridade na área, particularmente em tempos de crise e emergência.
“Reconhecemos o papel fundamental da atenção primária à saúde como base fundamental para a Cobertura Universal de Saúde e para a resiliência do sistema de saúde, bem como para a prevenção e resposta a emergências de saúde pública”, cita trecho.
Há a defesa pelo multilateralismo como necessário para enfrentar desafios de ameaça ao planeta, como a mudança do clima, e o chamado por um fortalecimento da resposta global à essa questão em termos que incluem o desenvolvimento sustentável e a erradicação da pobreza. Isso, ainda, com a criação de mecanismos de financiamento climático acessível a países em desenvolvimento.
“Rejeitamos medidas protecionistas unilaterais, punitivas e discriminatórias, que não estejam de acordo com o direito internacional, sob o pretexto de preocupações ambientais, como mecanismos unilaterais e discriminatórios de ajuste de carbono nas fronteiras. [...] Também nos opomos a medidas protecionistas unilaterais, que causam disrupções deliberadas nas cadeias globais de fornecimento e produção e distorcem a concorrência”, diz a carta.
O documento traz, ainda, cobranças sobre segurança energética, redução de riscos de desastres e proteção dos direitos humanos, com o enfrentamento a formas de discriminação. Os líderes do Brics apontaram ainda a participação econômica das mulheres na promoção do crescimento sustentável.
Reforma de instituições
Os países voltaram a defender a reforma de instituições ligadas às Nações Unidas para aumentar a participação e o poder de países em desenvolvimento, especialmente do Sul Global. O apelo, de acordo com o texto, visa garantir uma representação geográfica equitativa e o aumento da participação de mulheres em todos os níveis de liderança e responsabilidade nessas organizações.
“Concordamos que, diante das realidades contemporâneas de um mundo multipolar, é fundamental que os países em desenvolvimento fortalecem seus esforços para promover diálogo e consultas com vistas a uma governança global mais justa e equitativa e relações mutuamente benéficas entre as nações. Reconhecemos que a multipolaridade pode ampliar as oportunidades para que os Países em Desenvolvimento e Mercados Emergentes (PDME) desenvolvam seu potencial construtivo e se beneficiem de uma globalização e cooperação econômicas universalmente vantajosas, inclusivas e equitativas”, frisa a carta.