O Supremo Tribunal Federal (STF) discute nos próximos dias se altera ou não a jurisprudência que hoje autoriza a prisão para cumprimento antecipado de pena após o fim dos recursos na segunda instância da Justiça. Considerando-se o teor constitucional do tema, seria normal que a Corte estivesse debruçada sobre o assunto. Porém, tal discussão está envolta por uma névoa de incoerência de várias das partes que participam do debate.
A Corte vai analisar uma ação constitucional proposta pelo Partido Ecológico Nacional (PEN). O PEN, por si só, é incoerente por instituto. Após propor mudar seu nome para Patriotas a fim de abrigar o nada ecológico Jair Bolsonaro (PSL), a legenda resolveu desistir da ação. É curiosíssimo que um partido se preste ao papel de contestar a constitucionalidade de uma medida para, às vésperas de seu julgamento, mudar de ideia pelo simples fato de que sua eventual vitória, agora, beneficiaria um adversário político. Chamar de “casuísmo”, nesse caso, é bem pouco.
Só há qualquer expectativa sobre essa nova votação pelo fato de o ministro Gilmar Mendes, no ano passado, ter decidido também rasgar seus entendimentos anteriores sobre o assunto e alterar seu voto. Gilmar fez discursos efusivos a favor da prisão em segunda instância e, agora, é o crítico mais feroz da medida. Com sua mudança de posição pode-se esperar um 6 a 5 diferente do que se deu em 2016. Naquela ocasião, a Corte alterou uma jurisprudência consolidada e passou a permitir o encarceramento antes do trânsito em julgado. Com a nova posição de Gilmar Mendes, a situação parece ter se invertido.
Os defensores de que a prisão antes de encerrar todas as fases de recurso contraria a Constituição só não estão mais otimistas pelo fato de a ministra Rosa Weber também estar balançando sobre seu voto. Vencida em 2016, ela passou a adotar o entendimento da maioria e a negar habeas corpus que questionavam a jurisprudência. Acaba, porém, sendo surreal que, com a mudança de Gilmar, Rosa Weber contrarie suas próprias teses sobre o assunto em nome de uma maioria que só continuará existindo se ela própria alterar seu voto.
Outros ministros também mudaram de ideia sobre o tema ao longo da história. Em entrevista ao jornal O TEMPO em 2016, Dias Toffoli defendia a decisão tomada pelos colegas com respeito à prisão em segunda instância. O próprio Tof-foli, no primeiro dos julgamentos daquele ano, votou favoravelmente ao cumprimento antecipado da pena. Em outra votação também realizada em fevereiro de 2016, porém, ao definir-se a repercussão geral do assunto, o ministro começou um processo de modificação.
Agora os relatos dão conta de que PT e MDB estão juntos na tarefa de convencer o ministro Alexandre de Moraes a também mudar de ideia. Temerosos do voto de Rosa Weber, que já não é mais tão certo quanto antes, eles querem que o indicado de Michel Temer passe a considerar inconstitucional o entendimento que permite o encarceramento prévio.
Triste uma Justiça que não se baseia em argumentos técnicos, interpretações fixas e convicções de seus maiores operadores, mas que faz a balança pender de um lado ou de outro ao sabor da política.
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