Jacqueline Caixeta é supervisora pedagógica e palestrante
É Brasil, meu Brasil lindo, maravilhoso, começou a faltar professor, né? Pois é, essa bola eu já estou cantando há muito tempo. Já escrevi sobre professor ser espécie em extinção e, agora, vem o Pé de Meia para Licenciatura.
Olha que coisa, mais linda! Imagina, um incentivo financeiro pra quem se aventurar na carreira de docente. Vejam onde tivemos que parar! Pagar para que as pessoas queiram ser professores!
Esse programa vale tantas reflexões que acho que em um único artigo, não conseguirei contemplar tudo, mas, vamos a algumas...
Será que a educação merece ter professores que só se formaram porque tinham uma necessidade financeira e receberam um incentivo? Será que se não fosse a bolsa do pé de meia, seriam professores? Mais uma vez estamos colocando a carreira da docência em risco. Não queremos em nossas salas de aula pessoas atuando sem o mínimo de desejo, sem vocação, sem tesão pelo que fazem.
A educação precisa e merece muito mais do que professores bem formados, ela merece professores apaixonados pelo que fazem. A educação tem que ter em seu palco gente que acredita que está ali porque quer transformar vidas, que sonha que seu ofício seja muito mais do que um mero trabalho que se bate ponto e ganha o dia. Educador precisa ter o desejo de fazer a diferença correndo em suas veias.
Lógico que não vou generalizar, talvez, aquele professor que foi fazer alguma licenciatura só pelo estímulo da bolsa, possa se descobrir professor e ser brilhante, mas, e aqueles que se formaram só pelo incentivo, que nunca nem se imaginaram em sala de aula? Como irão fazer quando os desafios de se educar alguém bater na porta e exigir de você muito mais do que conhecimento?
Exigir de você garra, teimosia, inquietude, tesão, paixão, por brigar pela educação. Quando for preciso arregaçar as mangas e lutar por seus direitos, será que terão fôlego suficiente? Ah, ser professor é bem mais do que saber ensinar conteúdos e, para ter ciência disso, é preciso ser professor de fato, aquele que fez a licenciatura porque acredita na educação, porque quer mudar o mundo através de suas aulas.
Sou pelas políticas públicas e lógico que apresentar algo para possibilitar o acesso de pessoas aos cursos universitários, sempre é uma oportunidade de exercer aquele direito garantido em constituição. Educação para todos. Trata-se de um programa interessante pelo olhar do acesso ao ensino superior, claro que sim, no entanto, pode ser um grande risco para a educação se quem entrar não se transformar em educador de fato. É um risco, sim, é um risco. E nossas salas de aula podem perder muito tendo professores que se formaram só porque foi a única possibilidade que tinham.
Bem, o programa está agindo como uma emergência para não ter o “apagão” de professores. Por que será que este apagão está prestes a existir? Ora bolas, simples a resposta. Quem quer ser professor num país em que professor não é bem remunerado e nem respeitado? Se as políticas públicas tivessem olhado com mais carinho para a carreira da docência, não seria preciso criar o pé de meia. Se os professores fossem mais valorizados e respeitados, não seria necessário fazer essa caça aos professores, os cursos de licenciatura seriam os mais disputados.
Quando falo de respeito, estou incluindo não só governos, mas pais e alunos. A carreira de magistério é a única que pessoas que não são formadas, não possuem competência alguma, se acham no direito de dizer o que um professor deve ou não fazer. Em reuniões de pais, não faltam palpites de como fazer isso ou aquilo, como o professor deve dar sua aula, distribuir a pontuação, e assim vai. Ninguém entra em um consultório médico e diz ao doutor como ele deve ou não examiná-lo. Ninguém vai ao dentista e diz como fazer o canal. Poderia citar mil outras situações, mas está claro que só nas escolas, pessoas que não tem formação se acham no direito de dizer pra quem tem formação o que fazer.
Isso é desrespeitoso para o professor.
Enfim, por fim, se, no Brasil, professor fosse mais bem remunerado e respeitado, com certeza absoluta, não estaria em extinção, não haveria necessidade de se criar programa algum.
Resta-me acreditar que os que se tornarem professores através deste programa, se tornem de fato educadores na essência da palavra e que, depois desse susto de apagão, governo e sociedade passam a respeitar mais seus professores, afinal, todos precisam de um.