Sergio Luiz Araujo Vieira é doutor em física, prof. dos cursos de engenharia do Centro Universitário Ibmec BH

No último dia 23 de junho, vários sites anunciaram que um observatório localizado em Cerro Pachón (Chile) iria divulgar as primeiras imagens obtidas pela maior câmera digital do mundo, acoplada ao telescópio Vera Rubin. Essa câmera mostra objetos distantes com uma nitidez e resolução de cores sem precedentes. O telescópio possui um espelho primário (o seu olho) de 8,4 m e uma câmera (a retina) com 3.200 megapixels, o equivalente a quase 70 câmeras de celulares topo de linha.

O ser humano percebe o mundo ao seu redor usando os cinco sentidos, e entre eles o que mais se destaca e fascina é o da visão. A visão nos permite observar e interpretar o mundo em que vivemos. Desde o início de nosso desenvolvimento tecnológico foram criados aparelhos com a finalidade de aumentar nossa capacidade de enxergar e, assim, conhecer melhor o mundo, pois, apesar da grande resolução, nosso olho ainda é muito pequeno. No século XVII, a invenção da luneta ampliou a visão que tínhamos do mundo, nos mostrando o que é muito grande e distante.

Com a evolução tecnológica, as lunetas se tornaram telescópios, mas mesmo no século XX havia um sério problema com o uso dos telescópios: nossa atmosfera impedia que víssemos com clareza suficiente os corpos celestes; era como abrir os olhos embaixo da água. Por essa razão os grandes telescópios foram colocados em locais muito altos e secos, como o deserto de Atacama, no Chile, ou no Monte Mauna Kea, no Havaí. Ou, se possível, em órbita da Terra fora da nossa atmosfera, os famosos telescópios espaciais, entre os quais um dos mais famosos é o telescópio Hubble.

Originalmente, uma imagem astronômica, como as obtidas pela supercâmera do telescópio Vera Rubin, é sem cor, mas é apresentada à imprensa e ao público com cores maravilhosas.

Essas fotos são obtidas usando-se um dispositivo digital denominado CCD (o antigo filme da câmera ou retina do nosso olho), muito semelhante aos existentes nas câmeras dos nossos celulares, muito mais sensíveis, mas que não conseguem ver cores, apenas a intensidade da luz que chega. Como cativar o grande público, que é o responsável pelo pagamento desses projetos, mostrando imagens em tons pastel de cinza?

No caso das câmeras de celulares são tiradas três fotos simultâneas utilizando três filtros (verde, vermelho e azul), e as imagens são combinadas de acordo com a resposta do olho humano para obtermos as cores que vemos nas fotografias.

Para a supercâmera do telescópio Vera Rubin são feitas centenas de imagens com diferentes filtros, que depois são combinadas. Cada filtro deixa passar somente uma cor, que, ao chegar ao CCD, é registrada como uma imagem em preto e branco (tons de cinza).

Uma das primeiras imagens dessa supercâmera foi da nebulosa de Trifida, liberada em 12 de junho de 2025 (a imagem colorida pode ser visualizada em diversos sites). Ela é composta de 664 imagens feitas com quatro filtros diferentes (uma média de 150 para cada filtro, todas elas em preto e branco) e um tempo total de quase seis horas de exposição.

Como essa imagem ficou colorida? Ela foi obtida utilizando filtros que deixam passar as cores ultravioleta, verde, vermelho e infravermelho. Quando a luz de cada uma dessas cores chega ao CCD, é registrada uma imagem em preto e branco (tons de cinza) com intensidades diferentes. Depois de obtidas, essas imagens são combinadas num processo parecido com a mistura de tintas quando pintamos. Mais intenso significa mais tinta, menos intenso menos tinta. Essas combinações/associações de cores e intensidade são feitas por programas de computadores.

É por meio dessas combinações que as imagens vão ganhando as várias cores e as diferentes tonalidades que vemos nas imagens astronômicas.