O Brasil dispõe de um dos meios de pagamento instantâneo mais modernos do mundo, o Pix, lançado pelo Banco Central (BC) em novembro de 2020. Em menos de cinco anos, superou o dinheiro em espécie e tornou-se o preferido dos brasileiros, usado por 76,4% da população, segundo a pesquisa “O Brasileiro e Sua Relação com o Dinheiro”, divulgada pelo BC na virada do ano.

Embora adotado amplamente, o Pix não impediu que o número de cartões de crédito ativos no país continuasse crescendo: houve alta de quase 14% no ano passado, em relação a 2023.

Este cenário parece ser ignorado pelo governo dos Estados Unidos, que encara o Pix como possível prática desleal do Brasil em relação a serviços de pagamentos eletrônicos. Os EUA, terra de origem das grandes bandeiras de cartão de crédito em operação no mundo, embasam a investigação na Seção 301 da Lei de Comércio de 1974, que autoriza o governo norte-americano a investigar práticas comerciais de outros países que possam ser consideradas injustas ou prejudiciais aos interesses dos EUA.

A pesquisa do BC mostra que a população brasileira percebe o Pix como “o mais lembrado em segurança, obtenção de descontos, facilidade de uso, custos, controle de gastos, aceitação pelos estabelecimentos, comodidade e gastos emergenciais”. Onde está a injustiça?

Pode ser que, ao optar pelo nosso “queridinho”, ainda mais após o lançamento do Pix automático e do Pix por aproximação, o correntista brasileiro esteja usando menos os grandes cartões. Mas, de motivar queda na utilização de um meio de pagamento fornecido por empresa privada a “ferir os interesses comerciais de um país”, a distância é grande. Intransponível.

Carece de fundamento jurídico a alegação do governo norte-americano. Fere não só a política pública nacional, mas a autonomia do sistema bancário. Tanto que não se viu, até agora, alegação semelhante em relação ao Bizum espanhol, ou ao MB WAY português, que usam o celular para transferências instantâneas. 

A diferença entre as duas situações está no lobby das grandes bandeiras, não em algum interesse nacional ferido.