Quantas vezes você discutiu em 2021? Quantas vezes você disse que entraria na Justiça contra alguém por um ato banal? Quantas vezes se indispôs com uma amizade?
Muitas, incontáveis, certo?
Eu estava comprando uma revista numa banca na avenida do Contorno e vi uma senhora xingando o dono de cabo a rabo somente porque ele perguntou se poderia dar balas no lugar de R$ 0,20. Tamanha a cólera, parecia que ele tinha roubado ou ofendido a mãe dela. Ele unicamente apresentou uma proposta comum e tradicional diante da ausência de troco.
Nossa educação está errada, totalmente equivocada. É uma educação da raiva, da imposição física, da prepotência intelectual, do preconceito, do menosprezo moral.
Saímos de casa armados com o gatilho da nossa ansiedade, atirando para todos os lados.
Por motivos banais, usamos da chantagem, do ultimato, da privação, do castigo, da exposição.
Frequentamos os extremos excessivamente. Já partimos para a vingança antes mesmo de conversar. As represálias tornaram-se preventivas.
Se o banco não aprova uma operação, ameaçamos mudar de conta. Se a operadora não satisfaz a nossa solicitação, ameaçamos mudar de operadora. Se o par amoroso se opõe a um projeto, ameaçamos terminar o relacionamento.
Não há mais como alguém no serviço público ou privado errar, que a atitude é interpretada como mal-intencionada. Ou a perfeição (impossível) é a regra, ou a exceção é trapaça.
Tudo é insinuação de processo, de ação, de advogado.
Se dependesse dos litígios inventados de cabeça quente a qualquer momento, moraríamos no Juizado das Pequenas Causas.
Tudo é promessa de denúncias públicas nas redes sociais. Se dependesse do que juramos postar, viraríamos um feed do Procon.
Não aceitamos mais frustrações, perdas, desentendimentos. Ninguém pode se machucar ou ser contrariado atualmente.
Há mais realeza dentro de nós do que realidade.
Exigimos os nossos direitos faltando com os nossos deveres de cordialidade.
Partimos da crença de que obteremos o pretendido apenas pela coerção.
Persiste uma mentalidade de que só leva quem grita mais alto.
Adotamos a prática da justiça pelas próprias mãos, buscando nos antecipar à malandragem com a histeria.
Queremos penalizar a outra parte por não corresponder às expectativas ou por não solucionar as nossas exigências.
Investimos nos artifícios do constrangimento, do escândalo e do barraco para calar dissidências.
É um comportamento de quem se sente sempre atacado, passado para trás, enganado.
Não acreditamos no outro. Não acreditamos no atendimento. Não acreditamos no sistema. Não acreditamos no equilíbrio. Não acreditamos no Brasil.
Por que não conversamos com gentileza, com doçura, apresentando os nossos argumentos com calma?
Exige tempo! E não há jamais tempo a perder para desfazer mal-entendidos. Criamos inimigos e desafetos pela pressa. A pressa é renovar ressentimentos.
Quando você pergunta “não sabe com quem está falando?”, você tampouco sabe quem você se tornou.