Estive com a família na semana passada em Nova York. Fizemos questão de assistir à apresentação da pianista alemã Alice Sara Ott com a famosa Filarmônica de Nova York, a mais antiga dos Estados Unidos, que já foi dirigida por Leonard Bernstein.
Ao entrar na sala de concertos reformada, no complexo artístico Lincoln Center, em Manhattan, qual foi a nossa surpresa em notar uma incrível semelhança com a Sala Minas Gerais.
Não que o auditório indefectível de Belo Horizonte tenha se inspirado no espaço David Geffen Hall. Pelo contrário, a Sala Minas Gerais, conhecida no mundo inteiro, influenciou a reforma de US$ 550 milhões para corrigir a acústica do ícone americano. Trocou-se o estofamento dos bancos, adicionaram-se painéis refletores de som nas laterais e se reformou o teto.
Encontramos lá, agora, as paredes difusoras em forma de vela da capital mineira. Não foi coincidência, não foi acaso, a mesma equipe de engenheiros que desenhou a Sala Minas Gerais trabalhou para resolver o antigo problema dos espetáculos do Lincoln Center, “que tinha um som antisséptico, muito fraco nos graves, com pouca cor e presença”, de acordo com crítico de música do jornal New York Times, Harold Schonberg.
Sentimos um imenso orgulho de nosso patrimônio acústico. Entenda a magnitude do fato: o espaço David Geffen Hall da Filarmônica de Nova York copiou a sede da Orquestra Filarmônica de Minas Gerais.
A Sala Minas Gerais é o teatro mais harmonioso que existe. O mais lindo. O mais impecável. É como se puséssemos nosso par de ouvidos dentro de um violino Stradivarius.
Não estou exagerando. Quem já rodou pela Europa e pela América do Norte, e conheceu as principais salas de concerto, sabe que ela se posiciona na vanguarda em infraestrutura.
Por isso, eu fiquei profundamente feliz com o distrato da transferência de gestão da Sala Minas Gerais ao Serviço Social da Indústria (Sesi).
Da plateia, aplaudo de pé o gesto lúcido do Sesi, representado pela Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg).
A Sala deve permanecer sendo conduzida pelo Instituto Cultural Filarmônica (ICF), como ocorre desde 2008, a partir de Contrato de Gestão com a Secretaria de Estado de Cultura e Turismo (Secult).
Por esse Contrato, vigente até dezembro 2024 e passível de ser aditado a cada ano, o ICF continua a ser a responsável pela Sala e pela Orquestra.
Peço que o governador Romeu Zema mantenha esse formato, tendo em vista a importância da Orquestra, que, ao longo dos seus 15 anos, formou um público assíduo e pontual.
Dificilmente, ocorre um concerto vazio. Só em Belo Horizonte apresentações de música clássica lotam, com venda de pacotes para a temporada inteira.
Não tem que mudar nada porque aquela obra-prima de arquitetura foi criada especificamente para a realização de concertos sinfônicos, recitais e apresentações de música de câmara. Não pode converter-se em uma casa de shows ou albergar eventos comerciais de natureza distinta. É o mesmo que assassiná-la.
Não tem que mudar nada porque a Sala Minas Gerais jamais fica ociosa. Ou seja, nem teria como atender novas demandas. A Filarmônica utiliza a Sala por 270 dias ao ano. Para cada concerto, são necessários seis ensaios. Precisa ocupar mais do que isso?
Não tem que mudar nada, pois a Orquestra teria não alcançado tantas proezas sem uma base. A profissionalização depende de um lar, para crescer e obter qualidade e coesão. Trata-se, acima de tudo, de estabelecer uma carreira regular de exibições para solistas e regentes. Assim como a Filarmônica de Viena tem a Musikverein, e a Filarmônica de Berlim tem a Philharmonie, a nossa Orquestra tem a Sala Minas Gerais.
Não tem que mudar nada, uma vez que a Sala não traz prejuízo para o estado, apenas divulga o estado internacionalmente. Não existe melhor e mais rentável propaganda.
O valor para a manutenção da Sala é de R$ 4,5 milhões, mas quem arca com esse custo é o Instituto Cultural Filarmônica (ICF). Graças ao Contrato de Gestão com a Secult, o ICF cobre 80% do valor da folha salarial de músicos e funcionários. Os 20% restantes e todas as despesas das atividades artísticas, além do custo de manutenção e operação da Sala, são angariados com captações nas empresas privadas pela Lei Rouanet, venda de assinaturas e ingressos avulsos para os concertos, e receitas pelo aluguel dos espaços da Sala nos dias em que a orquestra não está tocando ou ensaiando.
Não tem que mudar nada. Nunca deu tão certo um sonho. Como diz o diretor artístico e regente Fabio Mechetti: “uma sede não se cede”.