A bomba silenciosa da inadimplência atinge pequenos negócios e franquias. E o mais assustador é que ela não faz barulho - mas explode todos os dias, no caixa da padaria, na conta do MEI, na planilha da franquia que já não bate metas há meses. O país finge normalidade, mas a realidade bate à porta: empresários estão se afogando em dívidas, sem crédito, sem fôlego e, principalmente, sem respostas.

O Brasil assiste à falência lenta e generalizada da sua base produtiva como quem assiste a um documentário trágico no sofá: sem reação, sem indignação, como se não fosse com ele. Mas é. Porque quando o pequeno negócio quebra, o emprego desaparece, o consumo cai, e a engrenagem trava.

O que estamos vivendo é mais do que uma crise de caixa. É uma crise de confiança, de prioridade, de visão. O crédito não chega a quem precisa. O Estado arrecada como nunca, mas entrega como sempre: pouco, tarde e mal direcionado. E enquanto isso, milhões de empresas lutam para pagar o básico - o aluguel, o fornecedor, os funcionários.

Neste cenário, não há distinção: do interior ao centro urbano, do franqueado ao autônomo, todos estão no mesmo barco… furado. Está na hora de parar de jogar baldes d’água e começar a discutir, de verdade, por que deixamos chegar a esse ponto - e o que ainda pode ser feito para virar esse jogo. Os impostos são uma bomba silenciosa  da inadimplência e agora a injustiça estrutural entre pequenos e grandes negócio.

“O país dos 149 dias de escravidão tributária”

Enquanto o pequeno empresário afunda, o Estado bate recorde de arrecadação e os grandes continuam blindados

Vamos direto ao ponto: o Brasil virou uma máquina de moer empreendedores. Em 2025, o brasileiro trabalhou até o dia 29 de maio só para pagar impostos. São 149 dias de servidão fiscal - um retrato vergonhoso de um Estado que cobra como país nórdico e entrega como república de quinta categoria.

E o resultado disso não é simbólico. É letal: mais de 7,3 milhões de empresas estão inadimplentes. Isso representa quase um terço de todas as empresas do país - e mais de R$170 bilhões em dívidas. Mas o governo, ao que tudo indica, finge não ver. Para ter uma ideia isso representa ⅓ de todas as empreaaa em funcionamento no país. Como incentivar pessoas a realizar sonho de ser dono do próprio negócio com números e dados tão destrutivos?

Em vez de um plano de salvação econômica para o empreendedor brasileiro, o que temos é um cenário onde quem mais apanha é justamente quem mais emprega. Porque, vamos lembrar, quem gera mais de 70% dos empregos no Brasil não são os grandes conglomerados — são os pequenos e médios negócios.

A realidade é igual para todos: está ruim do topo à base

Essa crise não tem distinção de tamanho. Está ruim para o MEI, para a padaria da esquina, para o franqueado de shopping e até para grandes redes com operação nacional. A diferença? Os grandes têm acesso a crédito, linhas especiais, renegociações bilionárias e lobby político. Os pequenos… nem o gerente do banco atende mais.

Quem tem perfil de crédito, não quer se endividar. Quem precisa de crédito, não consegue. O sistema financeiro virou um cassino às avessas: só joga quem já ganhou. Enquanto isso, o empreendedor que sobrevive de venda no Pix, no carnê e no parcelamento do cartão passa vergonha na boca do caixa ao tentar capital de giro.

Os bancos não querem correr risco. O governo não quer mexer em privilégio. E o empresário, que sustenta toda essa estrutura, está quebrando em silêncio.

O Brasil finge que é rico - e esmaga quem tenta construir riqueza

Em 2024, a arrecadação federal bateu recorde histórico, superando R$2,6 trilhões, um aumento de mais de 14% em relação ao ano anterior. Em abril de 2025, esse valor já beira os R$9,2 trilhões, equivalendo a 76,2% do PIB.

E o que foi feito com esse dinheiro? Onde estão os hospitais funcionando, as escolas equipadas, as ruas seguras, os incentivos aos pequenos? Ninguém sabe. Mas a Receita está de olho no seu microempreendimento se você esquecer de entregar a DASN.

O que não falta é fiscalização para o fraco e benevolência para os fortes.

A falácia do apoio ao pequeno empresário

O governo lançou programas como o “Desenrola Pequenos Negócios”, que renegociou R$7,5 bilhões em dívidas. Parece muito? Isso equivale a ajudar apenas 122 mil empresas - em um universo com 7,3 milhões inadimplentes. É ridículo.

Programas como Pronampe, ProCred e garantias via FGO têm alcance pífio. No papel, parecem solução. Na prática, são cortina de fumaça. É como jogar um balde de água em uma floresta pegando fogo.

Enquanto isso, as empresas inadimplentes se concentram nos estados mais pobres, onde o empreendedorismo é sobrevivência, e não escolha:

  • Distrito Federal: 40,9% das empresas inadimplentes
  • Alagoas: 40,3%
  • Pará: 39,8%
  • Acre, Amapá, Maranhão: acima dos 35%

E sabe qual estado tem menor inadimplência? Santa Catarina, Espírito Santo e Piauí. Coincidência?  Nada disso: onde há cultura de negócios locais fortes e cooperativos, a inadimplência é menor.

Regionalização: o caminho para sair do buraco

É hora de parar de esperar Brasília. O Brasil real não está no Planalto. Está no interior do Tocantins, nas franquias do Piauí, no delivery do interior de Minas. A força da economia está nos pequenos negócios locais, que geram emprego, renda e pertencimento.

Regionalizar políticas públicas, fomentar cadeias produtivas locais, apoiar cooperativas, o varejo, as microindústrias, redes de franquias e negócios de bairro - esse é o caminho.

O Estado precisa sair do gabinete, ir para a ponta e entender que a salvação do país não virá da Faria Lima. Virá do mercadinho da esquina.

O grito do Brasil produtivo

Chegamos a um ponto insustentável. Nenhum país sério sobrevive esmagando seu pequeno empresário. Nenhuma democracia avança sufocando seus maiores empregadores. Nenhum povo prospera trabalhando 149 dias só para pagar impostos e, no fim, ainda se endividar para manter seu negócio aberto.

A omissão virou política. O silêncio virou estratégia. E o caos virou rotina. Está na hora de empresários, entidades, prefeitos, vereadores, deputados e formadores de opinião gritarem juntos: chega! Ou mudamos agora, ou vamos assistir, impotentes, à maior onda de falências da história brasileira.

Rodrigo Campelo

Negócio e Franquia - O TEMPO