Em 3 de junho de 2024, o Projeto de Lei (PL) 914/2024 chegou à Câmara Municipal de Belo Horizonte. Recebi. Assinei, carimbei e encaminhei para tramitação. Em 4 de julho, foi aprovado em segundo turno por unanimidade: 40 votos a favor. No dia seguinte, seguiu para o prefeito. Em 6 de julho, já era a Lei 11.710/2024. Tudo em apenas 32 dias. Fica o exemplo.
A proposta era clara: autorizar a contratação de até R$ 468,6 milhões em empréstimo com aval da União, sendo R$ 317 milhões destinados à compra de cem ônibus elétricos e à instalação da infraestrutura de recarga. A Câmara Municipal fez sua parte. Coordenei cada etapa. Alinhei com comissões, articulei com líderes, garanti tramitação ágil e respeitosa. Resultado: lei aprovada com celeridade e apoio unânime. Uma marca da minha presidência: agilidade quando era bom para a cidade.
A promessa era objetiva: edital ainda em 2024, aquisição em lotes de 20 veículos, entrega dos primeiros ao longo de 2025. Estamos em julho de 2025. Nenhum edital foi publicado. Nenhuma licitação foi aberta. Nenhum contrato foi assinado. Nenhum carregador foi instalado. Nenhum ônibus elétrico foi adquirido com base nessa lei.
O contraste é gritante: a cidade teve celeridade no Poder Legislativo e paralisia no Poder Executivo. A Câmara Municipal, em um mês, aprovou uma política pública estrutural. A prefeitura, em mais de um ano, não executou nada. Há declarações, entrevistas e promessas. O que não há é frota nova circulando.
Não há um só documento publicado ou cronograma iniciado.
E não foi por falta de anúncios. Em julho de 2024, o site oficial da prefeitura informava que a aquisição seria feita diretamente pelo Poder Executivo e os veículos, repassados às concessionárias.
Em dezembro, o superintendente da Sumob, André Dantas, declarou à Technibus que “toda a documentação para a compra dos ônibus já está pronta” e que a compra seria por lotes ao longo de 2025. No mesmo período, à rádio Itatiaia, disse que “a licitação será lançada em breve”. Um ano depois, nada começou.
Na última sexta-feira, em Belo Horizonte, o ministro das Cidades, Jader Filho, confirmou pessoalmente a mim: “Já aprovamos cem ônibus com recursos do PAC. Agora, só falta a prefeitura avançar no processo para que esses veículos venham. De Brasília, está pronto. Falta a cidade fazer a parte dela”. Fica o recado. Aproveitou para dizer que o governo federal abriu nova seleção para aquisição de mais ônibus, incluindo modelos 100% elétricos, com ar-condicionado e Wi-Fi.
Enquanto isso, cidades do mesmo porte avançam. O relatório “De Santiago a Shenzhen”, do ITDP, mostra que Shenzhen eletrificou 100% da frota (mais de 16 mil veículos) entre 2009 e 2017. Bogotá, Santiago e Pune começaram com pilotos, como Belo Horizonte, e transformaram testes em contratos, contratos em entregas, entregas em operação.
A diferença não está na tecnologia nem no financiamento. Está na decisão. Shenzhen não esperou. Bogotá não hesitou. Santiago não adiou. Assumiram responsabilidades com metas públicas, contratos transparentes e execução concreta. A Prefeitura de Belo Horizonte, não.
A meta municipal de substituir 40% da frota até 2030 vem sendo reiterada, mas nunca formalizada. Faz parte de um Plano de Mobilidade Limpa que até hoje não foi publicado como decreto nem traz metas vinculantes. Com cerca de 2.600 ônibus, seriam necessárias 208 substituições por ano. Nesse ritmo?
Um ano se passou sem o primeiro passo. Isso tem custo ambiental, institucional e social. A cada mês sem edital, perdemos mais do que eficiência: perdemos ar respirável, oportunidade econômica e a confiança e o conforto do passageiro.
Esse não é apenas um caso de descumprimento de cronograma. É o retrato de uma cidade que tem lei, tem dinheiro, tem justificativa técnica, tem aprovação política… e mesmo assim não entrega.
A Câmara Municipal fez sua parte. Foi rápida, unânime, objetiva. A cidade esperava o mesmo da prefeitura. Por enquanto, o que temos é um projeto que passou e cem ônibus que não chegaram.